A crise europeia tem se revelado fatal para os governos, qualquer que seja sua coloração política. Obrigados a tomar medidas impopulares para reduzir déficits, dívidas e fazer reformas dolorosas, são punidos pelos eleitores quando ocorrem eleições. Na Itália, como não podia deixar de ser, foi um pouco diferente. Abalado por escândalos de ordem pessoal e contrário às medidas de austeridade reivindicadas pela União Europeia, Berlusconi renunciou no fim de 2011 ao ser derrotado no Parlamento, que aprovou o pacote.
Com grande habilidade, o presidente Giorgio Napolitano convocou para formar o novo governo o economista e ex-comissário europeu Mario Monti, com a missão de impedir que a Itália afundasse na crise e seguisse o caminho da Grécia. Napolitano conseguiu o apoio da maioria dos parlamentares ao governo de técnicos de Monti, inclusive do recalcitrante Berlusconi.
Durante um ano, Monti fez o que se esperava dele: corte de gastos públicos, flexibilização parcial da legislação trabalhista (para baixar custos empresariais) etc., resgatando boa parte da credibilidade do país, o que se refletiu nos mercados e reduziu o custo de rolagem da dívida.
Com isso, passou a receber total apoio da UE e, principalmente, da líder que tem dado as cartas na crise da zona do euro: a chanceler alemã Angela Merkel.
Mas Berlusconi tem faro apurado e viu no desgaste de Monti, pelos mesmos motivos pelos quais outros governos europeus foram castigados, a chance para voltar à cena política.
Depois de ácidas críticas ao economista, a quem acusou de pôr a Itália de joelhos diante da Alemanha, Il Cavaliere retirou seu apoio a Monti, que se demitiu, obrigando à antecipação das eleições gerais para hoje e amanhã. Faz, como é do seu feitio, promessas populistas, inexequíveis.
À frente nas pesquisas está a coligação de centro-esquerda liderada pelo Partido Democrático, de Pier Luigi Bersani. Em segundo, mas reduzindo a distância, vem a coligação de direita de Berlusconi, que prometeu aos aliados, em caso de vitória, não ser o premier.
O próprio Monti concorre, mas sua lista vem num distante quarto lugar. O grande destaque é o movimento Cinco Estrelas, do comediante Beppe Grillo, iconoclasta, antieuro e anti-Europa. Está em terceiro, simbolizando o desencanto do eleitor italiano.
O quadro é de incerteza. A maior parte das pessoas sensatas torce por uma vitória da esquerda e uma posterior coligação dela com os centristas de Monti.
Aí reside a esperança de manutenção da política de austeridade do ex-premier. Infelizmente, é grande a chance de sair uma coligação frágil, sem forças para se manter no poder, o que seria ruim.
Como seria de altíssimo risco a volta do populista Berlusconi. A única força descartada por todos é a de Beppe Grillo, um estranho no ninho. Mas, dada a fragmentação política, não surpreenderá se ele acabar sendo o fiel da balança.
24 de fevereiro de 2013
Editorial O Globo
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