"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 24 de agosto de 2012

OS BODES DO MENSALÃO


A coincidência de votos entre o revisor e o relator em relação a duas figuras emblemáticas do escândalo do mensalão — Henrique Pizzolato e Marcos Valério — praticamente desmonta a principal tese de defesa da maioria dos réus no processo em julgamento no Supremo Tribunal Federal: a de que se tratava apenas de caixa dois de campanha eleitoral e de que não houve desvio de dinheiro público para o esquema. Ora, tanto o ministro Joaquim Barbosa quanto Ricardo Lewandowski foram enfáticos ao apontar, com fartura de provas e indícios, a suposta falcatrua.

Mais do que isso. Ambos fizeram questão de ser didáticos ao descrever em detalhes como funcionaria a engenharia da corrupção, que de sofisticada não teria nada, e concluíram: recursos saídos dos cofres do Banco do Brasil irrigaram a organização que o procurador-geral da República chamou de criminosa e disse ser chefiada pelo então ministro José Dirceu.

Quando digo que o argumento maior da defesa foi pro beleléu é porque quando há coincidência de posicionamento entre relator e revisor, no julgamento de ação penal, os demais ministros de tribunais superiores costumam endossar o voto dos dois. Nesse caso, basta que mais quatro dos 11 magistrados concordem com Barbosa e Lewandowski para que Henrique Pizzolato, ex-diretor do BB, e o empresário Marcos Valério, acusado de ser o operador do mensalão, acabem condenados. Além de considerados culpados, há até o risco, acreditem, de eles cumprirem pena de prisão em regime fechado. Isso porque Pizzolato pode pegar de 8,4 a até 46 anos de detenção. Para Valério, dizem especialistas, a pena máxima chegaria a 36 anos. A mínima, a seis.

Agora, no caso de João Paulo Cunha, Lewandowski e Barbosa divergiram frontalmente. Se votasse, eu fecharia com o relator: é difícil de engolir essa história de que não houve corrupção na entrega dos R$ 50 mil de Valério para João Paulo Cunha, supostamente autorizada por Delúbio, para pagar pesquisa eleitoral. Quando a "generosidade" é demais, o santo desconfia.

24 de agosto de 2012
Plácido Fernandes Vieira

Correio Braziliense (DF)

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