Depois de 42 anos como deputado federal, Henrique Eduardo Alves, atual líder do PMDB, está prontinho para presidir a Câmara a partir de fevereiro próximo.
Sabe tudo o que se passa ali dentro. Sabe como fazer passar tudo ali dentro.
Sabe quem importa ali dentro e quem não importa. E conta com os votos da maioria esmagadora dos partidos, do governo à oposição. Sem falar do apoio da presidente Dilma.
O que falta para que ele dê como certa sua eleição?
A apuração dos votos. E que até lá o deixem em paz, ocupado em cabalar votos em troca de cargos na direção e em gabinetes da Câmara, nos ministérios e empresas estatais onde o PMDB manda.
Um conselho: e nada de investigar o passado remoto ou recente de Henrique. Porque quem procura acha. E o que acha quase sempre desfavorece o alvo do achado.
No último fim de semana, a Folha de São Paulo e a Veja publicaram preciosos achados que, por um lado, reforçam as chances de Henrique junto aos seus colegas e, por outro, o deixam mal com o distinto público.
Os colegas poderão dizer com orgulho: “É um dos nossos”. Quanto ao que dirá o distinto público... O que importa?
Quantos políticos vagabundos, desonestos, encrencados com a Justiça não se elegem e se reelegem com o voto irresponsável do distinto público?
Leandro Colon, repórter da Folha, descobriu que uma parte do dinheiro das emendas ao Orçamento da União apresentadas por Henrique foi parar na Bonacci Engenharia, empresa de Aluizio Dutra de Almeida, tesoureiro do PMDB no Rio Grande do Norte, Estado de Henrique.
Aluizio é assessor de Henrique desde 1998. A Folha identificou três prefeituras que contrataram a Bonacci Engenharia com dinheiro federal obtido por Henrique.
Em 2009, Henrique destinou R$ 200 mil de suas emendas para a construção de uma praça em Campo Grande, a quase 300 quilômetros de Natal. No ano seguinte, o dinheiro saiu e a prefeitura contratou a empresa do assessor de Henrique para tocar a obra.
Repetiu-se o script com obras nas cidades de São Gonçalo do Amarante e Brejinho.
Os mais lenientes dirão: a Bonacci deve engordar o Caixa 2 das campanhas de Henrique. Qual o político que dispensa Caixa 2?
Jamais esqueçam: Caixa 2 é crime.
Os mais desconfiados dirão: Henrique deve ser sócio oculto da Bonacci.
Sem prova robusta, substancial não vale.
Quem sabe a teoria do domínio do fato não dá um jeito nisso? Deu no mensalão. Condenou cabeças coroadas.
(Mudou de assunto, foi, Noblat? Abandonou Henrique?)
O indigitado recusou-se a comentar a reportagem da Folha. Talvez porque ao comentar a da Veja tenha se dado muito mal.
A Veja conta que Henrique gasta R$ 8.300,00 com aluguel mensal de veículos.
Ocorre que as notas fiscais apresentadas por ele para reembolso pela Câmara são emitidas por uma empresa registrada em nome de uma laranja.
Com endereço na periferia de Brasília, a empresa atende pelo nome de Global Transportes. Sua falsa dona é Viviane dos Santos, ex-vendedora de tapetes. Viviane diz que emprestou seu nome a uma tia. E que a Global não possui carros. Nunca possuiu.
Kelen Gomes, a tia, é quem fornece as notas fiscais para o gabinete de Henrique.
À Veja, primeiro Henrique disse que usa seu próprio carro quando está em Brasília. Corrigiu-se em seguida: admitiu que usa carros alugados, embora não lembre do modelo de nenhum deles.
Por fim, escalou um assessor para explicar melhor a história. “Talvez o deputado não se lembre, mas foi ele quem mandou contratar essa empresa”, explicou melhor a história Wellington Costa, o assessor.
Henrique tem uma queda especial por viver perigosamente. Que o diga seu par constante, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), candidato a líder do partido na Câmara (foto abaixo).
Por duas vezes pelo menos, episódios desabonadores obrigaram Henrique a submergir para escapar do risco de perder o mandato.
Em maio de 2002, escolhido para ser vice na chapa presidencial encabeçada por José Serra, quase que Henrique afundou de vez.
Foi acusado pela ex-mulher, Mônica Infante de Azambuja Alves, de ter R$ 15 milhões em paraísos fiscais nas Bahamas, no Canal da Mancha e em Genebra, além de uma conta no Lloyds Bank em Miami, nos Estados Unidos.
Mônica e Henrique enfrentavam um processo de divórcio litigioso. Ela queria mais do que Henrique estava disposto a dar. Então entregou a seus advogados extratos bancários, contas telefônicas, comprovantes de despesas de cartão de crédito e bilhetes de Henrique como provas do que dizia.
E o que ela dizia no processo mantido em segredo pela Justiça foi parar nas páginas da revista IstoÉ. Uma conta telefônica de janeiro de 1995 mostrou alto número de ligações de Henrique para o banco suíço Union Bancaire Privée (UBP): apenas numa semana foram feitas 38 chamadas.
Em bilhete manuscrito enviado por fax ao banco, o deputado autorizava uma aplicação de US$ 420 mil por seis meses. A conta 2453333 HM no UBP de Jersey mostrou uma movimentação de US$ 500 mil em 1996.
Mônica acabou se entendendo com Henrique. Retirou o que dissera contra ele. Vendeu caro seu silêncio. E ainda conseguiu um emprego na Infraero arranjado pelo ex-marido.
A Receita Federal fez de conta que tudo não passara de uma reles briga de casal – e não investigou a denúncia de Mônica.
Serra foi derrotado por Lula. Henrique aderiu ao governo Lula. Cinco anos depois se meteu em outra enrascada. Usou notas fiscais do jornal Tribuna do Norte para receber da Câmara parte da verba indenizatória.
De R$ 15 mil mensais à época, a verba servia para reembolsar gastos com consultores, combustível, transporte e outras pequenas despesas.
Em janeiro de 2007, Henrique alegou ter gastado R$ 25 mil com a divulgação de suas atividades por meio do jornal que pertencia a ele e à sua família. O jornal sempre abrira espaço de graça para projetar seu dono. Passou a cobrar, disse Henrique.
Parece crível? À direção da Câmara pareceu, sim.
O ritual de passagem de Henrique foi cumprido.
De volta ao começo: “Depois de 42 anos como deputado federal, Henrique Eduardo Alves está prontinho para presidir a Câmara a partir de fevereiro próximo”.
14 de janeiro de 2013
Ricardo Noblat
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