As campanhas eleitorais brasileiras custam os olhos da cara, mas isso não tira o sono dos candidatos e seus partidos. Eles gastam literalmente o que têm e o que não têm, principalmente para pagar os publicitários e marqueteiros incumbidos, a peso de ouro, de mostrá-los ao eleitorado sob o ângulo mais favorável - uma proeza e tanto, em muitos casos, sendo o que é a qualidade da clientela para quem trabalham.
Os políticos vão em frente na gastança porque sabem que as milionárias dívidas acumuladas na temporada de caça ao voto - cobertas apenas em parte pelas doações declaradas de grandes empresas e pelo recebimento de "recursos não contabilizados" do caixa 2 - serão saldadas, mais dia, menos dias, pelo desvalido contribuinte.
A gazua que lhes dá acesso aos cofres públicos para onde são carreados os impostos cobrados da população atende pelo nome de Fundo Partidário, que merecia ser chamado, isto sim, fundo perdulário. Em nome do fortalecimento do pluripartidarismo - portanto, da democracia e da promoção da igualdade de oportunidades eleitorais entre as siglas -, no período de 10 anos até 2012, o Estado nacional transferiu-lhe aproximadamente R$ 2 bilhões.
Da dinheirama, 95% são distribuídos proporcionalmente à votação recebida pelas diversas legendas para a Câmara dos Deputados a cada pleito. O restante é rateado em partes iguais.
Além disso, sempre que um partido aparece em rede nacional obrigatória de rádio e TV, o governo recompensa as emissoras pela publicidade comercial perdida no período, isentando-as do pagamento de impostos. No ano eleitoral de 2012, a renúncia fiscal chegou a R$ 606 milhões, apurou o repórter Daniel Bramatti, do Estado.
O maná do Fundo Partidário - reajustado com base na inflação e no crescimento do eleitorado - não sacia, porém, a fome da tigrada. Tanto que, nos dois últimos anos, ao tramitar no Congresso o Orçamento da União, deputados e senadores aprovaram um adicional de R$ 100 milhões ao total já corrigido. Vão repetir a dose agora em 2013, elevando o montante a R$ 293,7 milhões.
Os políticos dizem abertamente que as campanhas estão cada vez mais caras, logo maiores as dívidas - e o País que arque com a dolorosa. Em dezembro, um membro da Comissão Mista de Orçamento, o deputado pernambucano Paulo Rubem Santiago, cometeu a imprudência de se opor à nova sangria. "Me olharam com cara de metralhadora", lembra. E, obviamente, a objeção de nada adiantou.
Como a noite que se segue ao dia, quanto maior o subsídio oficial à atividade política, tanto maior o número de interessados no butim. O Brasil, que já lidera o ranking das democracias que mais despendem recursos públicos para esse fim - foram R$ 6,8 bilhões a contar de 2003 -, é uma indigesta sopa de letrinhas partidárias.
Em funcionamento, são 30 legendas. Em gestação, mais 23, entre eles um Partido dos Servidores Públicos e dos Trabalhadores da Iniciativa Privada do Brasil (qual seria a sua sigla?), um Partido dos Estudantes, um Partido Militar Brasileiro e um Partido da Mulher Brasileira. Por que seria diferente?
O desempenho de uma agremiação nas urnas, por pior que seja, não a impede de tirar uma lasquinha do Fundo e do tempo de TV. Afinal, em má hora o Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucional a cláusula de barreira que pelo menos limitaria o acesso dos mal votados ao erário. Confunde-se direito de organização partidária com oportunidade de sugar o Estado.
Uma reforma política para valer teria de reduzir os custos extravagantes dos ciclos eleitorais. O tempo de propaganda na TV poderia durar menos, para onerar menos o contribuinte. (O ideal seria acabar com a onerosa pirotecnia de imagens publicitárias, como desejava o saudoso governador Mário Covas, mas isso é utópico.) Já o Fundo Partidário, no mínimo, deveria ficar imune a acréscimos como os que o Congresso tem aprovado cinicamente.
Do Estado, as agremiações deveriam receber não mais do que uma dieta de subsistência. Se querem se fartar, que tratem de ordenhar os seus filiados e mandatários, além dos eleitores que querem vê-las prosperar. Mas está para nascer - se é que nascerá - um Congresso que não vasculhe o bolso do povo.
05 de março de 2013
Editorial do Estadão
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