"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

APOSENTADOS E REFORMADOS NÃO CAUSAM DÉFICIT ALGUM AO GOVERNO

Através da Secretaria do Tesouro Nacional, o governo divulgou – reportagem de Cristiane Jungblut, O Globo de segunda-feira – que no exercício de 2011 as folhas de pagamento dos aposentados e pensionistas civis e militares reformados fecharam com um déficit de 60 bilhões de reais. Falsa a afirmação. As despesas foram essas, correspondendo a exatamente um terço do desembolso geral com o funcionalismo público, conforme está publicado na página 55 do Diário Oficial que circulou no mesmo dia 30. Mas nada têm, entretanto, com prejuízo financeiro.

Nada têm porque os servidores civis e militares descontaram ao longo de 30 a 35 anos, às vezes até mais, e continuam descontando mesmo aposentados ou pensionistas, 11% de seus vencimentos e soldos para conquistarem o direito à aposentadoria, à reforma e à pensão para seus herdeiros legais.

O que os governos que se sucederam ao longo do tempo fizeram com a arrecadação obtida? Despesa é uma coisa. Déficit outra muito diferente.A reportagem de Cristiane Jungblut coloca em confronto o déficit de 29,5 bilhões de reais que teria ocorrido em 2002 e o verificado em 2011. Com isso, a STN sustenta que o “déficit” é crescente. Outra mendacidade.

O Tesouro Nacional omite a inflação que aconteceu no período. O IBGE para esse período aponta 140%. Logo, mesmo dentro do ângulo de raciocínio da administração financeira federal, o “prejuízo” teria efetivamente diminuido, nunca aumentado. É preciso interpretar bem e traduzir claramente os números. Inclusive se a inflação não fosse um pólo de referência fundamental, nossos salários atuais estariam altíssimos. Ontem é um assunto. Hoje é outro completamente diferente.

É impressionante a capacidade que tem a tecnocracia de culpar os funcionários públicos, em particular, e os empregados, de forma geral, por desequilíbrios aparentes nas contas públicas. Mas ela, a tecnocracia, é incapaz de citar o peso das despesas com o pagamento de juros aos bancos para rolagem da dívida interna mobiliária que se eleva a 2,2 trilhões, o mesmo teto do orçamento para este ano.

Se a taxa é de 10,5%, o gasto financeiro passa de 220 bilhões de reais a cada doze meses. Bem acima da folha do funcionalismo civil e militar: 220, de um lado, 183 bilhões de outro.Sob o prisma da tecnocracia, a aposentadoria é um absurdo. Esquecem os jovens tecnocratas que eles também, um dia, serão aposentados. Pode-se dizer até, copiando-se slogan de casa juvenil de roupas que não existe mais, que o técnico jovem de 2012 será o aposentado de amanhã. E só esperar o tempo passar na janela como no belo verso de Chico Buarque.

A matéria publicada no Globo fala também nos investimentos públicos realizados em 2011. Aponta 47 bilhões de reais. Efetivamente pouquíssimo. Mas o que têm os aposentados a ver com isso? Devem ter seus vencimentos cortados? Para este ano, os investimentos,como revela o próprio orçamento sancionado pela Dilma Roussef, são de apenas 106 bilhões para uma lei de meios que se eleva a 2 trilhões e 252 bilhões de reais. Cinco por cento.

O governo investe pouco, de fato. Mas isso, em grande parte, por causa da corrupção avassaladora que se percebe por aí. O roubo não tem fim. Parece, em expressão usada por Tennessee Williams numa de suas peças, o fundo de um saco sem fundo. As divisões de cargos não se voltam essencialmente para a realização de políticas públicas. Direcionam-se para o enriquecimento de poucos em prejuízo – aí sim – de quase 200 milhões de brasileiros e brasileiras. Triste esta constatação.

Pedro do Coutto
01 de fevereiro de 2012

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