Crise expõe dificuldade de Dilma com palanques. No pior momento em dois anos e meio de governo, presidente não consegue se comunicar com a população, com discursos monótonos e incompreensíveis
Encontro político entre a presidente Dilma, o ex presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Salvador (BA) (Margarida Neide/Ag. A Tarde/Folhapress)
Nos últimos dois anos e meio, a presidente Dilma Rousseff desfrutou de índices elevados de popularidade. Em abril deste ano, a aprovação ao seu governo batia a casa dos 70%, superior à de todos os seus antecessores desde a redemocratização do país. Três meses depois, Dilma viu sua taxa de apoio cair pela metade e, segundo pesquisas, não venceria mais a disputa presidencial de 2014 de maneira folgada – o que chegou a ser dado como certo mesmo por oposicionistas.
No intervalo entre os dois momentos, manifestantes tomaram as ruas das principais cidades do país, em uma onda de protestos que respingou em todos os governantes. Mas, no caso de Dilma, há razões especiais para se preocupar. A inflação crescente, o baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e a falta de conquistas palpáveis jogam contra o governo. O plano de recuperação tem um entrave relevante: a dificuldade da presidente em comunicar-se com a população.
Nos últimos tempos, as limitações de oratória de Dilma se somaram ao tom oportunista, de autopromoção. Na última quarta-feira, a presidente esteve em Salvador para participar de um seminário em comemoração aos dez anos da chegada do PT ao poder. Como nos tempos da campanha eleitoral de 2010, ela dividiu o palco com o padrinho e antecessor no cargo, Luiz Inácio Lula da Silva. Especialmente em um momento de popularidade baixa, Dilma sabe que não pode se restringir aos pronunciamentos técnicos sobre programas do governo, como costuma fazer. Porém, não consegue se adaptar ao estilo palanqueiro nem tem a empatia de Lula com a plateia. Acabou fazendo um discurso monótono e com alguns trechos incompreensíveis, repleto de elogios a si mesma. "Nós queremos fazer mais e podemos fazer mais, justamente porque fizemos", disse ela. A presidente elencou algumas de iniciativas de seu governo, burocraticamente.
Lula falou antes da sucessora. Ainda mais à vontade do que quando era presidente, ele soltou quatro palavrões, confessou que fez troça com Barack Obama e chamou de “babaca” um operário que, em 1989, não quis lhe apoiar. O público, formado por militantes petistas, acompanhou com atenção as palavras do petista, reagindo com risos e aplausos. Dilma, quando subiu ao palanque, teve uma recepção fria.
Dois dias antes, a presidente já havia escorregado: na cerimônia de recepção ao papa Francisco, ela falou como se estivesse inaugurando uma ponte - e, mais uma vez, a autopromoção ganhou espaço. “O Brasil muito se orgulha de ter alcançado extraordinários resultados nos últimos dez anos na redução da pobreza, na superação da miséria e na garantia da segurança alimentar à nossa população”, disse ela.
A crise recente jogou a presidente contra as cordas. Nesse contexto, ressurgiu o discurso petista da luta de classes, que perdeu parte da força - e da utilidade - durante a primeira parte do mandato de Dilma. Como ocorre sempre no partido, o coro foi puxado por Lula. Agora, o ex-presidente intensificou sua atuação para tentar resgatar a imagem do governo.
Na última semana, ele deu as caras por duas vezes: em um evento de mulheres em Brasília e no ato de Salvador. Nos dois casos, falou por cerca de uma hora e abusou do tom agressivo contra todos que não comungam do projeto petista. Em 2005, durante a crise do mensalão, Lula defendeu a tese de que as denúncias eram uma conspiração das elites contra seu governo. Acabou sobrevivendo. Mas a presidente, inclusive por não possuir a origem nem os laços com o PT do antecessor, não consegue se valer da mesma tática.
Estreante – Dilma nunca havia disputado uma eleição até que, em 2010, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva apostou no nome dela para sucedê-lo e deu certo. O que a campanha não escondeu foi a falta de traquejo de Dilma para passar uma mensagem clara aos espectadores de seus discursos.
O padre Antônio Vieira, que passou pelo Brasil durante o século XVII e até hoje é referência de bom orador, dizia que um sermão bem sucedido exigia o bom manejo de cinco peças: a pessoa, a ciência, a matéria, o estilo e a voz. Dilma possui um estilo truncado e costuma usar um tom de voz que, muitas vezes, soa autoritário.
Os pronunciamentos da presidente, quase todos de improviso, não empolgam o público: repletos de anacolutos, frases entrecortadas e afirmações dúbias, eles avançam aos trancos.
“Achamos imprescindível nos dirigir a essa questão, à questão urbana, que é extremamente grave em outros países do mundo também, em países ricos e desenvolvidos, mas, num país pobre como o nosso, entre parênteses pobre, porque não foi investido suficiente, nos últimos anos, nesta área. Nós somos pobres nesta área, e não foi investido, primeiro, por conta da crise da dívida e, segundo, porque não foi investido”, discursou a presidente, no último dia 17 de julho, na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, em Brasília.
Em suas andanças pelo país, onde se depara com um público menos escolarizado, Dilma também sofre para se comunicar de forma eficiente e, frequentemente, recorre a números e estatísticas, como no ano passado, em Castanhal (PA): “O programa Minha Casa Minha Vida, ele assegura para a faixa de renda de até... Familiar que ganha até 1 600 reais, ele assegura que o estado brasileiro, o governo federal, ele cubra 90% a 95% - dependendo do valor da renda - o imóvel para que a pessoa dessa faixa de renda tenha uma moradia digna, onde possa criar seus filhos, ter suas amizades, ter segurança porque a casa dá segurança e, sobretudo, como eu disse para vocês que esse é um programa para a família, esse... E como na família - todo mundo sabe aqui que na família, em qualquer família, a mãe tem um papel fundamental, esse é um programa, também, que assegura às mães, que estão cuidando dos seus filhos, o direito de ter a casa em seu nome quando ela separar e o encargo dos filhos ficar para ela".
O marqueteiro de Dilma, João Santana, aposta que os índices de aprovação da presidente vão melhorar até o fim do ano. As más notícias se acumulam na economia, mas, ressalvado um desastre, como um estouro do desemprego, o mais provável seria a recuperação de ao menos uma parte do eleitorado perdido.
Não é a crença do especialista em marketing político Carlos Manhanelli. Ele afirma que a popularidade real de Dilma é a atual, depois da queda aguda. “Dilma subiu numa bolha, que agora estourou", diz. Segundo Manhanelli, a imagem ainda é uma barreira para Dilma: “Dois anos antes de a lançarem à Presidência, eles trocaram a imagem de gerentona pela de mãe do PAC”, diz Manhanelli. “Mas é a natureza de sargentona que sempre prevalece.”
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Discurseira 'chapolinesca', ou coisa pior...
Encontro com governadores do Nordeste, em 25 de julho de 2011
"Esse processo, o Brasil sem Miséria, ele tem esse caminho, ele tem essa direção, a direção de que o Brasil sem Miséria, ele tem articulação com os demais programas, por exemplo, no caso da agricultura familiar, com o Plano Safra, no futuro."
Conferência Mundial de Determinantes Sociais da Saúde, em 19 de outubro de 2011
"Então, meus senhores e minhas senhoras, eu vejo que o objetivo deste Congresso é incentivar – se me permitem dizer, de maneira talvez imodesta – mas acompanhando um pouco o exemplo brasileiro, o exemplo do extraordinário trabalho que faz o governador Sérgio Cabral, aqui no Rio de Janeiro, inaugurador que foi da tese das Unidades de Pronto Atendimento, as UPAS, que visam exatamente – elas têm, interessante que essa atividade da saúde ela tem, ora um caráter preventivo e ora um caráter, vamos dizer assim repressivo, na medida em que adensa o (incompreensível)."
Entrevista, em 27 de julho de 2012, dia da abertura das Olimpíadas de Londres
"Olha, eu vou te dizer uma coisa: você sabe que eu gosto muito de assistir pela televisão, não é? Porque, pode saber, vocês podem ter uns olhos assim muito agudos, mas o meu não é muito agudo, nunca foi porque eu sempre fui míope. Então, eu sempre prefiro ver de perto, e eu vejo mais de perto pela televisão. Então, eu não irei assistir em campo por que eu não enxergo direito. Eu tenho de levar um binóculo. Hoje, eu vou assistir à abertura com um binóculo um pouco ruim para ver se eu enxergo direitinho o que está acontecendo."
Cerimônia de entrega de imóveis do Minha Casa, Minha vida em Castanha (PA), no dia 1º de fevereiro de 2012
"Por isso, o programa Minha Casa Minha Vida, ele assegura para a faixa de renda de até... familiar que ganha até 1.600,00 reais, ele assegura que o estado brasileiro, o governo federal, ele cubra 90% a 95% - dependendo do valor da renda - o imóvel para que a pessoa dessa faixa de renda tenha uma moradia digna, onde possa criar seus filhos, ter suas amizades, ter segurança porque a casa dá segurança e, sobretudo, como eu disse para vocês que esse é um programa para a família, esse... e como na família - todo mundo sabe aqui que na família, em qualquer família - a mãe tem um papel fundamental, esse é um programa, também, que assegura às mães, que estão cuidando dos seus filhos, o direito de ter a casa em seu nome quando ela separar e o encargo dos filhos ficar para ela."
Cerimônia de inauguração do Hospital Evandro Freire, em 1º de março de 2013
"Pois vejam vocês como é que eu sou uma pessoa de sorte, de sorte, uma pessoa de sorte. Agora, também contribuímos bastante para a nossa sorte, como todos nós temos de ajudar a sorte. E agora eu estou aqui, junto com o ministro Padilha, participando da inauguração de um hospital desta qualidade, e eu fico muito feliz, muito feliz porque eu acredito que o nosso país está se transformando num país de classe média, país de classe média."
Entrevista em 15 de março de 2013, no Palácio do Planalto
“O papa eu irei lá em Roma, eu comparecerei lá em Roma, na medida em que me convidaram, e o Brasil é um país que tem uma população católica muito expressiva e eu acredito que será importante eu, enquanto presidente – e eu não estou falando aí enquanto pessoa, porque enquanto pessoa eu fui criada na Igreja Católica –, mas eu estou representando aí enquanto presidente essa população católica do nosso país.”
Discurso em visita à Associação dos Fornecedores de Cana de Pernambuco, em 20 de maio de 2013
“O que eu vim hoje dizer para vocês é que não se trata, não se trata de agradecimentos porque vocês não precisam de agradecer algo que é, necessariamente, é quase assim… indubitavelmente algo que uma presidenta sensível tinha de fazer por um segmento deste país.”
Entrevista após reunião do Fórum Nacional de Mudanças Climáticas, em 5 de junho de 2013
"O que nós acreditamos é que as potencialidades de uma região, elas se desenvolvem e se expandem quando se cria, naquela população daquela região, formação educacional capaz de tornar essa educação um elemento transformador."
Reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, em 17 de julho de 2013
"Achamos imprescindível nos dirigir a essa questão, à questão urbana, que é extremamente grave em outros países do mundo também, em países ricos e desenvolvidos, mas, num país pobre como o nosso, entre parênteses pobre, porque não foi investido suficiente, nos últimos anos, nesta área. Nós somos pobres nesta área, e não foi investido, primeiro, por conta da crise da dívida e, segundo, porque não foi investido."
Cerimônia de formatura de alunos do Pronatec, em 18 de julho de 2013
"Os diplomas, eles valem porque eles representam um esforço de cada pessoa, um esforço e um reconhecimento de que esse esforço, esse esforço adquiriu um valor que você carrega pela vida inteira. É, talvez, a maior riqueza que alguém carrega, porque você carrega só levando o corpo, mais nada."
28 de julho de 2013
Gabriel Castro, Veja
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