"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 2 de dezembro de 2012

A CAUSA DO AUMENTO DO CRIME


É bom prestar atenção. Em Ribeirão Pires, foram 22 fuzis e 98 pistolas. Em Caçapava, sete fuzis. Tudo roubado de estabelecimentos do Exército em menos de uma semana.
Não se contam os ataques a sentinelas de quartéis, a postos e viaturas das Polícias Militares e a seguranças de bancos e empresas variadas, em todo o país, acontecimentos quase diários.

Por certo não está em andamento uma operação política subversiva, muito menos a preparação de alguma guerrilha urbana ou rural nos moldes dos anos setenta. Verifica-se, isto sim, uma ação do crime organizado ou desorganizado na busca de instrumentos de trabalho. O contrabando de armas já não basta, custa caro. Melhor para os bandidos apropriar-se gratuitamente de material moderno e, salvo engano, disponível.

Fica por conta dos serviços secretos militares apurar a origem e o destino dessas operações criminosas, mas para nós, aqui de fora, uma conclusão surge inevitável: se aumenta o roubo de fuzis e pistolas é porque aumentou a demanda pela sua utilização. Traduzindo: o crime alarga seu raio de ação. Breve as estatísticas revelarão número maior de assaltos, defesas mais eficazes dos territórios sob seu domínio, ampliação da insegurança no meio social.

Por que isso acontece? Elementar, também: porque cresce o número de indivíduos sem alternativa para sobreviver fora do crime. São minoria, é óbvio, mas começam a dar o sinal de sua presença. Numa palavra, trata-se do aumento da criminalidade de um dos mais perniciosos reflexos do desemprego. Nem todos os cidadãos postos na rua da amargura dispõem de coragem para viver da caridade pública ou estatal, recorrendo ao mísero salário-desemprego ou ao bolsa-família. Dirão os sociólogos haver inclinação para o crime, na maior parte dos que optam por ele, e é verdade. Só que o diagnóstico não evita a doença.

Devem preparar-se o país e as autoridades para a multiplicação dos assaltos, latrocínios, seqüestros, ocupações, arrastões, tráfico de drogas, rebeliões em penitenciárias e tudo o mais que se imagine no universo das atividades criminosas. Por conta das demissões em massa que se sucedem, mesmo parecendo pequeno o percentual dos demitidos lançados na ilegalidade.

Adiantaria muito pouco dobrar o número dos efetivos de segurança, se isso pudesse acontecer, por conta de velho e inevitável axioma malthusiano: a polícia pode até crescer em proporção aritmética, mas os bandidos, em proporção geométrica.

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REDUÇÃO PERIGOSA

Para ficar em assunto que comprova as dificuldades de nossas instituições ligadas à segurança, uma notícia lamentável: em 2008 o Exército incorporou 70 mil recrutas em seus quartéis. Em 2011 foram 48 mil, em todo o país. A redução deve-se à falta de recursos, nem valendo à pena falar que de uma década para cá tem sido antecipados os desligamentos. Não há dinheiro sequer para o rancho, durante o ano inteiro, sendo que em determinados estabelecimentos castrenses o expediente termina antes do almoço, para não ser servido.

A grande maioria dos jovens economicamente menos aquinhoados luta para servir nas Forças Armadas, buscando um pequeno salário mas condições para seguir carreira ou aprender uma profissão. Tratam-se, Exército, Marinha e Aeronáutica, de escolas de vida e de cidadania, além de instituições imprescindíveis à nossa sobrevivência como nação.
Com equipamento obsoleto, cortes orçamentários e abandono de sua própria matéria prima, o soldado, onde iremos parar?

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FESTIVAL DE OBSCURANTISMO

Acentua um velho e querido amigo, cujos méritos jamais o fizeram afastar-se do Vaticano, que só é católico quem quer. Ninguém está obrigado a seguir os postulados, as lições e as instruções da cúpula da Igreja. Assim, em vez de protestar contra a excomunhão dos médicos pernambucanos (que fizeram aborto numa meninade 9 anos), praticada pelo arcebispo de Olinda e Recife, deveriam seus críticos desligar-se da religião que lhes dá suporte espiritual e moral. Desapareceram a fogueira e a tortura para os heréticos que discordavam das interpretações e dos dogmas dos Papas. Todo indivíduo é livre para aceitar ou rejeitar a doutrina católica sem mais sofrer perseguições e penalidades, como no passado.

Tudo bem, trata-se de um raciocínio linear, mas não elide a indignação de quantos, pretendendo continuar católicos e fazer jus ao Reino dos Céus, discordam de certas posturas do comando eclesiástico mundial, considerando-as retrógradas e passíveis de revisões necessárias. A condenação da pílula e da camisinha, por exemplo, sem maiores considerações teológicas a respeito da finalidade do sexo exclusivamente como fator de reprodução.

Além da excomunhão dos médicos, fomos surpreendidos com outra obscuridade, daquelas incapazes de contar com o apoio da maioria católica. Informou o Vaticano que a máquina de lavar roupa constituiu fator maior para a libertação da mulher do que a pílula e a camisinha.

Aqui para nós, andam estreitando tanto o caminho da Humanidade para a bem-aventurança que logo surgirá um novo Lutero a confundir o planeta.

(O artigo acima foi publicado em 2011, mas continua atual)

02 de dezembro de 2012
Carlos Chagas


NOTA AO PÉ DO TEXTO

Do que se trata então? Não acredito atribuir-se apenas ao desemprego o aumento da criminalidade, seguido de uma violência estúpida que os noticiários nos empurram goela abaixo.
Uma violência covarde, que espelha não apenas o ato de assaltar, mas o prazer de matar a vítima, que nos causa a impressão de ser mais importante do que o fruto do roubo.

Assisto imagens estarrecedoras de um casal assassinado, quando já estava, com certeza ferido na queda, pela colisão com um veículo, na tentativa de fuga dos assaltantes. Com o objetivo de roubar uma motocicleta, avaliada em R$ 40 mil, a dupla de marginais, também numa moto, dispara cinco tiros - três na moça e dois no rapaz - no casal já indefeso, caído no chão. Um homicídio frio, cruel, revestido de ódio à vida.

Apenas desemprego pode levar pessoas a sanha de uma violência descomedida?
É necessário uma explicação mais coerente, ou até mesmo a impossibilidade imediata de explicar os absurdos que estão desestruturando as relações humanas e o modelo de segurança até então praticados. Impossibilidade imediata se a análise das causas dessa violência, não focar as razões de ordem política, a verdadeira raiz desse mal.

Mas não acredito que se possa atribuir ao desemprego o aumento da violência aos assassinatos gratuitos.
Penso que alguns fatores, já abundantemente apontados por analistas, possam indicar o caminho para se interpretar o crime. Dentre eles, caberia destacar:

1) uma legislação excessivamente tolerante, frouxa, que favorece a impunidade;

2) a total incúria do governo, do Ministério da Justiça, em investir seriamente em presídios de segurança máxima, distantes dos centros urbanos, sem 'mordomias', sem acesso a celulares e outros privilégios etc;

3) privatização dos presídios;

4) uma legislação para o tratamento de menores infratores, sem benevolências, com a  redução de idade para um patamar adequado as condições da sociedade atual;

5) verdadeiro combate ao crime organizado do colarinho branco (já iniciado com o processo 470);

6) uma política salarial justa para os segmentos que atuam na segurança pública, além de investimentos em armamentos e treinamentos.

Não sou especialista em segurança pública, mas pescando daqui e dali opiniões de especialistas, e com um pouco de bom senso, poderíamos chegar a razões mais sólidas.

Faltou ao autor, ampliar a ação do crime 'organizado', o assalto a pedreiras para o roubo de dinamites; a empresas de segurança, para o roubo de munição e armas; a fragilidade da segurança, ou quase nenhuma, das nossas fronteiras, que permite o contrabando de armamentos, inclusive pesados.
Esses fatos, não dizem respeito ao desemprego na busca de "equipamentos de trabalho", mas a ausência de políticas públicas de segurança.
Dizem respeito ao descaso e negligência com a vida e ordem social.
Há um espectro maior, mais abrangente que poderia ser visto em todos esses fatos.

Assim, alinho o que me parece paradoxal no texto "A causa do aumento do crime":

1) "por certo não está em andamento uma operação política subversiva"

2) " Em 2011 foram 48 mil, em todo o país. A redução deve-se à falta de recursos, nem valendo à pena falar que de uma década para cá tem sido antecipados os desligamentos. Não há dinheiro sequer para o rancho, durante o ano inteiro, sendo que em determinados estabelecimentos castrenses o expediente termina antes do almoço, para não ser servido."

3) Tratam-se, Exército, Marinha e Aeronáutica, de escolas de vida e de cidadania, além de instituições imprescindíveis à nossa sobrevivência como nação.
Com equipamento obsoleto, cortes orçamentários e abandono de sua própria matéria prima, o soldado, onde iremos parar?


m.americo
 

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