E NOS "PROGRAMAS SOCIAIS" DA REPÚBLICA DA ENGANAÇÃO : Falta uma Fifa para as creches
Só falta um detalhe para os brasileiros poderem festejar a construção de 6 mil creches até o fim de 2014, uma promessa de campanha repetida várias vezes pela presidente Dilma Rousseff e reafirmada em seu discurso do Dia das Mães.
Esse detalhe é muito simples:
o governo precisa apenas tomar as providências necessárias para a realização das obras. Mas deve fazê-lo com rapidez, porque a presidente já cumpriu quase um ano e meio de mandato e esse programa, como tantos outros anunciados pela administração federal, continua emperrado.
Sem mudanças muito sérias na gestão de programas e projetos, a construção de creches e pré-escolas será um fracasso tão grande quanto as obras da Copa, outro compromisso reiterado nos últimos dias.
O quadro já seria bem melhor se o Proinfância, lançado em 2007, na gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tivesse avançado um pouco mais rapidamente. Foram aprovadas a partir daquele ano 4.035 obras para atendimento a crianças em idade pré-escolar. Em março de 2012 o Ministério da Educação anunciou já terem sido entregues 221 inteiramente concluídas.
Esse número equivale a 5% das aprovadas para inclusão no programa de financiamentos. O total subiria para 258, se fossem contadas 37 unidades com obras muito próximas da conclusão, mas isso ainda representaria só 6,4% dos projetos aprovados.
Em 2007, ano de lançamento do Proinfância, o presidente Lula comprometeu o Brasil com a realização da Copa do Mundo e, portanto, com grandes investimentos em estádios, aeroportos, hotéis e sistemas de mobilidade urbana.
Os resultados são muito parecidos nos dois casos, mas os pronunciamentos a favor das criancinhas foram mais raros e mais suaves.
Faltou um Jerôme Valcke, da Fifa, para receitar um chute no traseiro das autoridades educacionais.
Para cumprir sua promessa de campanha, a presidente Dilma Rousseff deveria ter dado maior impulso ao Proinfância ou passado a limpo todo o programa para garantir uma execução mais eficaz.
A única novidade, no entanto, foi o compromisso de construção de 6 mil creches em quatro anos. Na prática, nenhum efeito sensível.
Em 2011, primeiro ano de governo, R$ 891 milhões foram autorizados no orçamento e R$ 308,3 milhões foram pagos. Mas o ano terminou sem a conclusão de uma única obra. Todo o valor foi empenhado, isto é, formalmente comprometido com a execução de projetos, e R$ 582,3 milhões sobraram para 2012 como restos a pagar.
Mas também o desembolso desse dinheiro, assim como o das verbas incluídas no orçamento deste ano, dependerá do ritmo das obras. Como no caso dos projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o cenário é de muita ineficiência, quando se trata de creches e unidades de pré-escola.
O assunto foi discutido, no começo deste ano, num encontro da Associação Contas Abertas com secretários de Educação de municípios goianos e representantes da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação.
Foram apontados problemas burocráticos e também problemas causados por irregularidades nas licitações e na execução das obras. É necessário melhorar todo o sistema de administração dos recursos, desde a liberação do financiamento federal até a entrega das instalações.
Os controles são obviamente defeituosos. O Ministério da Educação levou algum tempo, em 2012, para identificar uma irregularidade na ação de uma prefeitura comprometida com a construção de duas creches. Um técnico notou a presença de um cão em todas as fotos enviadas pelo governo municipal. As fotos eram da mesma creche.
Segundo a presidente Dilma Rousseff, é preciso investir em educação e saúde para "atacar a desigualdade na raiz do problema". Ela está certa, mas para isso é preciso, igualmente, melhorar muito a gestão de programas e projetos, outra promessa de campanha.
Também nesse caso os resultados são imperceptíveis. É muito mais fácil conceber e executar programas de transferência direta de renda que combater a pobreza por meio da capacitação de pessoas.
Este continua sendo o maior e mais importante desafio dos chamados programas sociais.
O Estado de S. Paulo
15 de maio de 2012
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