A cena parece inimaginável. Centenas de europeus buscam informações sobre oportunidades de
ocupação… em consulados brasileiros! A razão disso é clara: a economia na zona do euro claudica.
Por aqui, os números do crescimento econômico, ainda que os indicadores “não sejam uma Brastemp”, permitem às autoridades brasileiras gabar-se da inversão de papéis: o Brasil não mais exporta mão de obra para a Europa; importa-a.
Essa realidade, todavia, merece um olhar crítico. Vê-se que muitos pretendentes exibem currículos de fazer inveja aos nossos jovens. Vários deles são egressos de universidades que se destacam mundialmente pela qualidade de ensino.
Pensemos, pois, na seguinte hipótese: uma montadora de automóveis controlada por capitais estrangeiros – alemães, digamos – procura um bom engenheiro na área de mecatrônica.
Entre dois concorrentes – um brasileiro e um europeu -, a empresa transnacional instalada no Brasil, ciente da disparidade entre os níveis de conhecimentos tecnológicos ministrados nas universidades brasileiras e nas europeias, não vacilará na escolha: ofertará o emprego ao felizardo gringo, que, certamente, quase nada entende do vernáculo, mas que, além dos conhecimentos específicos, já deve se virar em outras línguas, pelo menos no inglês, com muita naturalidade. Já não vimos essa cena em comerciais da Volkswagen?!
O fato é que estamos atrasados no desenvolvimento tecnológico aplicado. Como exportadores de produtos primários, ficaremos à margem do processo de formação da classe operária do século XXI: trabalhadores que dispõem, como mercadoria, de sua força de trabalho intelectual, com notáveis habilidades matemáticas e nas áreas das ciências naturais.
Na divisão internacional do trabalho, caso não haja uma urgente reversão de nossas estratégias econômica e educacional, seremos relegados a uma subalternidade incorrigível.
E atenção! Falando em alemães, o Bundesagentur für Arbeit – o Sine alemão – informa que, na “locomotiva europeia”, há, hoje, 2,7 milhões de alemães desempregados, muitos deles, com excelente formação profissional. Isso indica que boa educação é requisito de empregabilidade, mas já não é garantia de emprego.
Marx, nos seus famosos “Grundrisse”, de 1858, já previa que esse processo ocorreria. Na semana passada, vi um documentário sobre o “Enem” chinês: o dificílimo Gao Kao.
A obsessão pela educação superior de qualidade parece evidenciar que, ao contrário do que se imagina, os camaradas do Império do Centro ainda se dedicam à absorção da doutrina marxista. Resta o claro enigma, digno de um “Blade Runner”: o que o destino reservará aos bilhões de desocupados que viverão na miséria extrema porque desvinculados da produção social? E o que será dos que ainda sobrarão, mesmo que bem-qualificados?
15 de novembro de 2012
Sandra Starling
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