Se a presidente Dilma Rousseff tivesse pela opinião dos brasileiros o "respeito decente" que o americano Thomas Jefferson pregava, em relação ao mundo, há quase 240 anos, convocaria uma rede nacional de emissoras para admitir que errou ao se vangloriar de ter ouvido - e entendido - a voz das ruas. Foi o que disse para justificar a confecção, da noite para o dia, dos cinco "pactos em favor do Brasil" com os quais quis fazer crer que atendia às demandas nacionais por serviços públicos "padrão Fifa", combate efetivo à corrupção e mudança radical de atitude dos poderosos de turno diante da sociedade que os sustenta.
Aliás, o carro-chefe de tais respostas, o plebiscito para a convocação de uma Constituinte que faria a reforma política em lugar do Congresso, não durou mais de um dia, por sua patente ilegalidade. Foi substituído pela proposta de uma consulta popular sobre o que mudaria nas regras políticas, para vigorar já no ano eleitoral de 2014. A "sugestão" foi abatida pelos aliados do governo na Câmara.
Dilma apresentou os cinco pactos numa reunião em 24 de junho. Em 1.º de julho, anunciou-os no seu programa semanal de rádio. Oito dias depois, o Ibope começou mais uma de suas pesquisas sobre a avaliação da presidente, entre outros itens, para a Confederação Nacional da Indústria (CNI). Os resultados se revelaram arrasadores para as pretensões de Dilma de ter tomado, a tempo e hora, as iniciativas que as manifestações cobravam. Os números são cristalinos sobre o fiasco: 46% dos entrevistados disseram rejeitar as medidas da presidente, ante 27% dos que as endossaram.
Quase 1/3 dos consultados (31%) as desaprovou totalmente e só 14% as aprovaram sem restrições. Faz sentido. Primeiro, porque a reforma política simplesmente não consta das prioridades populares - saúde (citada por 71%), segurança (40%) e educação (37%). Segundo, porque as iniciativas - alheias, por sinal, à questão da segurança - não sensibilizaram a maioria.
Tem-se assim que o pleno apoio aos gestos de Dilma para mostrar serviço não chega nem à metade dos 31% que avaliam o seu governo como "ótimo" ou "bom". Esse, a propósito, é o patamar registrado pelas duas outras sondagens do gênero, sob o impacto das jornadas de junho. Antes, Dilma ainda voava numa zona de conforto, com a popularidade no nível de 55%, apesar da turbulência provocada pela inflação que a derrubou do pico de 64%, alcançado em abril último. O levantamento confirma que, hoje, a aprovação à petista não vai além do piso histórico do partido.
Mesmo Lula, para se eleger e reeleger, sempre em segundo turno, dependeu do eleitorado de outras legendas. Embora seja cedo para prever como estará o prestígio da presidente quando se aproximar a campanha sucessória, pode-se dar como certo que só por milagre ela se reelegerá na primeira rodada - o que era tido como certo, ou altamente provável, poucos meses atrás. Isso, se o "volta, Lula" não se impuser, queira ele ou não.
O que remete à segunda mais importante revelação da pesquisa, depois do fracasso de público das propostas presidenciais. Pela primeira vez, a parcela dos que consideram a gestão Dilma pior que a do seu patrono passou a predominar de forma acachapante. São 46%, ante 25% em junho e 18% em março. Apenas 10% preferem o governo Dilma. Eram, respectivamente, 16% e 20%.
O contingente dos que acham que ambos se equivalem caiu, também pela primeira vez, para menos da metade: são 46%. E dizer que, na quarta-feira, véspera da divulgação da sondagem, Dilma decidiu, numa conversa reservada de três horas com Lula, que não cortará Ministérios nem tão cedo trocará ministros. Fazê-lo, argumentou, seria ceder a pressões.
Decerto ignora que o velho Ulysses Guimarães, um político de quatro costados, se gabava de só decidir sob pressão. A teimosia da presidente lembra a fábula do escorpião que pica o sapo que o transportava pelo rio. Mesmo sabendo que irá se afogar, não pode contrariar a própria natureza.
Resta a Dilma o duvidoso consolo de não estar mal na foto sozinha. Tem a companhia de quase todos os governadores dos 11 Estados pesquisados, a começar do aliado Sérgio Cabral, aprovado por meros 12% dos cariocas.
28 de julho de 2013
Editorial do Estadão
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