A intimidade entre o partido do governo e Hugo Chávez ajudou a financiar o PT e satisfazer sua ala mais radical. Já o Brasil só perdeu com ela
Em 1998, ano em
que Hugo Chávez chegou ao poder na Venezuela, o PT perdeu a terceira eleição
presidencial seguida no Brasil. A derrota rachou o partido.
Um grupo continuou
satanizando os Estados Unidos, tecendo loas a Cuba e defendendo a reforma
agrária radical, o controle da imprensa, a expropriação de empresas estrangeiras
e o apoio a movimentos guerrilheiros.
Outro grupo, mais poderoso, se rendeu ao
pragmatismo, aliou-se a partidos conservadores, atraiu empresários e contratou
um marqueteiro renomado para eleger Lula presidente quatro anos mais tarde.
Se
poucas questões unem as duas alas petistas, a admiração ao ditador venezuelano
agora morto e o apoio ao seu governo estão entre elas. Para os radicais, Chávez
é motivo de inveja, uma vez que fez na Venezuela tudo o que eles sonhavam fazer
no Brasil.
Já para os pragmáticos, o caudilho era um parceiro comercial
importante. Amigo de Chávez, José Dirceu – o ex-chefe da Casa Civil de Lula,
condenado a dez anos e dez meses de prisão por ter comandado o mensalão –
liderou o apoio do PT ao governo chavista e trabalhou na prospecção de negócios
para empresas brasileiras naquele país. Em troca, elas financiavam campanhas do
partido.
"Chávez fez
em seu país o que o PT originalmente queria fazer no Brasil mas não pôde, porque
aqui há instituições fortes e uma imprensa vigilante.
Por isso se tornou um
ídolo dos petistas.
Para eles, é como se fosse um amigo que se deu bem na vida e
passou a ser invejado", compara o historiador Marco Antonio Villa, da
Universidade Federal de São Carlos.
Com a chegada do PT ao poder, em 2003, as
relações comerciais com a Venezuela foram multiplicadas por quatro, alcançando 6
bilhões de dólares em 2012.
Como o país praticamente não tem indústria e sua
economia depende do petróleo, o governo aumentou a importação de bens e serviços
brasileiros. Aí quem fez a festa foram as empreiteiras, que, com a ajuda do
BNDES, foram contratadas para realizar obras do porte de hidrelétricas, estradas
e aeroportos.
Apenas a Odebrecht comanda projetos orçados em 3 bilhões de
dólares. Não por coincidência, essas mesmas empreiteiras são as maiores doadoras
das campanhas petistas: dos dez principais financiadores, seis são construtoras
com negócios em Caracas.
A relação íntima
com Chávez pode ter sido benéfica para as finanças e o discurso do PT, mas só
trouxe desvantagens para o Brasil. O país viu sua influência na América Latina
ser reduzida pelo dinheiro do petróleo de Chávez, que comprou o apoio de países
como Cuba, Paraguai, Equador e Bolívia. Em importantes disputas comerciais, o
caudilho nunca ficou ao lado do Brasil – o caso mais simbólico foi o apoio à
Bolívia quando Evo Morales decidiu nacionalizar empresas brasileiras de energia,
em 2006.
Ainda assim, o governo de Lula continuou privilegiando os negócios com
a Venezuela, até quando prejudicavam os interesses nacionais. Em 2005, a
Petrobras se associou à PDVSA (estatal venezuelana de petróleo) para construir
uma refinaria em Pernambuco, desprezando proposta mais vantajosa da Arábia
Saudita.
A PDVSA jamais honrou sua parte na sociedade e apenas neste ano, já no
governo Dilma Rousseff, recebeu da Petrobras um ultimato para que pagasse sua
parte na obra, que supera os 8 bilhões de dólares.
Além dos prejuízos econômicos
e diplomáticos, o governo brasileiro se apequenou aos olhos do mundo
desenvolvido ao apoiar um autocrata que devastou a economia de seu país e
corroeu suas instituições.
O apoio do PT à
eleição de Nicolás Maduro para suceder a Chávez demonstra que o partido aprova e
quer prolongar a relação desigual com a Venezuela.
Na semana passada, o
marqueteiro oficial do petismo e do chavismo, João Santana, pôs no ar os
primeiros comerciais da campanha de Maduro – todos centrados em Chávez e com
frases como "Ele vai voltar" e "Nascer de novo". Seria um sonho para o PT.
E um
pesadelo para o Brasil.
11 de março de 2013
Otávio Cabral
VEJA - 09/03/2013
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