Mas confesso não compartilhar da euforia que tomou as ruas das principais capitais do país. Há uma insatisfação generalizada e difusa, sem foco. Não adianta ser contra “tudo que está aí”. É preciso compreender melhor o que nos trouxe a esse quadro, e como mudá-lo. Temos que gerar mais luz e menos calor.
Além da grande cacofonia nas ruas, cada um com uma demanda diferente, há grupos radicais de esquerda tentando se apropriar dos protestos. Afinal, isso é o que eles sempre fizeram: incitar as massas e criar baderna. Separar o joio do trigo é crucial. Vândalos devem ser contidos, saques e agressões aos policiais devem ser reprimidos com todo o rigor da lei. Manter a ordem é fundamental.
O clima anárquico só interessa aos golpistas de plantão. Uma turba descontrolada é um convite a uma intervenção estatal rigorosa. A Revolução Francesa sofreu desse mal, levando ao Terror de Robespierre, e depois à ditadura de Napoleão. Maio de 68 foi outro exemplo de caos produzido pela juventude entorpecida por utopias revolucionárias.
Consigo entender perfeitamente o desespero de muitos, cansados de nossa política podre, da ausência de alternativas sérias, da impunidade, do transporte caótico, a saúde pública em frangalhos. Tudo isso é totalmente legítimo. Mas precisamos canalizar essa energia toda para forças construtivas, e não destrutivas.
Sou bastante crítico a este governo. Meu julgamento da era petista é o pior possível. Nunca antes na história deste país se viu tantas trapalhadas conjuntas, tanta incompetência, tanta mediocridade e safadeza. O PT segregou o país, comprou votos com esmolas estatais, aparelhou a máquina do Estado e demonstra forte viés autoritário.
De nada adianta rugir feito um leão nas ruas, e depois votar como um burro nas urnas
Estamos pagando um alto preço por essa inoperância, agora que os ventos externos pararam de soprar na nossa direção. Dilma não fez uma única reforma estrutural importante, exagerou no populismo e permitiu inclusive a volta da alta inflação. Meu veredicto é o mais duro possível contra a presidente e sua equipe.Dito isso, não consigo mergulhar com muito otimismo nas manifestações das ruas, até porque tenho sérias dúvidas se este é também o diagnóstico dessas pessoas. Muita gente acaba demandando mais intervencionismo estatal como solução. Querem mais do veneno! Bandeiras demagógicas, como “passe livre”, também abundam. Esse, definitivamente, não é o caminho.
O que fazer então? Sei que a nossa democracia é muito falha. Quem pode ficar feliz com esse Congresso? Mas não acredito muito em revoluções populares, que costumam sair do controle. Prefiro apostar na evolução de nossas instituições, hoje capengas e ameaçadas. Precisamos lutar dentro da própria democracia, com as armas da legalidade, respeitando o império das leis.
Essa via leva mais tempo, tem solavancos, exige concessões, demanda paciência, aquela que está prestes a se esgotar. Mas ela é mais sólida, mais sustentável, mais pacífica. O principal valor da democracia representativa não está em suas “fantásticas” escolhas (Lula?), mas em sua capacidade de eliminar grandes erros de forma pacífica.
Conquistamos a duras penas o regime democrático, e criamos algumas instituições republicanas importantes, como a liberdade de imprensa e a independência dos poderes. Não foi no ritmo que desejávamos, tampouco da qualidade que almejamos. Mas precisamos preservá-las. Hoje mais do que nunca, justamente porque elas estão em xeque, sob constante ataque de minorias organizadas e barulhentas.
Nenhum partido atual representa minha visão liberal de país. São todos eles intervencionistas, depositando no Estado um papel demasiado de controle sobre nossas vidas e recursos. Mas nem por isso penso que a solução é uma espécie de “revolução apartidária”. Em política não há vácuo; ele logo é preenchido por alguém. Que não seja um aventureiro, um “messias” salvador da Pátria. Ou salvadora.
Eis minha sugestão aos brasileiros cansados dessa situação: indignai-vos, mas nas urnas! Não será a escolha ideal, mas o ideal existe somente em nossas ilusões. E elas são perigosas quando passamos a acreditar que são viáveis. Façamos aquilo que for possível, mantendo nossa frágil, porém necessária democracia. De nada adianta rugir feito um leão nas ruas, e depois votar como um burro nas urnas.
29 de junho de 2013
Rodrigo Constantino
Fonte: O Globo
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