"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 13 de julho de 2012

PARA QUE SERVE UM EX-PRESIDENTE?

 

Não seria má ideia que Lula aprendesse com FHC, que não permite que os afetos lhe enevoem o juízo. A velha piada é que os ex-presidentes são como os vasos chineses: sabemos que são valiosos, mas ninguém sabe o que fazer com eles.
Alguns, como Bill Clinton, mantêm uma atividade frenética; outros, como Vladimir Putin, dão um jeito de nunca deixar o poder, e aind outros, como Álvaro Uribe, brigam com seu sucessor.

Alguns ganham prêmios mundiais e outros intervêm de modo inoportuno nas eleições de outros países.
Nos últimos dias, os dois mais famosos ex-presidentes brasileiros estiveram na arena pública mundial. O contraste entre suas atuações não poderia ter sido mais extremo.
Fernando Henrique Cardoso recebeu o prêmio mais importante do mundo como cientista social: o Prêmio Kluge, outorgado pela Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos.
O prêmio tem um processo de indicação e seleção tão ou mais rigoroso que o Nobel, e seu valor -US$ 1 milhão- é superior. Quase ao mesmo tempo, Lula aparecia por videoconferência na reunião do Foro de São Paulo em Caracas.
Ele disse: "Apenas com a liderança de Chávez é que o povo realmente vem tendo conquistas extraordinárias.

As classes populares nunca foram tratadas com tanto respeito, carinho e dignidade. Essas conquistas
devem ser preservadas e consolidadas. Chávez, conte comigo, conte com o PT, conte com a solidariedade e o apoio de cada militante de esquerda, de cada democrata e de cada latino-americano. Tua vitória será nossa vitória".
É perfeitamente legítimo que Lula expresse seu afeto e admiração por Hugo Chávez. Os afetos -como o amor- são cegos e merecem respeito. Mas não é legítimo que Lula intervenha na campanha de outro país. Isso os democratas não fazem.
E Lula sabe disso. E já o tinha feito antes, quando, na véspera de um referendo importantíssimo na Venezuela, irrompeu no processo, afirmando que Chávez era o melhor presidente que o país tinha tido nos
últimos cem anos.
Tampouco é legítimo distorcer a realidade venezuelana, como Lula fez -especialmente a realidade dos pobres.

Chávez vem tendo um efeito devastador sobre a Venezuela, e os pobres são suas principais vítimas.
São eles que pagam as consequências de viver em um dos países mais inflacionários do mundo, são eles que são obrigados a virar-se com um salário real que caiu para o nível que tinha em 1966.
São eles que não conseguem trabalho a menos que seja no setor público e sob a condição de demonstrarem constantemente sua adoração e fidelidade ao "comandante".
São eles que veem seus filhos e filhas assassinados (o índice é dos mais altos do mundo. Não é de estranhar, portanto, que nas últimas eleições legislativas mais de metade dos votos tenha sido contra Chávez.
Na Venezuela, é impossível alcançar essa porcentagem sem milhões de votos dos mais pobres -que, segundo Lula, estão melhor que nunca.
Nesse sentido, não seria má ideia que Lula aprendesse um pouco com o FHC cientista social, que não permite que os afetos lhe enevoem o juízo. E com o FHC político, que não intervém de maneira abusiva nas eleições de outros países
*Folha de São Paulo - 13.07.2012

13 de julho de 2012
blog do mario fortes

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