A verborragia de Lobão já é parte do anedotário da música popular brasileira. Há quem aposte que ele solta o primeiro petardo do dia ainda na cama, ao se espreguiçar. Não é de se esperar, portanto, que um livro seu seja canção para ninar carneirinho. Não foi assim com 50 Anos a Mil (Nova Fronteira), volume autobiográfico que saiu em 2010 sem poupar nenhum personagem e vendeu 150 000 exemplares, nem será assim com Manifesto do Nada na Terra do Nunca (Nova Fronteira, 248 páginas, 39,90 reais), que chega às lojas na próxima semana com tiragem inicial 40 000 cópias, quatro vezes maior que a do livro anterior.
Aqui, ele volta a disparar sua munição contra políticos (em especial os petistas, “aloprados e bandidos”), a música brasileira (o rock nacional continua “errado”, Roberto Carlos é uma “múmia deprimida” e a MPB, uma “sigla de proveta”), artistas e intelectuais (subornados ou preguiçosos), o brasileiro medíocre (leia-o brasileiro médio) e os nossos vícios de sempre (“a precariedade, a corrupção, a breguice, a incompetência, o assistencialismo, o nepotismo, o peculato, a demagogia, o simplismo, o coronelato”).
“O Brasil dos estupros consentidos na surdina,/ dos superfaturamentos encarados como rotina,/ dos desabamentos e enchentes de hora marcada,/ dos hospitais públicos em abandono genocida,/ dos subsídios da Cultura a artistas consagrados,/ dos aeroportos em frangalhos, usuários indigentes,/ dos políticos grosseiros, como sempre, subornados,/ de cabelo acaju e seus salários indecentes,/ da educação sucateada pelo Estado/ em sua paralisia ideológica, omissa e incompetente”, escreve ele no prólogo, feito em forma de poema e intitulado Aquarela do Brasil 2.0.
Há munição também, e bastante, dirigida para a presidente Dilma Rousseff, que tem um capítulo “dedicado” especialmente a ela. Em “Vamos assassinar a presidenta da República?”, Lobão afirma, por exemplo, que quando guerrilheira Dilma lutava contra uma ditadura para instaurar outra em seu lugar. “Ditadura que a presidenta e sua corriola teimam por fazer crer ser “do bem”, assim como a de Cuba e da China, das quais são fãs de carteirinha, asseclas e parceiros”, diz.
É certo que essa ácida verborragia serve de marketing para Lobão — o livro deve ser comentado em todo canto nas próximas semanas. Mas não é um marketing enganoso. Quem conhece o cantor já sabe o que vai encontrar em Manifesto do Nada na Terra do Nunca. Não há engodo. Nem viagem perdida. Ainda que discorde do que diz o livro, o leitor pode se engraçar com a folclórica energia demolidora do compositor de Me Chama. Que tem, sem dúvida, a sua serventia. É de se festejar haver alguém que pense diferente da maioria em tempos de manifestações ociosas em redes sociais e que se disponha ao debate. E escreva de jeito tão visceral e divertido.
Confira abaixo um trecho do capítulo em “homenagem” à “presidenta”. E, aqui, Aquarela do Brasil 2.0, o prólogo do livro.
Trecho do CAPÍTULO 304 de maio de 2013
VAMOS ASSASSINAR A PRESIDENTA DA REPÚBLICA?
Não se preocupem, amiguinhos, sou uma criatura incapaz de matar um mosquito, uma mosca, uma barata e, por extensão isonômica, a nossa presidenta da República, que, sendo assim, estará livre de uma chinelada assassina vinda das minhas sandálias.
O que gostaria de propor, com essa convocação um tanto insólita, mas de cunho didático, seria seguir a linha de raciocínio adotada pelo governo em relação a determinados assuntos ético-políticos, usando os mesmíssimos argumentos engendrados por esse governo para explicar, através de sua lógica, essa minha convocação didático-hipotética de assassinato ou execução da nossa mandatária máxima.
Em outras palavras, usar do próprio veneno criado por essa casta para provar a imensa picaretagem da medida de fachada nobre, implementada em maio de 2012, que é a defesa dos direitos humanos através da tal Comissão da Verdade.
A nossa presidenta, nossa governanta, como já é de domínio público, além de se declarar vítima de tortura, parece que também possui uma ficha criminal bastante ampla (alguns preferem chamar isso de atividade libertária, de luta armada para a libertação nacional), com assaltos milionários (onde estaria a grana?), atentados terroristas, suposta participação em execuções, sequestros, atentados e, junto com ela, uma parte bem representativa de seus colegas de partido e de governo.
E se esse questionamento é cada vez mais corriqueiro nas esquinas e nas redes sociais, se há dúvidas em relação ao seu passado, ela teria mais do que obrigação em esclarecer sua história de forma categórica e definitiva, uma vez que designou uma Comissão da Verdade, que ela própria convocou e o governo remunera, o que, nessa condição unilateral, é imoral. Se é uma suposição conspiratória sua participação efetiva em grupos guerrilheiros, se jamais participou de atentados, assaltos, sequestros e execuções, se, como afirma, teve apenas um envolvimento periférico, ela, como presidenta e implementadora da tal comissão que está averiguando apenas os seus antagonistas, não está agindo de forma honesta e aceitável.
É um tanto assustador assistir a um vídeo no YouTube da nossa governanta visitando o barracão da revolução cubana no Fórum Social Mundial e fazendo um discurso emocionado em que demonstra sua admiração e solidariedade à ditadura cubana! Nossa presidenta é uma tremenda comunista!
Uma pessoa que luta contra uma ditadura em prol de uma outra não tem o menor direito de reclamar coisa alguma!
Pela lógica, se é obsceno se vangloriar por ser nazista, tão grave é se permitir ser solidário à causa cubana, que já assassinou mais de cem mil pessoas, de 1959 até os dias de hoje, exporta métodos de tortura e seu maior trunfo econômico foi o comércio de sangue dos condenados ao paredão para os vietcongues nos anos 1960. Fora Mao Tsé-Tung, que assassinou mais de sessenta milhões de pessoas e condenou outros milhões à fome e à miséria, deixando Stalin acabrunhado com suas próprias atrocidades. E não venha dizer que isso é teoria da conspiração, pois são fatos históricos e muito bem-documentados.
E esses facínoras vêm com esse papo de libertários? Que entraram na luta armada, em nome da tal causa libertária (?!), na luta pela implementação do socialismo no Brasil, para nos livrar das garras da ditadura militar em troca de uma redentora ditadura do proletariado? Ditadura que a presidenta e sua corriola teimam por fazer crer ser “do bem”, assim como a de Cuba e da China, das quais são fãs de carteirinha, asseclas e parceiros. Sem esclarecer ao povo brasileiro ter sido justamente essa sanha por implementar uma ditadura do proletariado no Brasil através da luta armada a principal causa de vivermos numa ditadura militar por mais de duas décadas.
Como se não bastasse, há probabilidades sólidas e evidências contundentes de termos um governo e seu partido majoritário, o PT, atuando como parceiros das Farc (Forças Armadas Revolucionárias Colombianas), que, além de tudo, têm parceria com o PCC (Primeiro Comando da Capital). Sem falar na lamentável posição do Brasil como um dos campeões mundiais de tortura e assassinatos nas prisões. Ou seja, toda essa nova elite de poder se dando um direito tão distinto e quase divino de praticar atrocidades, em nome, segundo eles, de uma causa nobre, insofismável. Sempre raciocinando e agindo com dois pesos e duas medidas.
Veja
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