A presidente Dilma
Rousseff usou espetos de pau para falar de protecionismo ontem em Nova York. O
país que mais tem adotado medidas restritivas de comércio no mundo ocupou a
tribuna de abertura da Assembleia Geral da ONU para criticar quem faz exatamente
o mesmo.
A questão é saber
se, na casa do ferreiro, menos comércio equivale a mais benefício para a
população. Em geral, não.
Na tradicional
cerimônia das Nações Unidas, Dilma classificou de "espúria e fraudulenta" a
vantagem comercial obtida por meio de medidas protecionistas, bem como criticou
"todas as formas de manipulação do comércio".
Em sua frase mais
forte, disse:
"Não podemos
aceitar que iniciativas legítimas de defesa comercial dos países em
desenvolvimento sejam injustamente classificadas como
protecionismo".
Na realidade,
Dilma foi dura na condenação de uma prática que, infelizmente, tem vicejado no
país com especial vigor nos últimos anos. Diferentes levantamentos apontam o
Brasil entre as nações que mais têm adotado práticas de restrição ao comércio
como forma de se contrapor às dificuldades econômicas surgidas a partir da crise
detonada pela quebra do banco Lehman Brothers, há exatos quatro
anos.
Em junho, ONU, OMC
e OCDE mostraram que o governo brasileiro foi recordista na aplicação de novas
medidas protecionistas no mundo ao longo de 2012, conforme informou O Estado de S.Paulo à
época. Foram erigidas 17 novas barreiras contra importações e 16 medidas
antidumping entre outubro de 2011 e abril de 2012.
Nem a empedernida
Argentina ousou tanto.
Outro
levantamento, feito pela consultoria Global Trade
Alert, coloca o Brasil como o
oitavo país que mais adotou mecanismos de restrição ao comércio desde 2008:
foram 56 medidas, criando defesa para 33 setores da economia e afetando as taxas
de 258 produtos, de acordo com a entidade.
Se sete países
foram mais fechados, outras 194 nações foram mais liberais que nós no
enfrentamento da crise.
Nesta leva, não
estão consideradas as novas rodadas de restrições brasileiras, como a decisão,
tomada no início deste mês, de aumentar a alíquota de importação de cem produtos
estrangeiros - alvo de protestos do Departamento de Comércio dos EUA na semana
passada.
Naquela ocasião, o
governo Dilma antecipou que outro tanto de produtos também serão afetados em
breve.
Ninguém aqui
defende que o Brasil seja passivo às investidas de outras nações sobre o mercado
local. Não: o interesse nacional deve, sim, ser firmemente defendido pela nossa
diplomacia e pelos nossos governantes.
Nisso, Brasília
age corretamente.
A questão é
identificar até onde a escalada protecionista beneficia o cidadão, o consumidor
e as empresas nacionais. Mais comércio, e mais abertura, tendem a contemplar
melhor os interesses das nações do que mecanismos que restrinjam os negócios. A
burocracia é inimiga da eficiência.
Quando anunciou o
pacote de aumento de alíquotas no início de setembro, o governo federal divulgou
que estará monitorando o comportamento dos preços praticados no varejo para
garantir que o consumidor não será prejudicado por preços mais
altos.
Não se tem
notícia, porém, de como conseguirá ressuscitar práticas pretéritas que já não
cabem no ambiente econômico contemporâneo.
Fechar as portas
ao comércio internacional serve, em geral, para abrir oportunidades para
interesses bem situados no mercado interno. Cada concorrente externo a menos é
um estorvo que um mau empresário ineficiente consegue afastar do seu
caminho.
Por isso, o
protecionismo deve ser sempre visto com redobrada cautela.
É positivo que a
presidente da República defenda os interesses do país, de suas empresas e de
seus cidadãos. Mas restringir o mercado local à participação de concorrentes
estrangeiros não pode servir para salvaguardar o poder de lobbies bem
articulados em Brasília.
O país não deve se
fechar.
Deve, sim,
tornar-se mais eficiente, competitivo, moderno.
Para enfrentar
seus concorrentes de peito aberto, e não apenas nos acarpetados salões da
ONU.
Fonte: Instituto
Teotônio Vilela
28 de setembro de 2012
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