"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 28 de junho de 2013

"NADA SERÁ COMO ANTES"

 
Se a histórica semana passada tivesse acontecido antes, os deputados não teriam dado a Comissão de Direitos Humanos a Marco Feliciano, e os condenados do mensalão já estariam na cadeia
Antes, os políticos justificavam o baixo nível do Congresso dizendo que, para o bem e para o mal, ele era um reflexo do Brasil, representava o que os brasileiros tinham de melhor e de pior. Ou seja, não se podia almejar um Congresso de primeira com um povinho de quinta. E durante muito tempo nos fizeram acreditar que os representantes não eram piores do que os representados. Na semana passada, o povo nas ruas provou o contrário.
 
As palavras de (des)ordem atingiram frontalmente os partidos, com sua cultura patrimonialista, seus privilégios afrontosos e seu distanciamento da indignação popular, como uma corporação que se apossou do Estado e se une quando seus interesses são ameaçados — como agora. Mas eles querem mais dinheiro (nosso) para os seus partidos.
 
Contra a corrupção eleitoral, eles propõem o financiamento público das campanhas, com a bolada sendo distribuída proporcionalmente às bancadas dos partidos no Congresso. Ou seja, PT e PMDB, enquanto para a oposição sobraria uma verba do tamanho da sua pequenez. É a forma mais fácil, e cínica, de um partido se eternizar no poder às custas do dinheiro publico. Por que o Zé Dirceu e o Rui Falcão não mandam a militância para a rua defender esta proposta?
 
O horário eleitoral e os fundos partidários — que já nos custam muito caro — bastam para equalizar as oportunidades e garantir eleições democráticas. Empresas não votam, só têm interesses, investem e depois cobram a conta. São os eleitores que devem ajudar as campanhas de seus candidatos com doações individuais limitadas. Na Itália, o Movimento Cinco Estrelas fez 25% dos votos sem verbas públicas, só com pequenas doações individuais. E ideias.
 
Se a histórica semana passada tivesse acontecido antes, Renan não teria sido eleito presidente do Senado, os juizes não ousariam se dar dez anos retroativos de vale-refeição, os partidos não apresentariam projetos para afrouxar o Ficha Limpa e a Lei de Responsabilidade Fiscal, não dariam a Comissão de Direitos Humanos a Marco Feliciano, e os condenados do mensalão já estariam na cadeia.

Foi por essas e outras que ela aconteceu.

28 de junho de 2013
Nelson Motta, O Globo

Nenhum comentário:

Postar um comentário