"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sábado, 18 de agosto de 2012

OS ANGUSTIADOS



Nas Entrelinhas

No fundo, os petistas tinham poucas esperanças de que o voto do relator seria diferente da condenação do deputado João Paulo Cunha, o único candidato a prefeito entre os réus do mensalão. Mas não supunham que seria por vários crimes nem o primeiro nome do partido a ser colocado à beira do cadafalso

O estresse nesta sexta-feira e na próxima semana não será privilégio dos réus do mensalão, que passarão dias ouvindo o voto do relator da Ação Penal 470, ministro Joaquim Barbosa. O presidente da Câmara está nesse rol, ainda que por outros motivos. Quem viu a imagem de um Marco Maia todo sorridente em Estocolmo, sentado ao lado de Pelé durante o amistoso Brasil e Suécia, jamais poderia supor que se trata de alguém pra lá de incomodado com a armadilha que criou para si próprio.

Maia prometeu aos oposicionistas que o governo seria democrático na execução das emendas parlamentares ao Orçamento da União. Disse a integrantes de PSDB, DEM e PPS que seus municípios, leia-se as bases eleitorais, seriam atendidos em breve.

A promessa, feita com a chave do cofre que está sob o comando da presidente Dilma Rousseff, jamais havia sido feita por um presidente da Câmara. E, diante desse inusitado, os aliados do petista gaúcho veem o comandante da Casa em xeque diante do próximo esforço concentrado da Câmara, a partir da próxima terça-feira. Isso porque, depois das festividades dos últimos dias, em Londres e Estocolmo, os congressistas têm o dever de mostrar serviço e aprovar as propostas de interesse da população. Mas, por conta do baixo comparecimento das excelências na Casa, está cada vez mais difícil isso acontecer, especialmente na semana em que os candidatos a prefeito dão a largada na propaganda de rádio e tevê.

Por falar em esforço...

O Planalto já fez chegar aos congressistas que, na próxima segunda-feira, haverá liberação de limites orçamentários para os ministérios. Mas não há nada garantido para a oposição, uma vez que, em pleno calendário eleitoral, não é possível liberar recursos para obras novas nem assinatura de convênios. Isso significa que, se Marco Maia depender da liberação de emendas da oposição para aprovar qualquer coisa na Casa, vai amargar mais uma semana de Congresso paralisado. E, cá entre nós, por que um governo que, em tese, tem ampla maioria na Casa, precisa liberar emendas da oposição para empreender votações?

A resposta a essa pergunta traz algumas conclusões que fazem parte do portfólio das suposições em alta no Planalto. A primeira delas: Marco Maia e o líder do governo, Arlindo Chinaglia, usam a oposição como escudo para não deixar transparecer o descontrole sobre a base governista. Só que uma hora esse descontrole ficará cristalino, da mesma forma que, nos bastidores do Supremo Tribunal Federal, já se fala em possíveis condenações.

Por falar em STF...

A muitos soou esquisito o ministro-relator, Joaquim Barbosa, começar o voto pelo caso do deputado João Paulo Cunha (PT-SP), ex-presidente da Câmara. João Paulo é o único réu candidato a prefeito. Disputa a prefeitura de Osasco como se a cidade ficasse em outro planeta. No fundo, os petistas tinham poucas esperanças de que o voto do relator fosse diferente. Sabiam que a tendência de Joaquim Barbosa era em favor da condenação do deputado. Mas não supunham que seria por vários crimes — lavagem de dinheiro, corrupção passiva e peculato (uso do cargo em benefício próprio). Muito menos que João Paulo seria o primeiro a ser colocado à beira do cadafalso por Barbosa.

Entre quatro paredes dentro do PT, há quem diga que ficará cada vez mais difícil o deputado manter uma campanha nesse período. Até porque não se sabe quantos dias os ministros vão levar para proferir os votos. E visto que os demais integrantes não são obrigados a seguir a mesma ordem do relator, talvez deixem para votar o caso de João Paulo ao fim de cada voto. Isso torna o período de julgamento embolado com a campanha eleitoral ainda mais incerto. Perto do caso de João Paulo, a angústia de Maia é, realmente, um passeio.

Denise Rothenburg
18 de agosto de 2012
Correio Braziliense (DF)

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