O presidente do Tribunal de Contas da União, Augusto Nardes, disse ontem (14) que "o principal erro" do governo Dilma na formatação do trem-bala entre São Paulo e Rio foi não ter preparado "uma proposta mais estudada, mais planejada, no início do processo". A obra foi adiada pela terceira vez nesta semana.
Nardes falou ao programa "Poder e Política", da Folha e do UOL. Ele foi o relator da primeira proposta do trem-bala, e diz ter apontado "onde estavam os erros" para o governo. Mas o projeto nunca se tornou atraente para as empresas e está sendo sucessivamente postergado.
"O projeto é muito grande. Onde há obras desse porte, se o Estado não aportar, ele é deficitário. As empresas não estão querendo participar. As empresas querem ganhar, querem ter lucro", diz o presidente do TCU.
Na entrevista, Nardes apresentou um estudo sobre as fragilidades gerenciais na execução dos investimentos federais no país. Diz ter mostrado os dados ao governo e propôs uma parceria para melhorar a governança do país.
Para o presidente do TCU, a baixa capacidade gerencial do governo ao executar obres está relacionada à demanda dos manifestantes que foram às ruas protestar em junho passado. "Não acredito que a gente possa combater a corrupção no Brasil sem uma melhoria de governança", diz Nardes.
Sobre o chamado "Orçamento Impositivo", na avaliação do ministro do TCU, o efeito pode ser o de diminuir a aplicação global dos recursos públicos, pois só as cidades escolhidas para ter verbas por deputados e senadores terão garantia de receber dinheiro.
Por causa dos diversos atrasos nos últimos anos, o projeto de transposição das águas do rio São Francisco pode não ficar pronto em 2015, prazo anunciado pelo governo -mesmo depois de o preço total da obra já ter dobrado, passando de R$ 8 bilhões.
Nardes se diz preocupado em dar mais transparência ao TCU. Uma das medidas que vai tomar, a partir da semana que vem, é abrir todos os dados sobre viagens de ministros e funcionários do órgão, algo inédito no Tribunal.
A seguir, trechos da entrevista:
Folha/UOL - Se o Orçamento impositivo for aprovado, qual será o impacto?
Augusto Nardes - A preocupação do Tribunal de Contas da União é nós termos uma visão do Estado como um todo, planificarmos o Brasil. Se tivermos por parte dos parlamentares uma visão coletiva de aplicar esses recursos em benefício das comunidades que eles representam, será positivo para aquela região.
Agora, se vermos o Estado como um todo que tem tantas necessidades, especialmente na área da educação, da saúde, temos gargalos imensos. Se esta visão não for contemplada, com certeza a questão do planejamento e pensar a médio e longo prazo terão prejuízo com o orçamento impositivo.
O Brasil precisa pensar coletivamente, no interesse da população. A questão que se coloca em relação aos parlamentares é se eles farão esse trabalho pensando no coletivo.
O governo federal gasta o dinheiro público com eficiência?
Com certeza, o governo, não somente federal, mas também os governos dos Estados, dos municípios, têm dificuldades para entregar para a sociedade um serviço com eficiência e com eficácia. Por algumas questões básicas. Uma delas é a falta de planejamento de forma antecipada. Falta de eficiência dentro dos quadros do governo. Nós temos 39 ministérios e muito desses ministérios não têm quadro de carreira, ou seja, não têm padrões mínimos de governança.
Eu diria que em alguns ministérios existe eficiência. Alguns Estados têm eficiência. Alguns municípios têm eficiência. Mas, no todo, nós temos, com certeza, falta de eficiência porque não se consegue entregar uma boa educação, uma boa saúde.
Esse quadro que o sr. trouxe mostrando o baixo percentual de investimentos em várias essenciais prova o quê?
Esse quadro explica que falta planejamento no Brasil.
Mas não tem um Ministério do Planejamento?
Que tem dificuldade de fazer a implementação das políticas.
Por quê?
Porque não foi feita uma discussão de forma antecipada das necessidades do país. Muitas vezes, o cidadão que está num ministério, ou na Casa Civil, ou na Presidência da República, atende muito mais a pressão da semana ou a pressão do mês e não planeja o Brasil a médio e longo prazo.
Nós não podemos continuar pensando assim. Esse é o grande desafio que o Tribunal de Contas da União quer propor para a sociedade, que é a melhoria da governança. Planejar a médio e longo prazo.
Nós estamos trabalhando num projeto nesse sentido. Quando eu trago este quadro, e esta é a pergunta, onde que se mostra as fragilidades da administração, que boa parte dos ministérios aplicam menos de 50% do que estava previsto para investimento, é que não há um sincronismo. Mas isso também acontece nos Estados. Acontece nos municípios.
Como funciona essa iniciativa?
Nós procuramos a Casa Civil, a ministra Gleisi Hoffmann. Tive uma longa conversa com o [vice-presidente] Michel Temer, também com a Miriam Belchior [ministra do Planejamento], propondo um grande projeto para Brasil que, de certa forma, nós já estamos fazendo.
Estamos fazendo uma auditoria coordenada. Chamamos 30 Tribunais de Contas dos Estados brasileiros. Na educação. Nós estamos falando de auditoria em conjunto em todo o ensino médio. Nós temos hoje 51 milhões de estudantes no ensino básico. Quantos destes estão chegando aos últimos três anos? Apenas oito milhões. Destes oito milhões, três milhões e 300 mil chegam ao terceiro ano do ensino básico. E apenas um milhão e 800 mil estão terminando. Nós começamos a auditoria em fevereiro. Assinamos esse ato de cooperação com todos os tribunais. Nós teremos condições de mostrar para a sociedade brasileira que na Região Sudeste, de São Paulo, apenas 52% estão concluindo o ensino básico. E na Região Norte apenas 36% estão concluindo o ensino básico.
E esses são dados impactantes. E o que o Tribunal está propondo? Mostrarmos junto com os Tribunais de Contas e avaliarmos onde estão os problemas, onde estão as causas da falta de uma boa governança, da falta de uma boa gestão para responder esse quadro.
Nós podemos ter uma educação melhor, uma saúde melhor. Para podermos dar condições de uma melhor gestão no país.
Essas auditorias ficam prontas em outubro?
Em outubro. Deverão ser relatadas em novembro. A partir desses dados, nós queremos fazer uma discussão com a sociedade brasileira, passar esses dados para toda a sociedade brasileira. Uma auditoria que vai mostrar o rosto do Brasil, a cara do Brasil na questão da educação.
Nós começamos a fazer no ano passado já este planejamento. Antes mesmo das manifestações que pediam a melhoria da educação no Brasil.
O sr. citou a obra da transposição das águas do rio São Francisco. Por que essa obra atrasa tanto?
Eu acho que o governo teve problemas seríssimos no início. Melhorou em algumas áreas.
No início quando?
No início lá em 2003, quando assumiu o presidente Lula. O número de obras que tinham problemas era muito superior ao que nós temos hoje. Melhorou em algumas áreas, mas ainda há deficiência como um todo na administração pública federal, como também há nos Estados e nos municípios.
Em relação à transposição do São Francisco, eu vou pegar esse exemplo para mostrar por que as coisas não funcionam. Primeiro, foi apresentado um projeto deficiente. O primeiro projeto, que é o básico, com um valor de R$ 4,5 bilhões. O que aconteceu? Depois foi apresentado um projeto executivo para aprofundar a execução também com deficiência porque o projeto básico estava deficiente. Como os projetos iniciais eram deficientes, o que aconteceu? As empresas que estavam se dispondo a fazer as obras... Como os cálculos não foram feitos de forma correta, teve um valor que é estabelecido pela legislação de 25% de aditivos que foram praticamente todos ultrapassados. O que aconteceu? O projeto inicial não foi bom. O segundo projeto não foi bom. Como consequência, as empresas tiveram que fazer solicitações de aditivos e ainda nós temos hoje sendo feitas licitações para as obras da transposição do São Francisco. Era para ser entregue em 2010. Agora, a previsão é para 2015. O valor inicial é R$ 4,5 bi. Hoje, já está em R$ 8,2 bilhões.
Dobrou.
Dobrou o valor porque não foi feito um bom planejamento.
O TCU participa na origem e na formulação das licitações, não é?
Sim.
Nesse caso, o que aconteceu?
Esse caso nós estamos acompanhando desde o início e por isso que nós temos todas as informações.
Mas o TCU alertou o governo sobre isso?
Alertamos, alertamos. Inclusive, desde o início. Mas o governo queria fazer. Você não pode impedir o governo de fazer. Você dá a orientação. "Olha, isso aqui não está correto." O que está acontecendo hoje para melhorar essa relação? Nós acertamos com a Casa Civil. Nós temos todas as concessões públicas que estão sendo feitas. Estão sendo feitas concessões de estradas, dos aeroportos. Nós estamos fazendo reuniões de forma antecipada. A Casa Civil tem nos procurado e nós temos orientado: "Olha, isso aqui não está certo, não está correto." E nós temos procurado ajudar o país, independente de partido A ou B. Ou seja, para que a obra não fique paralisada.
No caso especificamente da transposição do São Francisco, houve um sobrepreço, e que nós detectamos, de R$ 400 milhões. Alertamos o governo. Fizemos todos esses alertas.
Em relação a Copa do Mundo agora, nós já detectamos sobrepreço em todas as obras e trabalhos de forma preventiva sem parar uma obra. Nós detectamos sobrepreço de R$ 650 milhões.
No total de todos os estádios e obras?
De todos. R$ 650 milhões já foram detectados.
Somando estádios e obras urbanas no entorno?
É. Mobilidade urbana. Nós trabalhamos de forma preventiva.
Sobre a Copa do Mundo, aí são obras às vezes de responsabilidade dos Estados, das cidades. Algumas têm iniciativa privada. Esse sobrepreço se refere quais?
Ao que nós temos uma participação direta. Porque uma parte desses recursos são fiscalizados dos Tribunais de contas dos Estados. Nós temos participação quando existem recursos federais. Mas já fizemos a economia de um estádio e meio, pois alguns estádios estão valendo aí em torno do valor de R$ 400 milhões, R$ 500 milhões. Outros estão com valores extrapolados, não é?
O de Brasília, por exemplo, passa de R$ 1 bilhão...
É. Passa de R$ 1 bilhão. Nós não fiscalizamos o de Brasília porque foi feito com recursos próprios do Distrito Federal. Então, quem fiscaliza é o Tribunal de Contas do Distrito Federal.
No caso das obras que ficaram no escopo do Tribunal de Contas da União, o total que extrapolou foi cerca de R$ 650 milhões?
R$ 650 milhões. Estávamos com sobrepreço e nós conseguimos fazer repactuações para as empresas diminuírem.
Aliás, uma coisa que pouca gente sabe, nos últimos cinco anos nós fizemos uma economia de R$ 102 bilhões com repactuação de contratos. A gente vê que existe sobrepreço, determina para o gestor que não pague, que repactue. R$ 102 bilhões de economia o Tribunal de Contas da União fez nesses últimos cinco anos.
Sobre governança e capacidade de investimentos, a impressão que houve uma redução no ritmo do governo na troca do governo Lula para o governo da presidente Dilma Rousseff. Por que isso aconteceu?
Acho que a situação internacional contribuiu. A questão interna, a mudança de equipe. Alguma parte foi mudada. Acho também que o próprio governo resolveu fazer estrategicamente uma economia, já que tinha feito grandes investimentos em 2010, antes das eleições da presidente Dilma.
De certa forma, acho que o governo tirou o pé do acelerador para tentar equilibrar um pouco a situação econômica internamente e agora está tentando retomar. Mas a mudança do panorama internacional também atingiu o Brasil. Então, como consequência, nós tivemos uma diminuição do crescimento.
Comparado com os países da América do Sul, sem colocar os Brics [Brasil, Rússia, Índia e China], a América do Sul, a América Latina, está crescendo em torno de 5% e nós estamos crescendo em torno de 2%. Nós estamos muito aquém da América Latina como um todo.
Temos que retomar esse crescimento. Mas, para retomar o crescimento, nós temos que melhorar a infraestrutura do Brasil. O grande gargalo do Brasil, especialmente no agronegócio, que nós temos superávit na balança comercial -o agronegócio é o grande responsável pelo superávit da balança comercial-, é o fato de nós não termos estrutura para entregar os nossos produtos de forma adequada. Então, o governo tem que atacar de forma urgente na parte de infraestrutura da Região Sudeste, mas também nas demais regiões para poder exportar. Neste ano, nós tivemos perdas de safras, infelizmente, na própria lavoura. Apodreceu porque não tinha transporte e não tinha armazenagem.
Ainda sobre a transposição das águas do Rio São Francisco. A previsão agora é 2015. Pela avaliação de momento do TCU, esse prazo vai ser cumprido?
É 2015? É difícil de responder. Porque, por incrível que pareça, tem licitações sendo feitas ainda. Ou seja, por falta de um projeto básico feito lá trás bem feito e um projeto executivo, tem licitações sendo feitas ainda. Nós estamos 2013. 2015, portanto, um prazo cada vez mais exíguo. Então, eu não posso responder que poderá ser feito tudo até 2015 porque vai depender dessas licitações que estão ainda em andamento.
Há um risco?
Há um risco, com certeza, de um atraso considerável. Nós já estamos atrasados cinco anos. Isso é falta de organização, de planejamento do Estado brasileiro.
O sr. já esteve com a presidente Dilma tratando desses temas?
Eu tratei com a ministra Gleisi Hoffmann. Mostrei esse quadro para ela [sobre o baixo percentual de investimentos executados].
Qual é a reação do governo ao ver tudo isso?
A ministra Gleisi tem sido muito equilibrada, ponderada, tentando botar um pouco a casa em ordem, especialmente no sentido de fazer com que esses gargalos que existem na administração pública possam ser recuperados.
*Mas o governo entende o que está acontecendo? *
O governo entende, mas tem dificuldades. Falta treinamento em alguns setores. Um dos problemas mais sérios que nós temos...
Mas eu digo no topo. No topo do governo. A ministra por exemplo. Ela reconhece o problema?
Reconhece. Tanto a própria Miriam Belchior, quando conversamos com ela do projeto da necessidade do Brasil melhorar a governança. Porque eu não acredito que o Brasil possa ser líder mundial enquanto não melhorar a eficiência do Estado brasileiro. A efetividade. A transparência. Nós precisamos de maior transparência na administração pública brasileira. É necessário ter uma boa governança. Ou seja, que tenhamos um melhor treinamento dos funcionários.
Muitos desses funcionários não têm planejamento, não têm metas, não têm plano estratégico. Tem instituições brasileiras que não têm plano estratégico. Importantíssimo. Tem ministério, e tem Estados e tem municípios. O problema não é somente em nível nacional. O problema da gestão pública da melhoria da governança é um problema nacional. Por isso que esse projeto de nós buscarmos apoio da OCDE. Vamos assinar em outubro, já estive falando com eles, já fizemos várias reuniões.
A OCDE, Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico, é a instituição mais avança em termos de governança do mundo hoje.
Eu não acredito que a gente possa combater a corrupção no Brasil sem uma melhoria de governança. Se o governo não tem a capacidade de entregar esses produtos que a gente mostrou, é porque nós não temos uma boa gestão, não temos um bom planejamento. Temos tantos exemplos que podemos dar em relação a isso. Desde a transposição do São Francisco como obras de grande impacto para a sociedade brasileira porque não houve um bom planejamento. Ou seja, não se pensou de forma antecipada.
Se nós não aperfeiçoarmos o Estado brasileiro, nós não teremos condições de combater a corrupção. O fundamental numa democracia é ter o controle, ter a capacidade da sociedade fazer o controle social -através dos meios de comunicação social, da imprensa, do Congresso Nacional, de todas as formas de comunicação. Termos a capacidade de mostrar o que está acontecendo para que o coletivo, que é a população geral, como demonstrado nas manifestações [de rua, em junho], esteja vendo o que os governos estão fazendo.
O governo tenta já há algum tempo fazer a licitação do trem-bala e não consegue. Por quê?
Um dos problemas mais sérios é que a obra tem o valor muito alto. Hoje está em torno de R$ 30 bilhões. Fui relator da primeira proposta, começou com um grupo italiano, que veio aqui. Depois, liberamos o primeiro estágio. Mostramos onde estavam os erros para o governo. O governo recuperou algumas coisas, tentou modificar, fez vários projetos. Mas como o projeto é muito grande, em todo o mundo, onde existem obras desse porte, se o Estado não aportar, ele é deficitário.
É difícil encontrar alguma estrutura de trem de alta velocidade no mundo atual que não seja deficitária. O Estado tem que colocar parte dos recursos. Mas por que não saiu? Porque as empresas não estão querendo participar. As empresas querem ganhar, querem ter lucro, e a concessão é para 40 anos. Se estabeleceu um preço, o governo se responsabilizaria de fazer uma parte. Antes o governo queria que a empresa que ganhasse fizesse tudo, depois o governo mudou...
Qual o principal erro do governo nesse projeto [do trem-bala]?
O principal erro do governo? É não ter tido uma proposta mais estudada, mais planejada, no início do processo. E está se arrastando. Então agora a previsão é de que seja somente feito para 2020. Ou seja, foi adiada essa semana por mais um ano [a licitação] e nós autorizamos sempre o primeiro estágio, mas condicionando o Tribunal a que fosse feito as complementaridades que eram necessárias serem feitas. A proposta do governo seria fazer a parte de infraestrutura e abrir a tecnologia para o setor internacional, que quem se capacitou agora foram os franceses. E, portanto, tendo somente um, o governo não quis fazer a continuação da licitação.
O sr. falou dos franceses. Trata-se da empresa Alstom, agora citada nesse escândalo da formação de cartéis em obras de metrô. Nesses casos, o TCU poderia ajudar aos governos estaduais a conter a formação de cartel?
A não ser que a gente faça um trabalho em conjunto com os tribunais de contas dos Estados. Isso é possível, nós estamos cada vez mais nos aproximando dos tribunais de conta dos Estados. Não existia essa aproximação de trabalharmos em conjunto nessa auditoria sobre educação que nós estamos fazendo. E vamos fazer sobre saúde. Estamos fazendo também, pela primeira vez, uma auditoria sobre pessoal para ver a evolução de pessoal no Brasil, a necessidade melhoria de pessoal. Então, nós podemos trabalhar junto com os tribunais de contas.
O TCU está fazendo esse acordo de cooperação para auxiliar especialmente aqueles que não tenham um bom conhecimento sobre auditoria operacional, que é para ver o desempenho do Estado. Ver a eficiência, eficácia. A Constituição contempla isso como uma função do Tribunal de Contas da União.
O TCU fiscaliza os gastos do governo. E no caso do TCU, quem o fiscaliza?
Estou tomando uma série de decisões. Já comuniquei aos ministros. Criamos um comitê de transparência do Tribunal de Contas da União formada por ministros. Trabalharemos dentro do corpo interno para publicarmos todas as nossas informações. Já estamos disponibilizando toda a agenda da presidência e cada ministro também está fazendo isso. Quero que o Tribunal seja o mais transparente possível. Que nós possamos divulgar todas as nossas viagens.
A Lei de Acesso à Informação estabelece três classificações para documentos: informação reservada, secreta e ultrassecreta. No caso do TCU, há seis categorias: pública, reservada, secreta, ultrassecreta, pessoal e sigilosa. Não seria melhor adaptar à Lei de Acesso à Informação as categorias internas do TCU?
Estamos fazendo isso. Nós temos um prazo para isso. O prazo não foi ainda vencido. Nós estamos num trabalho. Uma comissão que está fazendo esse trabalho de classificação de quais informações que nós poderemos liberar.
Mas basta seguir a classificação da Lei de Acesso...
Sim. Mas nós estamos fazendo. Mas, para classificar, você não faz de uma hora para outra. Veja só, são 20 mil processos. Você tem que ver o que é possível ser divulgado e o que não é possível ser divulgado porque você tem...
Mas existem mesmo essas seis categorias internas no TCU?
Olha, eu não tenho conhecimento, mas vou avaliar porque, se foi feito, não foi feito na minha gestão.
Teria que ser adequado ao que prescreve a Lei.
Claro. Nós queremos cumprir a Lei e essa é a determinação que coloquei para toda a minha equipe.
O sr. falou das viagens. Há uma cota de R$ 50 mil anuais para cada ministro usar com passagens de avião. Por que essa cota precisa existir e como ela deve ser usada?
A questão das cotas já existe há muito tempo no Brasil porque foi transferida a capital para Brasília e as pessoas moravam em vários Estados. O STJ tem 33 ministros que vêm de várias partes do Brasil. O STF também tem vários ministros que vêm de várias partes do Brasil. O que eu acho em relação às cotas: eu sou favorável que possamos ter de forma transparente. Em relação a viagens, um dado que nós vamos passar a informar agora todos os destinos e as origens das viagens dos ministros e divulgar todas elas.
A partir de quando isso vai ser divulgado?
Será a partir da semana que vem.
E a cota é algo que permanece?
A questão da manutenção da cota nós estamos discutindo. Foi criado um comitê para isso com quatro ministros para nós avaliarmos. Porque, se nós tomarmos essa decisão, ela vai ter impacto em todas as cortes do Brasil. O meu desejo é que a gente possa ter o máximo de transparência.
Autoridades têm muitas vantagens no Brasil. No caso do TCU, além das passagens aéreas, os ministros têm carro, motorista, ajuda de custo para moradia, dois meses de férias. O TCU poderia reduzir esses benefícios?
Eu sou favorável à redução. Só que...
Do quê, por exemplo?
Em relação a vários. A quase todos aspectos.
Férias?
Vou te confessar. Nesses oito anos que eu estou no Tribunal, eu tenho, mais ou menos, de férias, em torno de 300 dias que eu não tirei. Ou seja, é difícil eu tirar mais que isso.
Quase todos os ministros que dão entrevista aqui dizem isso. Mas o benefício permanece para muitos outros. Como fazer?
Sou favorável a diminuir isso. Mas isso é uma decisão que não depende só do presidente.
Mas, efetivamente, o que pode então ser feito?
Por exemplo, dando toda a origem dos locais, aonde viajam os ministros...
Semana que vem o TCU passa a publicar a lista completa dos destinos das viagens dos ministros.
Todas elas.
Dos funcionários também?
Sim. Os funcionários também viajam para fazer as auditorias. Nós somos auditores no Brasil.
Tudo isso vai ficar público?
Nós somos auditores no Brasil. Nós temos que fazer esse trabalho de viagem. Mas temos que prestar contas de tudo isso. E eu sou favorável a prestar contas de forma transparente, publicar tudo isso para que a sociedade tenha conhecimento do que nós estamos fazendo. Até para ver a dimensão do nosso trabalho. Porque muitas pessoas não têm a dimensão do nosso trabalho.
No TCU, o ministro Raimundo Caieiro está relatando a auditoria sobre a folha de pagamentos do Senado. Ele veio do Senado, onde foi funcionário. A mulher dele ainda é servidora do Senado. Há conflito de interesses neste caso?
Tem que avaliar a legislação por parte da decisão, se envolve ou não a esposa dele nessa questão. É um assunto que ele tem que tomar a iniciativa de se dar por impedido, ou se achar numa situação que não existe esse impedimento, ele relatar a matéria.
Raimundo Caieiro teve muitos anos para refazer a certidão de nascimento, mas deixou para tomar a decisão agora. Na prática, ficou dois anos mais jovem e poderá ser presidente do TCU. O sr. considera que foi correta essa revisão do jeito em que foi feita?
No interior do Brasil, as pessoas registravam seus filhos cinco, seis, dez anos depois [do nascimento]. Ele entrou com um processo na Justiça. A Justiça deu a autorização para que ele fizesse essa mudança. O Ministério Público abriu um processo e já e já arquivou. É decisão da Justiça. Nós não podemos discutir a questão. A Justiça e o Ministério Público consideraram legal o ato do ministro Raimundo Caieiro.
16 de agosto de 2013
Fernando Rodrigues - UOL
Nenhum comentário:
Postar um comentário