Queda no lucro do banco coloca em xeque a estratégia de criação de ‘campeões nacionais’, executada com bilhões em dívidas contraídas em nome do contribuinte
A conjuntura internacional é sempre desculpa conveniente para governantes às voltas com turbulências na esfera econômica. O truque é antigo, mas nem sempre funciona. Não funcionaria no caso da queda do lucro do BNDES, em 2012, em que o resultado de R$ 8,2 bilhões significou uma perda de 9,55% em relação ao ano anterior.
Nada que abale a maior instituição de fomento do país, dentro dos conformes em relação ao parâmetros usuais de medição da saúde financeira bancária: índice de Brasileia, taxa de inadimplência etc. O resultado ruim do BNDES tem importância para realçar erros de estratégia cometidos pelo próprio banco e equívocos praticados pelo Planalto, ao permitir o aparelhamento político-sindical da Petrobras e intervir com mão pesada no setor elétrico, provocando grande desvalorização patrimonial na Eletrobras, fatos com reflexos negativos diretos no banco, grande acionista histórico das duas estatais.
O valor da carteira de ações do banco, administrada pelo BNDESPar, subsidiária de participações da instituição, caiu de R$ 89,6 bilhões para R$ 78,2 bilhões, e também foi menor o recolhimento de dividendos.
O banco também fez más apostas na sua política de induzir o surgimento de “campeões nacionais” — oligopólios empresariais, ao estilo do que foi tentado, também sem êxito, no governo militar de Ernesto Geisel, e, à época, já por meio do BNDES. O banco tem esta memória nos arquivos. O BNDESPar, por exemplo, foi obrigado a fazer uma baixa contábil de R$ 3,3 bilhões para se precaver diante de possíveis prejuízos. Deste total, R$ 865 milhões devem-se a investimentos na LBR-Lácteo, mais uma tentativa de gerar um grande grupo “campeão nacional”, este no mercado de leite. O projeto terminou em concordata. O grupo, formado por fusões de empresas financiadas pelo banco, está em recuperação judicial. Pode sobreviver ou não.
Há outros casos semelhantes. Enquanto isso, dezenas de bilhões em dinheiro público, oriundos de endividamento feito em nome do contribuinte, têm sido injetados no banco. Entre 2009 e o ano passado, foram R$ 285 bilhões, contabilizados como empréstimos do Tesouro ao BNDES, e que, por isso, não aparecem na dívida líquida pública — indicador de solvência fiscal mais usado no Brasil.
Diante do mau desempenho em 2012, noticiou o jornal “O Estado de S.Paulo” que já se pensa em Brasília na injeção de algo entre R$ 5 bilhões e R$ 8 bilhões no banco, não como empréstimo, mas diretamente no seu patrimônio líquido.
É cada vez mais necessário haver transparência nessas operações Tesouro-BNDES. Bem como discutir-se a estratégia de atuação do banco, que poderia abrir o leque de clientes, para apoiar mais o empreendedorismo no âmbito dos pequenos e médios negócios.
O fato de o BNDES ser a única grande fonte de financiamentos de longo prazo no país não serve de desculpa para uma atuação tão seletiva e concentrada — e mesmo assim de elevado risco.
28 de fevereiro de 2013
Editorial de O Globo
Nada que abale a maior instituição de fomento do país, dentro dos conformes em relação ao parâmetros usuais de medição da saúde financeira bancária: índice de Brasileia, taxa de inadimplência etc. O resultado ruim do BNDES tem importância para realçar erros de estratégia cometidos pelo próprio banco e equívocos praticados pelo Planalto, ao permitir o aparelhamento político-sindical da Petrobras e intervir com mão pesada no setor elétrico, provocando grande desvalorização patrimonial na Eletrobras, fatos com reflexos negativos diretos no banco, grande acionista histórico das duas estatais.
O valor da carteira de ações do banco, administrada pelo BNDESPar, subsidiária de participações da instituição, caiu de R$ 89,6 bilhões para R$ 78,2 bilhões, e também foi menor o recolhimento de dividendos.
O banco também fez más apostas na sua política de induzir o surgimento de “campeões nacionais” — oligopólios empresariais, ao estilo do que foi tentado, também sem êxito, no governo militar de Ernesto Geisel, e, à época, já por meio do BNDES. O banco tem esta memória nos arquivos. O BNDESPar, por exemplo, foi obrigado a fazer uma baixa contábil de R$ 3,3 bilhões para se precaver diante de possíveis prejuízos. Deste total, R$ 865 milhões devem-se a investimentos na LBR-Lácteo, mais uma tentativa de gerar um grande grupo “campeão nacional”, este no mercado de leite. O projeto terminou em concordata. O grupo, formado por fusões de empresas financiadas pelo banco, está em recuperação judicial. Pode sobreviver ou não.
Há outros casos semelhantes. Enquanto isso, dezenas de bilhões em dinheiro público, oriundos de endividamento feito em nome do contribuinte, têm sido injetados no banco. Entre 2009 e o ano passado, foram R$ 285 bilhões, contabilizados como empréstimos do Tesouro ao BNDES, e que, por isso, não aparecem na dívida líquida pública — indicador de solvência fiscal mais usado no Brasil.
Diante do mau desempenho em 2012, noticiou o jornal “O Estado de S.Paulo” que já se pensa em Brasília na injeção de algo entre R$ 5 bilhões e R$ 8 bilhões no banco, não como empréstimo, mas diretamente no seu patrimônio líquido.
É cada vez mais necessário haver transparência nessas operações Tesouro-BNDES. Bem como discutir-se a estratégia de atuação do banco, que poderia abrir o leque de clientes, para apoiar mais o empreendedorismo no âmbito dos pequenos e médios negócios.
O fato de o BNDES ser a única grande fonte de financiamentos de longo prazo no país não serve de desculpa para uma atuação tão seletiva e concentrada — e mesmo assim de elevado risco.
28 de fevereiro de 2013
Editorial de O Globo
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