"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 22 de janeiro de 2012

HISTÓRIAS DO SEBASTIÃO NERY



Quem é que vai pagar a fatura?

Noite de 31 de março para 1º de abril de 1964, no palácio Iguaçu, em Curitiba. Todo mundo nervoso, excitado, ao pé dos rádios, ouvindo o noticiário para saber quem ia ganhar: o golpe ou o governo Jango.

O governador Ney Braga, major, do PDC (Partido Democrata Cristão), perplexo, tentava contatos, telefonava, sem saber que posição tomar. Pediu a Hosken Novais (depois, seu vice-governador) para escrever um manifesto revolucionário duro, “em favor da revolução”. E ao assessor Norton Macedo para fazer outro manifesto, moderado, legalista, para qualquer emergência.

Às duas da manhã, entra no gabinete, esbaforido, o diretor da revista “Panorama”, Jorge Curi, com uma pasta cheia de papéis. Ney imaginou que ele poderia ter notícias:

- Curi, como estão as coisas lá pelo Rio, Brasília, São Paulo?

- Sei lá, governador.

- Jornalista, pensei que você sabia de alguma coisa. E você, com quem você está? Está com a revolução ou com o Jango?

- Ora, governador, não estou com ninguém. Eu quero é saber quem vai, nesta confusão, pagar minhas faturas de publicidade.

E jogou um monte de faturas em cima da mesa. Ney saiu para ver como estavam os dois manifestos. Usou o de Hosken e mandou por 20 anos.

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LESSA

Em 2005m estive em Curitiba, para um encontro político. O dinâmico ex-prefeito e ex-ministro Rafael Grecca, que presidia a Fundação dos Amigos da Biblioteca Pública do Paraná, e o diretor da Biblioteca, professor Claudio Fajardo, me convidaram para participar de uma série de debates sobre toda essa lambança que está aí.

Antes de mim, falou o ex-presidente do BNDES, Carlos Lessa, que resumiu:

“Um mês de pagamento de juros pelo governo corresponde ao gasto anual com todo o SUS. Quinze dias, ao gasto anual com Educação. Dez dias, ao gasto anual com o Bolsa-Família. Um dia, ao gasto anual com habitações populares. Um minuto, ao gasto anual com a defesa dos Direitos Humanos”.

Depois, foi a minha vez. Durante quase três horas, debati com centenas de jornalistas, dirigentes partidários e estudantes, o pântano em que o governo Lula e o comando do PT lançaram o País, quando optaram por cumprirem servilmente e agravarem a receita externa do modelo econômico neoliberal.

É pena ver hoje como está arrasada toda uma geração de generosos petistas, que conheço desde a fundação do PT e já desistiram. Mas muitos ainda lutam e confiam no amanhã, sem saber quem vai pagar a fatura.

22 de janeiro de 2012
Sebastião Nery

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