São comuns em matéria criminal tentativas variadas de postergar a execução das penas, a partir mesmo dos embargos de declaração.
Mas a sensação generalizada no Supremo Tribunal Federal é a de que, se o processo fosse contra qualquer outro político de qualquer outro partido, os advogados teriam até vergonha de apresentar recursos como os que estão chegando em relação à Ação Penal 470, popularmente conhecida como do mensalão.
O tom militante de alguns embargos de declaração demonstra que os réus estão defendendo uma causa política e querem desmoralizar o Supremo, com afirmações de que o acórdão é “ridículo”.
Pedidos para anular o acórdão, ou mudar o relator, “são pura militância política”, na definição de um dos ministros.
Os limites para os embargos de declaração estão fixados por três parâmetros: “obscuridade, omissão ou contradição”.
As partes que foram cortadas no acórdão, e que as defesas acusam de tornar o documento ininteligível, são geralmente apartes sem maior significação, ou então a questão está tratada de maneira mais aprofundada no voto escrito, e não há necessidade de repetir o que foi dito de improviso.
O que há de substancial está nos votos, o resto às vezes são apenas interjeições, afirmam os ministros.
Como a ampla maioria dos embargos de declaração apresentados não trata dessas questões, a impressão é que os advogados estão na verdade dando efeitos infringentes aos embargos de declaração, querendo modificar o acórdão.
Provavelmente o presidente do Supremo, ministro Joaquim Barbosa, deve encaminhar ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel, o teor dos embargos de declaração, para o seu parecer.
Se quiser abreviar a discussão, ao mesmo tempo em que não aceitará os embargos de declaração, pode colocar em discussão os embargos infringentes, que já estão incluídos nos embargos declaratórios apresentados.
Os ministros consideram que diversas questões apresentadas nos recursos já foram superadas no próprio julgamento, tudo foi discutido amplamente, os advogados acompanharam atentamente, e suscitavam indagações.
O melhor exemplo de que na verdade estão tumultuando na tentativa de melar o julgamento é a retomada de questões já resolvidas, como a do não desdobramento do processo para a primeira instância.
Esse debate foi feito na abertura do julgamento, por meio de uma petição extemporânea do advogado Márcio Thomaz Bastos, e foi resolvido com a composição completa do plenário do Supremo Tribunal Federal. A proposta de desmembramento do processo é tese que já havia sido rejeitada nada menos que três vezes pelo Supremo antes do julgamento.
A estratégia da defesa, na ocasião, era atrasar o julgamento para impedir que o ministro Cezar Peluso participasse da sua integralidade, o que foi conseguido, pois ele teve que se aposentar tendo julgado apenas o primeiro item.
Na base da defesa do desmembramento está a tentativa de descaracterizar a conexão entre os diversos crimes. À medida que cada um dos 38 réus fosse julgado isoladamente, ficaria mais fácil manobrar as diversas instâncias de recursos processuais.
O ministro Gilmar Mendes foi direto ao ponto no julgamento, lembrando que, se os processos fossem encaminhados isoladamente para a primeira instância judicial, quase certamente não teriam chegado a julgamento e os crimes prescreveriam.
Essa recente crise entre o Legislativo e o Judiciário, que acabou sendo superada pelo entendimento direto entre os presidentes da Câmara e do Senado e o ministro Gilmar Mendes, teve o efeito de chamar a atenção dos ministros para o que pode ameaçar o Tribunal.
O sentimento que prevalece é o de que o Tribunal precisa se reorganizar internamente, fortalecer-se diante dos ataques que vem sofrendo, e os embargos apresentados só confirmam que a questão está sendo tratada como uma ação política para tentar desqualificar a condenação dos réus do mensalão.
03 de maio de 2013
Merval Pereira, O Globo
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