A notícia de que Estados Unidos, Japão e Europa podem entrar com uma queixa contra o Brasil na Organização Mundial do Comércio, por protecionismo, não poderia ter chegado em hora mais imprópria.
O embaixador Roberto Azevêdo está na reta final da disputa pela diretoria-geral da OMC, junto com o mexicano Hermínio Blanco. E isso pode ser usado contra a candidatura brasileira.
A notícia dada pelo “Estado de S.Paulo”, pelo correspondente Jamil Chade, informa que eles reclamam porque o Brasil estaria ferindo regras da OMC e eternizando o que era para ser temporário.
De fato, uma das regras da OMC é que impostos locais não podem ser diferenciados para não serem uma segunda barreira tarifária além da alíquota do imposto de importação. A diferenciação deve estar concentrada na tarifa externa e não nos impostos domésticos.
E essa regra claramente foi desrespeitada pelo Brasil nas reduções do IPI a favor do carro produzido no país. Ao carro importado, cabe pagar o imposto de entrada no mercado brasileiro, que foi elevado ao ponto máximo, e se submeter a um sistema de cotas.
Além da cota, só pagando mais IPI.
Era para ser por pouco tempo, tem sido renovado. Ou o governo elimina para todos os carros ou então negocia com a OMC uma suspensão dessa regra, se isso for possível. Há outros produtos brasileiros que estão tendo a mesma vantagem.
A verdade é que o Brasil adotou uma série de medidas protecionistas desde o início da crise. Outros países fizeram isso, mas o Brasil já era muito fechado e não tem conseguido fazer acordos de comércio, em parte pelo DNA protecionista do atual governo, em parte pela vinculação com o Mercosul.
Hermínio Blanco, em entrevista no fim de semana ao jornal “Folha e S.Paulo”, deu várias estocadas na candidatura do brasileiro. Apresentou-se como uma pessoa que sabe como negociar com os países desenvolvidos, tanto que negociou o Nafta.
O Brasil não quis negociar a Alca. Não foi o único responsável pelo fracasso, mas a atitude brasileira no governo Lula foi a de sabotar a negociação, mesmo tendo o cargo de copresidente.
Poderia ter se chegado a um acordo não interessante para o Brasil e, nesse caso, era só não assinar. As normas só entrariam em vigor quando tudo estivesse acordado, como foi a regra estabelecida. Mas o Brasil partiu do pressuposto de que qualquer acordo continental seria pior do que nenhum acordo.
O resultado foi que saímos de um superávit de US$ 5 bilhões com os EUA, em 2002, para um déficit de US$ 5,6 bilhões em 2012. E eles fizeram acordos bilaterais com nossos vizinhos.
O Brasil e o Mercosul não têm conseguido levar adiante a negociação com a Europa. No governo se diz que o país tem uma proposta consistente para apresentar, mas a Argentina precisaria ser convencida.
O candidato mexicano alegará que tem a favor do México um histórico de atitudes mais pró-comércio. Foi o que ele disse na entrevista que concedeu ao jornal brasileiro. Mas o Brasil tem a seu favor o fato de ter um comércio mais diversificado, e os mexicanos — com todos os acordos que fizeram — são cronicamente dependentes do mercado americano.
Seja como for, os benefícios setoriais concedidos aos lotes pelo governo nos últimos anos na sua política industrial têm opositores externos, além dos críticos internos. E esses opositores externos resolveram se unir para apresentar uma queixa de protecionismo contra o Brasil na OMC exatamente quando vai se definir quem dirigirá a Organização.
Faz parte da briga, mas o Brasil deu motivo para que eles entrassem com sua queixa. Deve agora ter uma convincente argumentação para provar que o país que quer dirigir o órgão do comércio não é contra o comércio.
30 de abril de 2013
Míriam Leitão, O Globo
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