"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 30 de abril de 2013

O CUSTO DO TRABALHO NO BRASIL: SALÁRIO É , PRODUTIVIDADE TAMBÉM

Indústria nacional paga mais que a do México. Valor cresceu 38% desde 2008. Produtividade em queda afeta resultado e deixa país atrás de emergentes
 
 

Juliana e Dalton trabalham sem carteira há anos. Quando o filho nasceu, ela sentiu falta da licença-maternidade
Foto: Daniela Dacorso
Juliana e Dalton trabalham sem carteira há anos. Quando o filho nasceu, ela sentiu falta da licença-maternidade Daniela Dacorso

O custo da hora do trabalhador brasileiro é baixo, mas a produtividade também, o que afeta o custo total do trabalho no país. O valor da hora que a indústria paga por aqui é quase o dobro do México, mas cerca de um terço do que se vê nos Estados Unidos e em países europeus.
E o preço da hora no Brasil vem em franco crescimento desde 2008: a alta acumulada chegou a 38%. Ganho salarial e câmbio explicam essa valorização. Especialistas afirmam, no entanto, que a produtividade vem comprometendo o desempenho do trabalho. O custo e a produtividade são o tema do terceiro dia da série de reportagens sobre os 70 anos da CLT.
 
Em 2011, a hora de trabalho na indústria era de US$ 11,65 no Brasil, quase o dobro dos US$ 6,48 do México, mas abaixo dos US$ 15,91 da Argentina, segundo dados do Escritório de Estatísticas do Trabalho dos Estados Unidos (BLS, na sigla em inglês). Os números são bem menores que os registrados em países desenvolvidos como Estados Unidos (US$ 35,53), França (US$ 42,12) e Alemanha (US$ 47,38).

Ao mesmo tempo, dados da instituição de pesquisa americana The Conference Board apontam que o desempenho da produtividade no país está aquém do de outros emergentes. Em 2012, a produtividade no Brasil caiu 0,3%, na contramão do crescimento de 1,8% no mundo e de 4,8% nas maiores economias emergentes. O comportamento do país foi classificado pela entidade como um “declínio dramático”. O Brasil já vinha registrando desaceleração: a expansão da produtividade, que tinha sido de 4,1% em 2010, caiu para 0,7% em 2011.

— Nosso grande problema aqui no Brasil não é o custo do trabalho isoladamente, mas a produtividade do trabalhador, que cresceu pouco nas últimas décadas — afirma Eduardo Zylberstajn, professor de Economia da Fundação Getulio Vargas.

A falta de mão de obra qualificada e a disputa por pessoal com o setor de serviços, o mais dinâmico da economia, fez cair a produtividade da indústria. Apesar da queda da produção de 2,7% em 2012, o quadro foi reduzido em 1,4%, e os salários subiram 4,3%, segundo a pesquisa do IBGE.

Qualificação, ambiente regulatório e investimento em equipamentos são alguns dos aspectos que deveriam melhorar no país para garantir maior produtividade, na avaliação do ex-ministro do Trabalho e economista da Gávea Investimentos Edward Amadeo:

— O nível educacional no Brasil ainda é muito ruim, temos um ambiente hiper regulado e o país investe pouco em equipamentos. Nos países asiáticos, um terço do PIB vai para investimentos, enquanto aqui é apenas um quinto.

Patrão paga 183% mais que valor da carteira

Estudos apontam que o custo do trabalho para o empregador no Brasil varia entre 65,7% e 183% a mais que o valor do salário de carteira do trabalhador. No livro “As Normas e os Fatos”, o sociólogo e professor do Instituto de Estudos Políticos e Sociais da Uerj Adalberto Cardoso estima que o desembolso total do empregador chegue a 65,7%. Já o professor da FEA/USP José Pastore fez um levantamento nos anos 90 em que estimava esse custo em 102%. Pesquisa recente do Centro de Microeconomia Aplicada da Fundação Getulio Vargas calcula que o valor pode chegar a 2,83 vezes o salário de carteira, para um vínculo trabalhista de um ano. Para cinco anos, o custo cai para 2,55 vezes.

— O estudo considera a indústria têxtil, e há alguma variação dependendo do setor. Mas a questão é que o custo da empresa com o trabalhador é muito maior que o valor da carteira — diz André Portela Souza, que coordenou o estudo.

Sem vínculos formais com empresas, o casal Juliana Veronezi e Dalton Coelho trabalha há mais de dez anos por conta própria. Ela é professora de teatro musical e ele é regente de coral e professor de música. Os dois se organizam financeiramente para lidar com a falta de décimo terceiro salário, por exemplo, e têm planos de previdência privada para garantir a renda na aposentadoria.

— O único momento em que senti falta da carteira foi quando tive meu filho. Tive que voltar a dar aula um mês depois, sem direito a licença-maternidade — conta Juliana, mãe do pequeno Vinicius.

30 de maio de 2013
Lucianne Carneiro - OGlobo

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