"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



segunda-feira, 25 de março de 2013

OS FILHOS DO PROFESSOR MONIR

       
          Artigos - Cultura 
monir“Uma sociedade não pode ser rica antes de ser inteligente. Não pode existir uma economia realmente sólida e desenvolvida sem que haja uma elite cultural voltada para os bens espirituais, capaz de guiar, julgar e interpretar os esforços da comunidade”.

Minha dentista, também uma querida amiga, perguntou-me: “Paulo, como é viver na orfandade?” Respondi que é difícil: dói. Penso em meus pais todos os dias, para não dizer todas as horas. Mas, no momento em que a dra. Suely fez essa pergunta, pensei em José Monir Nasser.

O professor Monir, como todos o chamavam, morreu no dia 16 de março, aos 56 anos, em Curitiba.

Monir foi o pai intelectual de um sem-número de pessoas. Empresários, estudantes, professores, economistas, profissionais liberais, presidentes de entidades, jornalistas – todos se tornavam alunos diante dele.
Era um educador no sentido verdadeiro da palavra, se pensarmos que a palavra educar vem do latim ex ducare, conduzir para fora. Suas aulas sobre literatura, filosofia e desenvolvimento econômico literalmente conduziam os ouvintes para fora da caverna da ignorância, mostrando-lhes a luz pura e espiritual do conhecimento. Luz que emanava dos grandes clássicos: Aristóteles, Platão, Santo Agostinho, Boécio, Dante, Shakespeare, Dostoievski, Kafka, Chesterton.

Virgílio de tantos pequenos Dantes, que antes de conhecê-lo não conheciam a comédia das próprias vidas, ele comprovou que o mundo da criação literária e o mundo da criação de riquezas não estão separados, mas fazem parte de um mesmo princípio, essencialmente espiritual. Uma de suas frases – e ele era um frasista genial – ilustra esse pensamento:

“Uma sociedade não pode ser rica antes de ser inteligente. Não pode existir uma economia realmente sólida e desenvolvida sem que haja uma elite cultural voltada para os bens espirituais, capaz de guiar, julgar e interpretar os esforços da comunidade”.

Era um crítico impiedoso do sistema educacional brasileiro – esse mesmo sistema que dá nota máxima a redações com erros primários de ortografia e concordância. Em uma de suas palestras, sentenciou:


“O que chamamos de educação é, na verdade, ensino. E esse ensino não passa de uma distribuição de promoções sociais em forma de diplomas, na qual ninguém acha que vai aprender coisa alguma”.

Um padre amigo costuma dizer que a vida humana é sustentada por dois pulmões: a fé e a cultura. Monir sabia muito bem disso. No sábado passado, uma empresária aluna (ele não tinha “ex-alunos”) lembrou-se de um episódio em que se queixava ao professor das dores e dramas da vida cotidiana. Monir respondera à empresária, com um sorriso:

“Neste mundo não vamos encontrar a tranquilidade. A paz definitiva só existe no Céu”.

Minutos depois de a aluna ter recordado esse episódio, José Monir Nasser fez a sua passagem definitiva. Deixou muitos órfãos – inclusive o autor destas linhas, que nunca o encontrou pessoalmente, mas leu e ouviu suas palavras de mestre.

Obrigado, professor Monir. O nome do meu pai é Paulo Lourenço e ele gosta de falar sobre literatura russa.


25 de março de 2013
Paulo Briguet
Crônica publicada no jornal Gazeta do Povo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário