O presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Alves (PMDB-RN), reuniu os líderes das bancadas na Casa para avisar que porá em votação na primeira semana de abril a proposta de reforma política elaborada nos últimos dois anos pelo relator Henrique Fontana (PT-RS). A última tentativa de fazer uma reforma política ampla chegou ao plenário da Câmara em 2007 pelas mãos de Ronaldo Caiado (DEM-GO), mas, por falta de consenso entre as bancadas nem chegou a ser votada.
Agora Alves não vê necessidade de consenso em torno do tema, que quer resolver no voto. A grande questão, desde sempre, é se o País precisa mesmo dessa reforma política, pela qual os nobres deputados tanto anseiam. O ex-presidente Marco Maia (PT-RS) disse em 2011 que a reforma preparada pelo colega de bancada era "prioritária", cogitou pô-la em discussão de forma "fatiada", mas a ideia não prosperou. Alves a usou como bandeira de sua eleição para o alto posto que ocupa.
Interessante é observar as coincidências dos projetos de Caiado, de direita, e Fontana, de esquerda, sobre os dois temas por ambos considerados prioritários: o financiamento público de campanha e o fim das coligações nas eleições proporcionais.
"Temos de retirar a força que o poder econômico tem hoje para decidir os rumos de uma eleição. A democracia brasileira é cada vez menos uma democracia de opiniões, de programas e projetos, e é cada vez mais uma democracia da força do dinheiro decidindo eleições. E isso tem de mudar", argumentou o relator. A julgar pela argumentação, seu partido, o PT, deve ser hoje a expressão política da burguesia endinheirada do Brasil, de vez que venceu três eleições presidenciais seguidas.
O cidadão, de cujo bolso, na forma de impostos, sairia o tal financiamento público, que já banca o horário dito "gratuito" no rádio e na televisão nas campanhas eleitorais e o fundo partidário, teria de arcar sozinho com o custo crescente das campanhas políticas sem nenhuma garantia de que isso acabaria com a corrupção, ao contrário do que pregam os adeptos desta mudança. Quem disse que dinheiro público não é furtado aqui? E Fontana não explicou qual a relação entre financiamento privado e a endêmica falta de programas e ideias dos partidos.
Outro ponto comum entre o ex-relator do DEM e o atual do PT é a coincidência das eleições. A exemplo de Caiado, Fontana não aprova a realização de eleições de dois em dois anos, mas não encontra argumentos mais fortes por justificar a realização de todos os pleitos de quatro em quatro anos do que a economia dos gastos em processos eleitorais. Será que os gastos no Tribunal Regional Eleitoral em cada disputa são excessivos a ponto de justificarem a dificuldade de se votar de uma vez só em vereador, prefeito, deputado estadual, governador, deputado federal, senador e presidente?
Para evitar essa questão bisonha, o relator discute a possibilidade de realização do pleito presidencial com dois meses de diferença das eleições gerais para governador, senador, deputado federal, deputado estadual, prefeito e vereador. Ou seja, sua fórmula ressuscita o lema do Chacrinha: "Não vim aqui para explicar, mas para confundir".
O fim das coligações em eleições proporcionais é também um cavalo de batalha do PT e do relator, que argumentou que, pela fórmula atual, é possível votar num candidato de um partido ambientalista e ajudar a eleger algum inimigo da ecologia. Tem razão.
Mas a proposta de Fontana atinge o auge da confusão ao propor o chamado sistema "belga", pelo qual o eleitor pode votar apenas na legenda e, com isso, eleger os candidatos a vereador, deputado estadual e deputado federal colocados no topo da lista apresentada pelo partido. Ou em seu candidato, que terá preferência. Na contagem final, se um partido tiver 80% dos votos em candidatos e 20% só na legenda, apenas uma vaga será ocupada de acordo com a ordem determinada pela cúpula partidária. Chacrinha não poria defeito nessa fórmula.
Todas essas mudanças fortalecem, como propugna o relator, os partidos e os políticos. Mas não beneficiam o cidadão. Ou seja: fingem mudar alguma coisa para, no fim, nada mudar.
30 de março de 2013
Editorial do Estadão
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