Em 2006, escrevi crônica em defesa do direito ao estupro. Afinal, foi tendência de alguns juízes na época. Houve leitor incauto que não percebeu a ironia.
Em fevereiro daquele ano, em Roma, os juízes da Suprema Corte de Cassação da Itália estabeleceram que a violação de uma jovem é menos grave se ela não for virgem. O fato provocou polêmica. De acordo com a agência Ansa, o tribunal acreditava que tais vítimas, do ponto de vista sexual, tinham personalidade "mais desenvolvida do que se espera de uma garota de sua idade". Ou seja, a gravidade do crime já não residia no ato do criminoso, mas na condição física da vítima. No fundo, o velho culto latino do jus prima nocte. Ou droit de cuissage, como preferiam os nobres franceses. Estuprando uma virgem, o estuprador rouba suas primícias ao futuro marido e senhor da jovem. Se ela já não é virgem, bom... já não é tão grave.
Marco T., 40 anos, havia estuprado em 2001 sua enteada de 14 anos. Segundo a defesa, a menina consentiu em fazer sexo oral depois de se negar a uma relação completa, exigida sob ameaça, considerando que o sexo oral seria menos arriscado. A Suprema Corte aceitou a alegação da defesa, para quem "a jovem já havia tido relações sexuais a partir dos 13 anos e, do ponto de vista sexual, já estava mais desenvolvida do que se espera de uma menina da sua idade". Assim, foi aceito o recurso do acusado pedindo uma pena mais leve.
Em vários países da Europa, particularmente nos escandinavos, está ocorrendo uma onda de estupros, geralmente cometidos por árabes e africanos, tendo como vítimas suecas, finlandesas, danesas, francesas e italianas. Os jornais, ao noticiar o fato, ocultam não só a identidade como também a etnia e o país de origem dos criminosos. Supostamente, para não caracterizar o crime como étnico. Em verdade, obedecendo à tirania do politicamente correto e dos grupos dos tais de Direitos Humanos, que só defendem os direitos dos criminosos. Ou seja, o estupro tende a ser descriminalizado na Europa. Se não descriminalizado, pelo menos aceito como uma transgressão menor.
Há alguns anos, um cidadão sueco declarava ao vespertino Aftonbladet que não via nada de mal em estuprar uma sueca, afinal "são todas putas e sempre podem casar depois de estupradas". Tabu continuava sendo estuprar uma muçulmana, que depois seria repudiada pela própria comunidade e não teria chance alguma de encontrar marido. Claro que este cidadão "sueco" não era exatamente um sueco, mas imigrante de origem árabe com passaporte sueco. O silêncio da imprensa sueca em relação aos estupros étnicos enche de razão os muçulmanos que estão ocupando - inclusive juridicamente - a Europa.
Pela Lei dos Crimes Hediondos, de 25 de julho de 1990, o estupro passou a ser considerado crime hediondo no Brasil. Ou seja: os condenados nela incursos são obrigados a cumprir pena integralmente em regime fechado, não têm direito à anistia, nem à liberdade provisória, nem à progressão do regime. A lei também impõe essas restrições a pessoas condenadas por homicídio qualificado, latrocínio, tráfico de drogas, tortura e terrorismo, entre outros crimes.
Ou melhor, impunha. Por decisão do Supremo Tribunal Federal, os presos por delitos graves já podem deixar a cadeia após terem cumprido um sexto da pena em regime fechado. Segundo o promotor Eduardo Araújo da Silva, em entrevista para o Estadão, o estuprador de uma criança ficaria hoje apenas um ano na cadeia, e mais um no regime semi-aberto. O pai ou a mãe de tal criança certamente se sentirão muito confortados com a instituição da progressão penal, ao ver o animal que violou seu filho rindo de suas caras apenas doze meses após ter entrado na prisão.
A bem da verdade, o estupro já foi descriminalizado no Brasil. Ou alguém ainda não lembra do homem que podia salvar a humanidade - como foi saudado pela imprensa americana - o cacique caiapó Paulinho Paiakan? Paiakan, em cumplicidade com sua mulher Irekran, estuprou barbaramente uma menina. Enquanto o processo se arrastava, Paulinho - são simpáticos os diminutivos! - avisou: se fosse condenado, não sairia de sua reserva. Ameaçou inclusive fazer rolar o sangue dos brancos, em caso de condenação.
Pois bem: foi condenado. Não fez rolar o sangue dos brancos mas continuou em sua reserva, livre como um passarinho. A Polícia Federal, única autorizada a agir em reservas indígenas, com todo seu poder de fogo, não ousou lá entrar para buscar o criminoso. Paulinho zombou do Estado brasileiro, zombou da Justiça brasileira, zombou de sua vítima. E não houve sequer uma feminista que protestasse contra o crime hediondo. A menos que a nação caiapó já constitua um Estado independente do brasileiro - onde estupro não é crime - e ainda não tenhamos sido avisados.
Alguém ainda lembra da aguerrida feminista australiana Germaine Greer, autora de A mulher eunuco, publicado em 1976 no Brasil? Talvez ninguém mais lembre. Foi no século passado, faz tanto tempo. Pois eu lembro, tenho boa memória. Em dezembro de 2007, em Melbourne, quando Greer fazia uma palestra sobre Jane Austen, a escritora australiana Pamela Bone perguntou-lhe se ela via um paralelo entre o conceito de honra familiar em Orgulho e Preconceito e os conceitos de honra familiar nas sociedades do Oriente Médio contemporâneas. Perguntou-lhe ainda porque as feministas ocidentais pareciam tão reticentes a se pronunciar contra os crimes pela honra. Greer saiu pela tangente:
- É muito delicado. Me sugerem o tempo todo ir ao Darfour interrogar as vítimas de estupro. Eu posso me dirigir às vítimas de estupro, aqui. Por que deveria falar das vítimas de estupro no Darfour?
- Porque lá é bem pior – replicou Bone.
- Quem disse isso? – perguntou Greer.
Como se os estupros no Darfour fossem matéria desconhecida no Ocidente. Pamela Bone explica que ela fora ao Darfour e lhe assegurou que lá a situação era nitidamente mais grave.
Serenamente, respondeu a feminista:
- Enfim, eu diria que é muito delicado tentar mudar a cultura dos outros.
Que as sudanesas se lixem – foi o que no fundo disse Greer. Para a feminista, as sudanesas, mesmo castradas, não são os verdadeiros eunucos da humanidade. Na mesma Austrália de Greer, no início deste mês, um refugiado afegão alegou que diferenças culturais o levaram a estuprar uma menina bêbada e ganhou uma tentativa de recorrer da pena de prisão de 14 anos.
Esmatullah Sharifi, 31 anos, foi condenado a um total de 11 anos, sem liberdade condicional, por dois estupros cometidos poucos dias um depois do outro, em dezembro de 2008. Ele se declarou culpado em audiências distintas, por estuprar uma adolescente em 19 de dezembro e uma mulher, 25 anos, na véspera de Natal daquele ano. Agora, foi autorizado a recorrer da sentença por estuprar a adolescente.
Para o juiz, Sharifi não tem um conceito claro de consentimento nas relações sexuais. O Meritíssimo concluiu que a proteção da comunidade foi o objetivo principal da pena imposta. Mas disse que havia “aspectos estranhos” na conduta da vítima de 18 anos, e Sharifi a tratou como "participante voluntária". Então tá. Se o coitado do afegão não tem um conceito claro do que significa um não, não tem culpa alguma quando estupra uma adolescente. Pelo jeito, Germaine Greer está fazendo escola em seu país.
Se a Itália já minimizou a invasão do corpo das mulheres, se a imprensa européia já não denuncia os estupros étnicos, se o Brasil confere a crimes hediondos a pena adequada a um ladrão de galinhas, se a nação caiapó tem como líder um estuprador confesso - e impune -, se um afegão pode ter atenuada sua pena porque não entende quando uma mulher diz não, então está na hora de deixarmos de pruridos. Descriminalizemos de vez o estupro. Como um pobre diabo, sujo e fedorento, terá acesso a esses corpos esplêndidos que a mídia oferece em bandeja, senão pela força? Que o direito ao corpo e ao sexo alheios não seja concedido apenas a bugres ou afegãos, e sim estendido a todos os sem-mulheres do mundo.
Mulheres do mundo todo, sede mais complacentes com estes pobres párias sexuais, estes injustiçados excluídos da humana volúpia. Abrí generosamente vossas pernas, que mais não seja para facilitar o exercício deste direito inalienável dos sem-mulheres. Se você não é virgem, nem vai doer. Deixe de lado seus preconceitos burgueses e contribua para a construção de uma sociedade mais humana e mais justa, cuja dignidade social somente poderá ser restaurada no momento em que todo imigrante, árabe ou negro ou excluído de qualquer estirpe tiver acesso imediato ao sexo.
Imigrante também é gente.
12 de abril de 2013
janer cristaldo
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