A presidente da República tem todo o direito, senão até o dever democrático, de fazer política. É cidadã na posse de suas prerrogativas como qualquer brasileiro e, assim, livre para se expressar.
Outro dia mesmo achou por bem responder às críticas do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso à "herança pesada" legada por Lula no terreno dos costumes e o fez já no limiar do aceitável.
Defendeu os governos de seu partido - o que é justo -, mas o timbre da Presidência da República na nota de desagravo a colocou em dissonância com a majestade do cargo.
Dilma Rousseff não gostou do artigo de FH, quis demarcar terreno para deixar bem claro que não flerta com a oposição e é fiel ao seu campo político.
Pretendeu também reforçar a posição do PT nesses tempos difíceis de julgamento penal do sistema que o partido escolheu para se sustentar no poder logo depois de conquistar a Presidência sem maioria no Parlamento.
A presidente pecou ao não enfrentar o debate tal como FH propunha no texto. Mas, até aí, trata-se de um ponto de vista. Se Dilma considera a ética algo irrelevante, pior para a composição do perfil de austeridade que lhe confere popularidade.
No pronunciamento que fez no dia 7 de setembro, em espaço reservado à chefia da Nação, entretanto, a presidente ultrapassou a fronteira do aceitável e extrapolou de suas prerrogativas ao valer-se do púlpito institucional para pronunciar-se em termos de palanque.
Embora tenha direitos iguais, a presidente da República tem deveres a mais em relação ao conjunto da sociedade cuja maioria a elegeu, mas que não é composta só de correligionários.
Para traduzir o conceito em números e tornar a obviedade ainda mais visível: ao fim da eleição de 2010, Dilma havia contabilizado 55 milhões 752 mil 529 votos e seu oponente José Serra, 43 milhões 711 mil 388. Em porcentuais, 56,05% dos eleitores ficaram com ela e 43,95% preferiram o candidato adversário.
Isso depois de dois mandatos de Lula durante os quais a oposição não fez esforço para se opor e a impressão geral era a de que as forças governistas reinavam unânimes no País.
Não reinam e é ótimo que assim seja. Em nome da pluralidade, da alternância e de todos os primados dos Estados fundados no Direito.
A presidente, porém, nessa sua nova inflexão de gestora para líder política adentra um gramado onde Lula atuou usando e abusando da apropriação do Estado como instrumento de partido.
Com isso contraria o empenho do departamento de propaganda do Planalto em acentuar traços e modos que a distanciam das exorbitâncias do antecessor. Repete o ex-presidente em seus piores momentos.
Curto prazo. Se comparadas com as duas indicações anteriores, a escolha do ministro Teori Zavascki para o Supremo Tribunal Federal deu-se em tempo surpreendente: dez dias a contar da data da aposentadoria de Cezar Peluso.
A primeira, de Luiz Fux, levou sete meses, de julho de 2010 a fevereiro de 2011, e a segunda, de Rosa Weber, demorou de agosto a novembro.
Em tese haveria tempo de o novo ministro assumir antes do fim do julgamento. Fux e Weber foram sabatinados pelo Senado e tomaram posse no prazo de mais ou menos um mês após a indicação.
Quanto à participação, se o calendário eleitoral não atrasar a sabatina, há três hipóteses: julga normalmente, não se considera apto por falta de familiaridade com os autos ou, na mais improvável delas, pede vista do processo.
A rapidez não parece ter tido o intuito de recompor o quórum de 11 ministros, mas antes não fomentar especulações sobre eventual mudança de critério na escolha de ministros diante do rumo que vem tomando o julgamento.
Em favor da presidente, registre-se que deu prioridade à biografia jurídica em detrimento da folha de serviços prestados pelo escolhido ao governo e ao PT. Dilma acertou com Rosa Weber e Luiz Fux e pode ter acertado de novo.
11 de setembro de 2012
Dora Kramer - O Estado de S.Paulo
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