Como um conflito terrível e pouco conhecido continua a moldar um país
A guerra, conhecida no Paraguai como a “Guerra de 70” ou “Grande Guerra”, está entre as piores derrotas militares jamais impostas a um estado-nação contemporâneo. De acordo com Thomas Wingham, da Universidade de Geórgia, até 60% da população e 90% dos homens do Paraguai morreram em combate ou, com mais frequência, devido a doenças e fome.
A repercussão diplomática contra o impeachment de Fernando Lugo ressuscitou o debate sobre esse trauma nacional. Após 142 anos, o Paraguai ainda lida com a mistura de soberba e heroísmo que lançou o país em uma rota de autodestruição, uma tragédia que ainda o define.
No meio de década de 1880, o Paraguai era um poder regional de médio porte. Em 1862, Carlos Antonio López morreu e foi sucedido por seu filho, Francisco Solano. O jovem López exigia deferência absoluta e estava empenhado em construir uma reputação de estadista para si. Em 1864 ele percebeu uma chance. A fim de proteger seus interesses comerciais, o Brasil ameaçou intervir em uma guerra civil no Uruguai, um pequeno Estado de transição entre Argentina e seu próprio território. López temia que isso desequilibrasse o equilíbrio regional de poder, de modo que anunciou que o Paraguai não podia tolerar a presença de tropas brasileiras em solo uruguaio.
Dom Pedro o ignorou e invadiu o Uruguai. Logo a seguir, López declarou guerra contra o Brasil e atacou o Mato Grosso, uma província continental. Em seguida também enviou um destacamento para o Uruguai. Quando a Argentina se recusou a permitir que as tropas paraguaias marchassem através do território argentino, López as enviou mesmo assim. Após o lado apoiado pelo Brasil ter vencido a guerra no Uruguai, os três governos assinaram um pacto secreto. Eles concordaram em anexar metade do território paraguaio, coletar pagamentos de reparação e proibir o país de manter um exército — além de batalhar até que López fosse removido do poder.
O Paraguai não tinha muitas chances. A população combinada dos aliados era 25 vezes maior. O que começou como uma leviandade caprichosa se tornou uma guerra total e uma batalha pela sobrevivência nacional.
López suspeitou de uma vasta conspiração contra ele e encarcerou e torturou milhares de seus apoiadores mais leais. Não havia mão de obra para trabalhar no campo e a fome se instalou.
López continuou a retirada. Em 1870, o exército brasileiro finalmente o encurralou em Cerro Corá, no remoto nordeste do país. Em seu anel estava gravado um lema, "vitória ou morte", que foi honrado por ele devido a sua recusa em se render. "Morro com minha pátria", proclamou antes de ser alvejado — embora seus partidários insistam que ele tenha dito "para minha pátria". Elisa Lynch, sua esposa irlandesa, o sepultou ao lado de seu filho.
De acordo com um censo improvisado feito após a guerra, restavam apenas 29 mil homens acima dos 15 anos no Paraguai. A guerra aniquilou a elite paraguaia.
Na década de 1920, as tensões estavam se elevando com a Bolívia devido à região do Chaco, erroneamente considerada rica em petróleo. Ávido por fomentar o sentimento nacionalista, o governo relançou López como um símbolo do espírito belicoso do país.
De 1932 a 1935, os dois países entrarem em guerra. Dessa vez o Paraguai venceu. Com o orgulho do país restaurado, os restos mortais de López foram transferidos para um altar coberto no centro de Assunção. Hoje em dia, "el mariscal" é o improvável ícone do país.
No entanto, apesar dessa hagiografia desajeitada, o Paraguai não fez muito para contar a verdadeira história da guerra. Assunção não tem nenhum museu histórico e os principais campos de batalha foram negligenciados.
Talvez a tragédia final da guerra seja o fato de que o conflito é tão pouco conhecido fora do país.
Fontes:The Economist - Paraguay's awful history: The never-ending war
12 de janeiro de 2013
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