Votações recentes foram marcadas por bate-cabeça de ministros da articulação política, rebeldia nas bancadas dos partidos aliados e ameaça de CPI
Sessão para aprovar a MP dos Portos na Câmara dos Deputados durou mais de 20 horas - Laycer Tomaz
Embora nunca tenha dado grande atenção à articulação política, desde o início do seu mandato a presidente Dilma Rousseff não precisou se preocupar com a aprovação de projetos prioritários no Congresso Nacional. O resultado das urnas reduziu a oposição a uma minoria que não oferece perigo, e quase todos os partidos do país compõe a base do governo. Foram raras e pontuais as rebeliões em bancadas aliadas. Porém, há duas semanas, a situação se alterou. A falta de articulação política pôs em risco projetos do governo e promessas de Dilma - o que pode custar caro nas eleições do ano que vem.
A semana termina em conjuntura desfavorável ao Palácio do Planalto. Para salvar uma vitrine de Dilma, a redução nas contas de luz, o governo teve de editar um decreto. Sua coordenação política foi incapaz de garantir a aprovação da medida provisória que trata do assunto antes que ela perca a validade, na terça-feira. No Congresso, o governo enfrenta uma crise com seu principal aliado, o PMDB, que capitaneou a coleta de assinaturas para abrir uma CPI e apurar irregularidades na Petrobras.
As ministras Gleisi Hoffmann e Ideli Salvatti
O descuido na negociação com parlamentares não é uma novidade na atual gestão. Nos primeiros meses de governo, por exemplo, a presidente delegou ao inexpressivo deputado Luiz Sérgio, do PT do Rio de Janeiro, a tarefa de cuidar da relação com o Congresso. Em junho de 2011, Ideli Salvatti (PT-SC) assumiu a pasta das Relações Institucionais, Outra interlocutora do Legislativo é a ministra Gleisi Hoffmann (PT-PR), que assumiu a chefia da Casa Civil após a queda de Antonio Palocci Filho. Segundo parlamentares aliados, essa engrenagem política nunca foi perfeitamente azeitada. Agora, ela emperrou.
Para conseguir votar às pressas a MP dos Portos e tentar - sem sucesso - repetir a fórmula com a MP da energia elétrica, Ideli e Gleisi entraram em confronto aberto com lideranças de peso no Congresso. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), chegou a desligar o telefone na cara da chefe da Casa Civil na última terça-feira. O líder do governo na Casa, Eduardo Braga (PMDB-AM), também bateu boca com as ministras. Mais de uma vez, ambos não trataram de esconder a aspereza com que tratavam emissários do Palácio do Planalto.
“As pessoas que estão próximas da presidente precisam entender como funcionam as instituições”, afirmou Renan, após se recusar a acelerar a tramitação de MPs.
Por sua vez, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), desabafou depois de fazer o plenário aprovar a toque de caixa medidas de interesse do governo: “Não estou aqui para tapar o sol com a peneira, há uma realidade que temos de enxergar. Não é possível, com 420 deputados na base, não conseguir colocar 257 em uma sessão decisiva. Tem que se buscar razões, tirar lições para não passar nas próximas vezes por esse mesmo vexame.” E ele finalizou o diagnóstico: “Não adianta dizer que está tudo bem, porque algo não está bem”.
PMDB - Parlamentares do PMDB dão sinais claros de insatisfação na Câmara dos Deputados. O líder da bancada, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), tem insuflado parlamentares a confrontarem o Palácio do Planalto. “Há problemas dentro da base do governo, problemas de articulação política, sim”, disse Cunha na tumultuada votação da MP dos Portos.
Paralelamente, o deputado Leonardo Quintão (PMDB-MG) recolheu 199 assinaturas para criar a CPI da Petrobras - 52 delas só na bancada peemedebista. Embora o PT avalie que o partido aliado esteja blefando e que a comissão não sairá do papel, lideranças da Câmara alertam para o risco de o governo enfrentar uma comissão de inquérito em período pré-eleitoral.
Até agosto, o governo Dilma terá de correr para aprovar pelo menos mais cinco medidas provisórias importantes, como a que isenta itens da cesta básica de cobrança de PIS/Cofins e as que garantem socorro financeiro a municípios do Nordeste e créditos bilionários para ministérios. No Congresso, entretanto, o cenário atual prenuncia novos vexames.
Cinco MPs que estão trancando a pauta do Congresso
Mais duas medidas provisórias que estão prestes a perder a validade entram na pauta da Câmara dos Deputados nesta segunda-feira, em sessão extraordinária. As MPs 601/12 e 605/13 devem passar pelo crivo do Congresso - primeiro pela Câmara, depois pelo Senado - até a segunda-feira da semana que vem. Uma semana é exatamente o prazo de tramitação que o presidente do Senado, Renan Calheiros, exigiu ao final da novela da MP dos Portos. " Se a Câmara mandar qualquer MP com menos de sete dias, não vamos pautá-la. Esta será a última vez", ameaçou, apontando "atropelo institucional". Outras duas MPs que vencem daqui sete dias passaram pela Câmara na quarta-feira passada e agora trancam a pauta do Senado - ou seja, impedem a votação de outras matérias. São elas as MPs 597/12 e 600/12, as primeiras a desembarcar na Casa desde a maratona da MP dos Portos.
MP 601/12
Editada em dezembro de 2012 e retificada em fevereiro de 2013, a MP 601 amplia a lista de setores beneficiados pela desoneração da folha de pagamento, em particular a construção civil e o comércio varejista. No Congresso, o texto passou por uma comissão mista que aprovou na íntegra um parecer que estende ainda mais a relação de setores beneficiados. A MP entrou na pauta da Câmara na segunda-feira (27) e perde a validade segunda que vem (3).
31 de maio de 2013
Laryssa Borges, Veja
Nenhum comentário:
Postar um comentário