Discreto, fiel, um túmulo. Marcos Valério se comportou assim desde sempre. Na CPI dos Correios, que acabou por revelar o esquema de compra de votos engendrado pelo PT, ou diante do Ministério Público.
Revelou nomes dos que receberam dinheiro sujo, mas, jamais, em hora alguma, apontou o dedo para o mandante. Manteve-se leal, um túmulo.
Mas não é trouxa.
Desde que percebeu a inevitabilidade de sua condenação, contrariando o que lhe fora prometido, Valério faz saber que tem bala, que não cairá calado. Como em um trailer, conta em pedacinhos o que diz saber. Assusta seus companheiros de crime, tenta confundir a Justiça.
Deixa vazar que tem uma gravação trancafiada em um cofre em que detalha o mensalão tintim por tintim. Mais grave: nome por nome. Que o esquema é infinitamente maior - somava R$ 350 milhões. Que Lula sempre soube de tudo.
Teria ainda, de acordo com o jornal O Estado de S. Paulo, solicitado regalias da delação. Para tal, contaria mais: a participação de Lula e do ex-ministro Antonio Palocci e até sobre a morte do prefeito Celso Daniel, caso escabroso que há uma década assombra o PT.
Curiosamente, o novo depoimento de Valério ao MP, feito em setembro, veio à tona só agora, na semana seguinte aos 40 anos de prisão que o STF lhe imputou, três dias depois das eleições. Com o gesto, ele aumentou seu crédito junto ao PT, desta vez por não azedar o jogo das urnas.
Ao mesmo tempo, com xilindró à vista, informou aos seus contratantes os limites de sua fidelidade. Se for para passar o resto de seus dias na cadeia, o fará com barulho. Muito barulho.
No PT, a reação foi quase burocrática. O presidente da Câmara Marcos Maia (PT-RS) considerou “lamentável” Valério envolver Lula. E Jilmar Tatto (SP), líder do PT, desqualificou o denunciante.
Lula nada disse. Palocci, sumido desde o flagrante de seu enriquecimento relâmpago de R$ 20 milhões, também ficou calado. Mandou seu advogado dizer que era “insanidade” e pronto.
Sobre Celso Daniel, nenhum pio.
Ninguém duvida que Marcos Valério saiba muito mais. Que, de alguma maneira, deve ter documentado e se protegido. Seria tolo se não o fizesse.
Acuado e sem poder resgatar as garantias de impunidade que o PT de Lula lhe deu, ele solta acusações em pílulas que podem até não ter lastro. Só não é prudente fazer-lhe ouvidos moucos. Será preciso esmiuçá-las.
Afinal, o que aconteceria se a voz do então deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) não fosse investigada? O país continuaria refém do mais sofisticado esquema para surrupiar o Estado e sua representação popular. Pior: o mensalão continuaria não existindo, como tanto sonha o PT.
04 de novembro de 2012
Mary Zaidan é jornalista, trabalhou nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, em Brasília.
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