Dia desses recebi uma mensagem do Google. Trata-se de um procedimento padrão quando alguém tenta invadir sua conta de e-mail. Foi o meu caso. O Google reconhece e sabe onde e quando um bisbilhoteiro - o cracker - está tentando uma invasão de um e-mail alheio. No meu caso, imediatamente ele bloqueou a ação do abelhudo e enviou-me o seguinte aviso:
“Recentemente,
alguém tentou usar um aplicativo para fazer login em sua conta do Google,
@gmail.com
Impedimos essa tentativa de login na hipótese de ser um invasor tentando acessar
sua conta. Analise os detalhes da tentativa de login:
Sábado, 16 de junho de 2012 - 23h12min04. Horário de
Greenwich. Endereço - IP: 177.168.24.187 Local: Local desconhecido
Se você não reconhece esta tentativa de login, alguém pode estar tentando
acessar sua conta. Faça login e redefina sua senha imediatamente. Descubra como
em http://support.google.com/accounts?p=reset_pw.
Meu problema não terminou aqui. Muito pelo contrário.
Apenas começou e me encontro enredado, como num novelo, tendo que tomar
providência contra bandidos virtuais que agiram nas dependências do Google e do
Facebook sem a menor boa vontade destes que insistem em ignorar, e assim
protegem a identidade do bandido. É como se um de nós acoitasse em nossa casa um
perigoso ladrão, assaltante, estuprador e assassino e o protegesse das garras da
polícia até que um juiz determine uma ação qualquer com relação ao
caso.
Voltarei ao meu problema pessoal. Mas antes é
necessário deixar claro alguns tópicos:
Primeiro engodo do Google: ele sabe que esse endereço
de IP não me pertence. Sabe também, como reconhece no e-mail a data e a hora que
o invasor tentou acessar a conta. E sabe o número do IP, a identidade do
aparelho invasor, como me avisou na mensagem acima. E se o Google sabe o número,
ele sabe de onde partiu a tentativa. Pelo número do IP, você identifica a
localidade e em nome de quem está o computador usado pelo cracker. Ora bolas:
sinto-me no direito de ser avisado. É como se um ladrão tentasse invadir minha
conta bancária e o banco, ao invés de me avisar, imediatamente, resolvesse
proteger a identidade e a forma como o ladrão tentou me roubar. O banco não age
assim. Mesmo se quisesse, não poderia porque existe uma lei que regula nossas
relações com o sistema bancário e financeiro. Nesta lei estão previstas
penalidades severas para a instituição bancária que não zelar pela proteção e
pelo sigilo de nossas contas. E se alguém por acaso invadi-las, a instituição
será penalizada e o invasor irá para a cadeia.
Mas porque o Google não me dá essas informações
cruciais em caso de crime de invasão? Não me dá porque aqui no Brasil não existe
uma lei específica que regule os procedimentos de internet por parte dos
usuários e provedores. No meu caso pessoal, o invasor tentou e não conseguiu
invadir meu e-mail. Foi detectado pelo próprio Google que não foi capaz de
detectá-lo quando ele invadiu seu próprio site. Num lance que jamais li, ouvi ou
tive informação no mundo todo, o cracker brasileiro entrou no site de buscas do
Google, a partir de uma cidade do Estado do Mato Grosso e alterou muitas das
buscas com o meu nome. Infiltrou-se nas informações fornecidas pelo Google
quando meu nome é digitado na área de buscas, a partir de sites localizados em
vários Estados brasileiros e postou declarações estúpidas, inapropriadas e
perigosas como se eu realmente houvesse declarado em entrevistas aos referidos
sites. Descobri isso por acaso, a partir de certo momento em que buscava uma
determinada pessoa que desapareceu de minha rede de contatos. Como ela sumiu de
repente, fui procurá-la no setor de buscas para ver o que tinha acontecido. Não
havia mais nada sobre ela. Alguém, o cracker, limpou tudo sobre a pessoa que eu
buscava. Aí resolvi colocar meu nome associado ao dela. E então me surpreendi
com a quantidade de declarações falsas, publicadas em sites da Bahia e do Amapá.
Num, eu fazia declarações pejorativas e abusivas sobre o carnaval da Bahia e ,
no outro, conclamava a população para aderir a uma campanha contra o carro zero
quilômetro. Imediatamente busquei os responsáveis pelos sites, por e-mail e por
telefone. Eles me garantiram que jamais haviam publicado tais declarações e
desconsideraram minhas queixas com a justificada desconfiança de que eu
estivesse louco. E tampouco deram crédito à colagem que enviei, retiradas do
setor de buscas do Google. De repente, percebi que estava num beco sem
saída.
Dirigi-me novamente ao Google notificando-o do que
estava se passando e eles limitaram-se a responder que seria impossível tal ação
por parte de um cracker já que o serviço é feito internamente. Ignoraram
solenemente tudo o que lá está exposto e que estou narrando aqui. E a difamação
contra minha pessoa continua lá no setor de buscas do Google, incólume.
Aconselhei-me com um advogado e este me sugeriu buscar a delegacia de crimes
virtuais que existe aqui no Rio de Janeiro, munido de todas as provas para o
registro de uma queixa. Assim fiz. Narrei minha odisséia para o Inspetor de
plantão que fazia cara de espanto diante de minha necessidade, aparentemente,
pueril. Mas fui incisivo:
-Por enquanto o cracker me atinge apenas moralmente.
Mas e se ele publicar que eu vou matar o Presidente da
República?”
Só então ele reconheceu a gravidade do assunto e me
ofereceu uma solução:
-investigação não vai dar. Mas vou fazer um registro de
um tipo de ocorrência que lhe servirá como defesa se amanhã ele colocar que o
senhor quer matar o Presidente. E servirá também para que seu advogado dê
entrada na justiça e solicite a um juiz que determine à autoridade policial
proceder a uma investigação. Esse documento lhe resguardará de aborrecimentos
maiores.”
O
Inspetor fez o registro de uma ocorrência denominada MEDIDA ASSECUTÓRIA DE
DIREITO FUTURO acompanhada de um termo de declaração. Saí aliviado da Delegacia,
mas consciente e convencido da necessidade e da urgência que o Brasil tem de uma
Lei específica para a Internet. O mesmo cracker invadiu a minha página no
Facebook e lá postou um convite para uma conferência sobre o SERASA, o serviço
de acompanhamento e fiscalização e o maior banco de
dados de crédito de consumidores, empresas e grupos
econômicos.
Mediante o envio de cinquenta reais, o cracker solicitava uma inscrição para uma
palestra sobre o assunto. Ele não chegou a atingir toda a minha lista, imagino
eu, porque recebi notificações de alguns poucos amigos. Mas o Facebook também
detectou a invasão e , como o Google, apenas me solicitou que trocasse minha
senha porque alguém havia tentado acessar minha conta. Nada mais me informou,
nem sequer me notificou se o invasor havia logrado algum tipo de
êxito.
Por minha conta e risco, busquei um site nos Estados
Unidos e de posse do número de IP localizei o Estado e a cidade, aqui no Brasil,
de onde o invasor agiu, assim como o dia e a hora. Tirei cópias de todas as
declarações e de todos os sites que “publicaram” o conteúdo mencionado
anteriormente. Tudo isso com datas, títulos e expediente dos sites. Juntei tudo
e anexei à tal Medida Assecutória de Direito Futuro. Agora, irei em busca de um
advogado e darei início a um processo. Primeiro contra o Google e Facebook e só
então uma ação de investigação em busca do
invasor.
A lei ainda não existe, mas o Superior Tribunal de
Justiça, o STJ, uma das cortes superiores do Brasil, em decisão tomada pela
Ministra Nancy Andrighi e publicada no Diário Oficial da União e no jornal Folha
de São Paulo, do dia 22 de junho de 2012, na página B 5, do caderno Mercado,
estabeleceu que “ empresas responsáveis por serviços de e-mail serão obrigadas a
fornecer auxílio na localização do remetente de mensagens que causem danos
morais a outrem” . E que as mensagens que sejam consideradas ofensivas ou
impróprias terão de ser retiradas do ar em até 24 horas após serem
denunciadas.
Um dos casos julgados pela ministra foi o de uma
carioca que se divorciou e viu de repente uma página falsa, com ofensas,
publicada no Orkut. A mulher apontou o conteúdo como ilícito, mas a suspensão só
ocorreu dois meses depois. A ministra Andrighi disse na época que a decisão
abriu precedentes no STJ e uniformizou a
jurisprudência:
-É um marco de regulamentação e todas as futuras
questões estarão sob essa ótica.
Outro fato deixou perplexa a ministra e serve como
advertência para nós brasileiros que estamos buscando um marco regulatório para
a Internet.
-Fiquei sabendo que nos EUA eles são capazes de tirar
as mensagens em 30 minutos. Levar 62 dias para realizar o mesmo aqui no Brasil é
um absurdo”_ disse a ministra.
Outras decisões semelhantes têm sido exaradas pelas
Câmaras Civis de Tribunais de Justiça Regionais em que os desembargadores votam
por unanimidade nas decisões de primeira instância, sempre dando razão aos
usuários. É o caso da 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais
(TJ-MG), que negou recurso do Google, que foi condenado a pagar indenização por
danos morais a um dentista mineiro que teve um perfil falso criado na página do
site de relacionamentos Orkut, segundo o jornal Valor Econômico, publicado na
página E 1, de 25 de julho de 2012.
Os juízes julgam esses casos, na ausência de uma lei de
opinião, levando em conta os artigos da Constituição da República que tratam
sobre liberdade de expressão. A punição para as empresas provedoras tem sido
pecuniárias, apenas, por enquanto. No caso de Minas Gerais, o Google, em nota
oficial, afirmou:
“Não comentamos casos específicos e o acórdão não
reflete a jurisprudência dominante dos tribunais
superiores”.
Existem decisões controversas, é verdade, como é o caso
do julgamento da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, STJ, que negou pedido
de indenização por danos morais a uma mulher que alegou ter sido alvo de ofensas
no site de relacionamento. Eles entenderam que não há como obrigar um provedor a
realizar uma prévia fiscalização das informações. Em outra decisão, a mesma
Corte determinou que o Google indenizasse o diretor de uma faculdade mineira por
danos morais. O conteúdo que foi considerado ofensivo pelo autor da ação foi
publicado em uma página de um blog, no blog spot que pertence à
empresa.
Como podemos extrair daqui, as calúnias, as difamações
são suficientes para que se crie uma lei específica no mundo da Internet. Ou que
mereça um longo capítulo, à parte. Mas o Congresso caminha para colocar no mesmo
nível a área técnica do setor. Transito de voz por IP não pode estar na
mesma lei que vai julgar opinião, calúnia e difamação. São coisas completamente
diferentes.
Isso levou a diretora jurídica do Google, a senhora
Fabiana Silvieiro, a dizer que a empresa lida com muitos casos semelhantes e que
a jurisprudência ainda é inconstante no país. Foi a mesma resposta que o Google
me enviou por e-mail e ficou por isso mesmo. As manchetes mentirosas e
caluniosas sobre minha pessoa continuam lá em seu serviço de buscas. Se
tivéssemos uma lei, um Marco Regulatório sobre o assunto as coisas seriam bem
diferentes. Transita na Câmara dos Deputados um Projeto de Lei inspirado pelo
Executivo e que recebeu o nome de Marco Civil da Internet. Tem como Relator o
Deputado Federal Alexandre Molon, do PT-RJ. Trata-se de uma iniciativa oportuna
e necessária para não dizer urgente. O Governo Federal através de alguns órgãos
executivos tem um grande abacaxi para ser descascado. Até aqui, tudo que escrevi
e tudo que recolhi em minhas pesquisas e textos, tratam de crime de opinião.
Outrora esse assunto seria resolvido, juridicamente, sob a égide da Lei de
Imprensa. Como o Congresso acabou com ela e nada ficou no seu lugar para guiar e
orientar o mundo jurídico nesse assunto, jornalistas ,hoje no Brasil, são
condenados por crimes de opinião com base no Código Penal. Um corolário de
artigos destinados, originalmente, a outro tipo de delito. E aí é que mora o
perigo.
Além do imbróglio que está se tornando o Marco Civil da
Internet, ele está sendo atulhado com assuntos que vão desde crimes de opinião,
como superposição de poderes na Internet, diferenciação de serviços para
usuários, problemas de uso de sistemas de voz sobre IP (VOIP) em celulares que é
nada mais, nada menos que o tráfego de voz nos sistemas de computadores, de
graça, para celulares, o que já faz o Skyp. Além disso, o Marco Civil destina
uma boa parte dos problemas para a mediação da Anatel, a Agência Nacional de
Telecomunicações e outras disputas, ele destina para o Conselho Gestor da
Internet. No Brasil é o CGI.br , criado em 1995, que reúne iniciativas ligadas à
internet do qual participem governo, empresas, o terceiro setor e
especialistas.
É assim quase que no mundo todo. A Internet é tão nova
que a maioria dos países ainda não conceberam e implantaram um marco regulatório
para as empresas, prestadores de serviços e usuários desse novo mundo.
Poderíamos dizer o que se diz de uma criança: ela ainda precisa ser educada,
aprender a falar e só depois então enquadrar-se nas normas de comportamento. Mas
isso é com crianças. Com empresas e pessoas é diferente. E sabendo disso, o
nosso Congresso Nacional, por pressão do Executivo está discutindo em comissões
ainda, o que eles chamam de um Marco Regulatório para a Internet. Simplificando
: uma lei específica para a Internet.
04 de novembro de 2012
aleluia hildeberto
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