Ministros demonstraram discordar de tese de Lewandowski, que pode beneficiar petistas. Argumentos jurídicos usados para a revisão da pena do ex-deputado Bispo Rodrigues (PL-RJ) não convencer
Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) condenaram a atitude do presidente da Corte e relator do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, de acusar o colega Ricardo Lewandowski de fazer chicana na sessão de quinta-feira. Mas boa parte dos ministros não concorda com os argumentos jurídicos usados por Lewandowski para insistir na revisão da pena do ex-deputado Bispo Rodrigues (PL-RJ).
Ontem, ministros lembraram que Lewandowski não recebeu qualquer apoio ao defender a revisão da pena de Bispo Rodrigues durante a sessão de quinta-feira. Lewandowski sustentou que, segundo a denúncia do Ministério Público Federal, no fim de 2002 teria havido uma reunião entre dirigentes do PT e do PL (atual PR) para acertar o repasse da propina do mensalão. Por isso, para ele, deveria ser aplicada a legislação em vigor na época para o crime de corrupção passiva, com prisão de um a oito anos.
Ao condenar Rodrigues, o STF usou como base a lei que passou a vigorar em novembro de 2003, que prevê pena de dois a 12 anos de prisão. Na sessão, Barbosa chegou a lembrar que a condenação pelo crime de corrupção passiva imposta a Rodrigues foi aprovada por votação unânime, inclusive com apoio do próprio Lewandowski.
A mudança pretendida por Lewandowski reduziria a pena imposta a Rodrigues e também levaria à redução da punição aos réus condenados por corrupção ativa, como os petistas José Dirceu, Delúbio Soares e José Genoino.
Durante a discussão em plenário, os ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Luiz Fux apoiaram argumentos jurídicos de Barbosa. Fux, por exemplo, ponderou que não era o momento de rever provas, já que a votação ocorrida no ano passado para fixar a pena de Rodrigues foi unânime.
— Estou com sérias dúvidas sobre se é possível, em embargos de declaração, rever o posicionamento do plenário — disse Fux, na última quinta-feira.
Celso de Mello, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello foram claros ao dizer que o dinheiro da propina foi pago ao ex-parlamentar em dezembro de 2003, sob a vigência da lei com punição mais rígida. Portanto, o réu não deveria ser enquadrado na lei anterior.
— De fato, o recebimento da vantagem indevida ocorreu em dezembro de 2003 — afirmou Gilmar Mendes na sessão.
— Segundo o Ministério Público, o réu recebeu vantagem indevida em 17 de dezembro (de 2003). Não há referência na denúncia de qualquer pedido ou aceitação de indevida vantagem antes disso. Como não houve solicitação ou aceitação da promessa, consuma-se o crime com o recebimento — explicou Celso de Mello, na sessão de quinta-feira.
Depois do bate-boca em plenário, integrantes do tribunal sentiram, no entanto, falta de um pedido de desculpa por parte de Barbosa — que, por sua vez, já avisou a interlocutores que não se arrepende de nada. Os ministros esperam mudança na atitude do presidente daqui para a frente, para não tumultuar o julgamento do processo.
— Costumo julgar os colegas por mim. Eu não faria o que ele fez. Mas, se tivesse feito, eu daria a mão à palmatória. Foi algo realmente que fugiu à curva do Supremo — disse Marco Aurélio.
Embora condene o comportamento de Barbosa, o ministro acredita que o episódio não afetará o julgamento:
— Foi algo indesejável em termos de instituição, de Judiciário, de Brasil. É inconcebível que a coisa descambe para aquele campo. Espero que o presidente se arrependa do que veiculou, algo despropositado. Mas (a briga) não prejudicará o julgamento. Prevalecerá o que queremos, que é o bom Direito. Considerada a tradição do tribunal, quarta-feira a sessão será normal. Só espero que continuemos com a racionalidade que tivemos até aqui, em termos de um julgamento célere, para terminarmos com a apreciação dos recursos até o final de agosto — afirmou.
Celso de Mello disse acreditar que a crise pode ser contornada:
— Eu tenho impressão de que isso aí (a discussão) vai ficar superado logo. Acho que às vezes, ao longo da História do tribunal, situações assim têm ocorrido. Não é algo inédito. E acaba sendo contingência das sessões públicas de julgamento, e acho isso muito importante. Eu acho que a publicidade dos julgamentos do tribunal representa um fator de legitimação das próprias decisões que a Corte profere.
Para o ex-ministro do STF Carlos Velloso, a atitude de Barbosa não condiz com as obrigações de um presidente da Corte.
— Quem sai perdendo é a instituição, e o presidente tem a obrigação de zelar pela instituição. Esta é a primeira obrigação, ele é o guardião da Casa. Num julgamento colegiado, é preciso que exista um mínimo de cordialidade, para que as questões possam ser livremente discutidas, sem constrangimento e com absoluta liberdade.
Na quinta-feira, após a discussão, Barbosa recebeu Fux, que queria fazer o papel de apaziguador. Mas, por enquanto, Barbosa não está disposto a pedir desculpas. Ontem, Celso de Mello passou uma hora no gabinete do presidente. A intenção de Barbosa é retomar o julgamento quarta-feira como se nada tivesse acontecido. Mas Lewandowski cogita apresentar uma questão de ordem ao plenário para defender seu direito de votar como quiser. Assim, os ministros opinarão sobre o assunto, manifestando apoio a Lewandowski.
17 de agosto de 2013
Carolina Brígido - O Globo
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