"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

CRIMES CONTRA A HUMANIDADE

Judiciário no Haiti: exatamente o que ‘Baby Doc’ prescreveu

Em 30 de janeiro, um magistrado investigativo declarou o ex-ditador Jean-Claude Duvalier inocente perante acusações de sérias violações dos direitos humanos

Na semana passada circulou no Haiti uma charge que mostra Jean-Claude Duvalier dirigindo um Mercedes sujo de sangue e arrastando caveiras humanas. Um policial está lhe multando, exclamando, “Você está preso por roubar um carro, Sr. Duvalier!”

Essa é a situação atual da Justiça no Haiti, onde em 30 de janeiro Carvès Jean, um magistrado investigativo, declarou Duvalier inocente perante acusações de sérias violações dos direitos humanos, incluindo tortura e assassinato político, porque o prazo prescricional de dez anos tinha vencido. Duvalier governou o país de 1971 a 1986, quando fugiu para a França e passou 25 anos gastando os milhões de dólares que ele é frequentemente acusado de ter desviado do dinheiro público.
Jean determinou que um julgamento por apropriação indébita de fundos do governo poderia continuar, mas seria conduzido por um tribunal dedicado a crimes relativamente menores. A penalidade máxima seria de cinco anos na prisão.

A ONU e grupos de defesa dos direitos humanos se manifestaram imediatamente. Violações dos direitos humanos durante o regime de Duvalier estão amplamente documentadas, e sob a lei internacional, eles argumentam, não há prazo prescricional quando se trata de crimes contra a humanidade. “Tribunais da Argentina ao Camboja já decidiram ignorar limites de tempo em casos assim, porém mais uma vez o Haiti é uma exceção”, disse Reed Brody da Human Rights Watch, que ajudou a construir o libelo acusatório contra Duvalier no ano passado.

Duvalier, apelidado de “Baby Doc”, retornou inesperadamente ao Haiti em janeiro de 2011. Ele foi indiciado poucos dias depois e posto sob prisão domiciliar – uma determinação que ele violou em repetidas ocasiões, tendo sido visto bebendo champanhe em restaurantes caros, viajando pelo interior do país e até mesmo comparecendo a uma formatura da faculdade de direito em Gonaïves, onde os protestos contra ele começaram 26 anos atrás. Quando intimado a comparecer ao tribunal, Duvalier fingiu estar doente, e enviou à corte um atestado médico. Jean eventualmente suspendeu a ordem de prisão domiciliar também.

Quando questionado sobre o processo contra Duvalier, Michel Martelly, o presidente, aludiu em diversas ocasiões às separações entre os poderes, dizendo que o caso era um problema dos tribunais haitianos, e não do poder Executivo. No entanto, ele vem sendo ostensivamente gentil com Duvalier.
No mês passado Martelly convidou o ex-ditador para uma cerimônia que marcou dois anos após o terremoto de 2010, em um cemitério.
Depois, ele disse que consideraria perdoar Duvalier. Ele recuou alguns dias antes de Carvès dar seu despacho, repleto de erros tipográficos.

Os denunciantes disseram que iam recorrer da decisão. O advogado de Duvalier, Reynald Georges, fez a mesma coisa, anunciando que seu cliente iria brigar para reverter as acusações de corrupção. Ano passado Georges recebeu esta correspondente em seu escritório com uma arma automática sob sua escrivaninha, respondeu algumas perguntas e em seguida a convidou para sentar no seu colo. Ela foi embora o mais rápido que pôde.

13/02/2012
Fontes:The Economist - Just what the Doc ordered

Nenhum comentário:

Postar um comentário