Na última segunda-feira, 22 de abril, José Sarney de Araújo Costa, ex-presidente da Arena, fez uma declaração antológica quando de sua passagem em Porto Alegre. O acadêmico, literato, controlador de mídia, bacharel de direito e senador da república (PMDB/AP) afirmou que as instituições políticas brasileiras remontam ao século XIX.
Ao caracterizar esse arcaísmo, fundamenta ser muito difícil a aprovação da reforma política. Poucas vezes uma fala descompromissada cumpriu o papel de auto-análise como nesta ocasião.
Desnecessário traçar aqui uma pequena biografia do político oriundo do PSD maranhense, que após desentendimento com um cacique local, integra a ala bossa nova da UDN - então capitaneada nacionalmente por Carlos Lacerda - fazendo de si e sua família ampliada um fiel e valoroso braço civil da ditadura militar.
Surpreende a afirmação acima pela sinceridade. Se há alguém que remonta as piores tradições do mandonismo brasileiro, onde a fronteira entre o bem público e o usufruto particular é nula, este é o ex-presidente do Senado.
Consideremos que nosso país nasce desta tradição evocada no início do século retrasado, quando os proprietários de escravos – “nobres” parlamentares se auto-representando – concordaram com a unidade territorial do Império em troca da manutenção da escravatura. São estes os predecessores dos coronéis brilhantemente descritos por Victor Nunes Leal e cuja versão contemporânea encarna em personagens da estirpe do escritor de Marimbondos de Fogo.
Sarney não é um sobrevivente e tampouco um equilibrista. Ele é a personificação da política profissional brasileira, tendo a mais longa carreira em atividade no Brasil. Tamanha é sua desenvoltura na função que inspira livros de investigação jornalística e de análise institucional.
Toda vez que tenho de materializar o conceito de cultura política paroquiana, fisiológica, patrimonialista regida por relação de clientela, o candidato a vice de Tancredo Neves no colégio eleitoral ganha presença em sala de aula. A cada semestre, ao ter de abordar o tema da transição democrática e do pacto intra-elites inspirado na mudança de regime na Espanha, o ex-governador do Maranhão e presidente da república sem haver sido eleito, é citado.
Sarney é quase onipresente, tendo apoiado a ditadura e com participação em todos os governos centrais do país de 1985 até o presente. Se alguém personifica a permanência das relações políticas do século XIX no Brasil, este é o maranhense senador pelo Amapá.
24 de abril de 2013
Bruno Lima Rocha é cientista político.
Nenhum comentário:
Postar um comentário