"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 4 de setembro de 2012

MENSALÃO:RELATOR DÁ SINAIS DE QUE CULPARÁ NÚCLEO POLÍTICO

Ao analisar os empréstimos concedidos ao PT, ministros apresentam argumentos que sinalizam para a condenação de ex-integrantes do comando nacional do partido, como Delúbio e Genoino
Quando exibem convicções a respeito de réus e crimes descritos na denúncia do mensalão, os ministros deixam escapar a posição sobre outros aspectos do processo que ainda serão julgados.

O relator, Joaquim Barbosa, ao tratar do capítulo cinco, relacionado aos empréstimos do Banco Rural ao PT e às empresas de Marcos Valério, deixou transparecer que se convenceu do envolvimento do chamado núcleo político nas fraudes financeiras.


Do mesmo modo, o revisor, Ricardo Lewandowski, confirmou entendimento de que as operações bancárias representaram "negócio de pai para filho" para beneficiar o PT e as agências de publicidade de Marcos Valério.

Nenhuma palavra dos magistrados que já votaram até agora relaciona o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu a essas operações. O ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o ex-presidente do partido José Genoino, no entanto, aparecem como envolvidos — ao lado de integrantes do apontado núcleo financeiro — pelas fraudes no PT.

O relator disse que os empréstimos eram uma forma de lavar dinheiro transferido para a legenda por meio de uma operação criminosa. Antecipou, assim, uma posição que só será tratada no próximo capítulo, que deve ser julgado na semana que vem.

Joaquim Barbosa ressaltou constar a assinatura de Genoino nos contratos de crédito e a participação de Delúbio e Marcos Valério como os avalistas, embora sem patrimônio suficiente para honrar as dívidas em caso de inadimplência. Delúbio e Genoino respondem por formação de quadrilha e corrupção ativa.

Na denúncia, o Ministério Público aponta Genoino como o elo político, o negociador dos acordos com os demais partidos aliados no Congresso.

Recuperação financeira

Delúbio fazia, segundo a ação penal, a intermediação entre o PT e os núcleos operacional e financeiro, especialmente na montagem do esquema ao lado de Marcos Valério. As linhas de raciocínio de Lewandowski e principalmente do relator complicam a vida dos dois petistas. Em sua defesa, Genoino alega que não tinha conhecimento das operações a cargo de Delúbio e teria um papel secundário nas decisões partidárias.

O advogado Arnaldo Malheiros, que representa o ex-tesoureiro do PT, citou o diretório nacional — um ente que não pode ser responsabilizado criminalmente — pelas decisões sobre a recuperação financeira da legenda. Foi uma forma de inocentar Genoino. Os ministros terão de analisar se a assinatura do petista nos empréstimos o envolve criminalmente na suposta fraude bancária.

Em seu voto ontem, Joaquim Barbosa tratou dos envolvidos nos empréstimos como "organização criminosa" o que leva a crer que reconhecerá o crime de formação de quadrilha constante da denúncia pelo menos para alguns réus. Nesse rol, estão 21 pessoas.
José Dirceu é considerado pelo Ministério Público o chefe, o mentor de todo o esquema.
Caixa dois

Desde que o escândalo veio à tona, Delúbio nunca negou que tenha repassado dinheiro a presidentes de partidos e a parlamentares. Mas justifica as transferências como caixa dois, recursos não contabilizados na Justiça Eleitoral para quitar dívidas de campanha.

Os ministros do STF já concluíram, ao condenar o deputado João Paulo Cunha (PT-SP), Marcos Valério e o ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, que essa verba, repassada pelo PT a políticos, saiu dos cofres públicos.

Agora relator e revisor concordam que os empréstimos também eram uma transação simulada para abastecer esse caixa político. E por maioria os ministros também já concluíram que não importa a destinação dos recursos repassados aos políticos para caracterizar corrupção.

Significa dizer que mesmo tendo o repasse sido destinado a pagamento de dívidas de campanha, como alega a defesa, o crime está configurado.
Quando o STF condenou João Paulo, entre os que sustentaram esse ponto de vista estavam os ministros Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Rosa Weber,
Cármen Lúcia
e Luiz Fux.

Na denúncia, a Procuradoria Geral da República descreve os empréstimos como uma espécie de ajuda do banco e de Marcos Valério em troca de favorecimentos do governo na liquidação do Banco Mercantil de Pernambuco.

Segundo o relator, recursos entravam por meio de empréstimos nas contas do PT e das empresas de Marcos Valério para serem usados livremente numa manobra para ocultar as operações suspeitas.

Lewandowski ressaltou ontem que os empréstimos mais pareciam "doações", uma vez que não havia uma análise real dos riscos de inadimplência e os contratos eram renovados em descumprimento às regras do próprio banco, do Banco Central e do mercado.
As acusaçõesConfira quais são os petistas que são réus no mensalão
José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil
O ex-presidente do PT e ex-ministro do governo Lula responde por corrupção ativa e formação de quadrilha. Segundo a denúncia, Dirceu seria o "chefe da quadrilha do mensalão" e teria montado o suposto esquema de pagamento a parlamentares.


Anita Leocádia, ex-assessora parlamentar do PT

A ex-assessora parlamentar do PT teria recebido R$ 20 mil diretamente de Marcos Valério, em um hotel de São Paulo, a mando do ex-deputado Paulo Rocha. Foi denunciada por lavagem de dinheiro.

Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT

É acusado de formação de quadrilha e corrupção ativa. Segundo a denúncia, Delúbio seria o intermediário entre José Dirceu e Marcos Valério e teria ainda recebido R$ 550 mil do esquema.

João Magno, ex-deputado do PT

Acusado de lavagem de dinheiro, o ex-parlamentar teria usado o suposto esquema montado com o Banco Rural para receber R$ 360 mil de Marcos Valério.

João Paulo Cunha, ex-presidente da Câmara

Ex-presidente da Câmara dos Deputados e atual deputado federal pelo PT, ele já foi condenado por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro. Falta apenas a fixação da pena do petista.

José Genoino, ex-presidente do PT

O ex-presidente do PT responde por formação de quadrilha e corrupção ativa. Segundo a denúncia, ele era o interlocutor político do grupo criminoso e formulava as propostas de acordos aos líderes dos partidos da base aliada do governo.

Paulo Rocha, ex-deputado do PT

Foi denunciado pela PGR por lavagem de dinheiro. Segundo a acusação, ele teria recebido R$ 820 mil do esquema de Marcos Valério, por intermédio de dois assessores, entre eles Anita Leocádia.

Professor Luizinho, ex-deputado do PT

Denunciado por lavagem de dinheiro, o ex-deputado do PT é acusado de receber R$ 20 mil do esquema de Marcos Valério por meio de seu assessor José Nilson dos Santos.
Dança das cadeiras no plenário
A aposentadoria do ministro Cezar Peluso, oficializada na semana passada, mudou a ordem de disposição dos magistrados no plenário do Supremo Tribunal Federal. Na sessão de ontem, as alterações já entraram em vigor.

Como os integrantes da Corte se sentam de acordo com a antiguidade no STF, a saída de Peluso fez com que os ministros que chegaram ao Supremo depois dele mudassem de lugar, deixando vaga a cadeira do futuro integrante da Corte.
O presidente, Carlos Ayres Britto, o decano, Celso de Mello, Marco Aurélio Mello e Gilmar Mendes, que ingressaram no Supremo antes de Peluso, continuaram em seus lugares. Mas os outros tiveram que pular uma cadeira na disposição do plenário.
ANA MARIA CAMPOS e DIEGO ABREU
Correio Braziliense
04 de setembro de 2012

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