O Brasil vem operando de acordo com um modelo de forte expansão do consumo, cujos contornos já expliquei neste espaço. No início, a taxa de crescimento potencial da economia brasileira atingiu a quase 4,5% ao ano, acompanhando a expressiva elevação dos investimentos. De 2009 para cá, contudo, o volume de investimentos, que subira de 14% para 18% do PIB, parou de aumentar. Consequentemente, o crescimento sustentável voltou a cair para uma faixa entre 2 e 3% ao ano.
Passada a crise do subprime, certo amortecimento da força do modelo de expansão do consumo era esperado, resultado de um freio natural na forte expansão do crédito ao consumidor, em resposta ao aumento das taxas de inadimplência. Outro ajuste viria da desaceleração do crescimento chinês, também previsível, que poria alguma trava no forte aumento dos preços externos de commodities e nos benefícios que isso agregava ao Brasil. Mas nunca se deveria esperar que, tudo o mais constante, a relação investimento/PIB parasse de subir no Brasil, acarretando queda do PIB sustentável, inclusive em comparação com os demais emergentes.
Temo, assim, que boa parte da explicação do pífio desempenho da economia de 2009 para cá esteja na excessiva interferência do governo, algo que se acentuou após a crise, e que poderia perfeitamente ser evitado. Crise que, aliás, foi usada como bode expiatório para justificar o forte incremento nos gastos da União e dos empréstimos do BNDES financiados com a emissão de títulos públicos. Passado o pior, o governo resiste em retirar os instrumentos de exceção.
Nesse contexto, uma ampla lista de ingerências governamentais, com nítido cunho populista, contribuiu para a redução das intenções de investimento. Tal comportamento pautou não apenas parte das empresas localizadas no País, como investidores em potencial, internos ou externos. Um deles foi o congelamento dos preços dos derivados de petróleo, que levou à forte expansão de seu uso, aumento das importações e queda no consumo de etanol, prejudicando a Petrobras e o setor alcooleiro.
Outro foi a redução das tarifas de energia elétrica na confusa operação em que as empresas em final de prazo de concessão foram estimuladas a aderir ao plano do governo, em troca de mais uma renovação. Outro item, ainda na área de controle de preços, foi o adiamento do reajuste das passagens de ônibus urbanos que o governo pediu às principais prefeituras no início do ano, tudo isso implicando a necessidade de uma inflação corretiva entre 2 e 3% ao ano, que, como na Argentina, não aparece nas estatísticas oficiais e aguarda diluição.
Finalmente, diante das manifestações de junho, o governo federal e o de São Paulo preparam-se para adiar o reajuste de pedágios previsto para estes dias, o que pode levar a um represamento ainda maior de inflação. As atuais concessionárias estão, obviamente, com as barbas de molho, esperando algo pior à frente e revendo planos de investimento.
Também bateu de frente com a avaliação de risco do País a criação de novos controles à entrada de capitais externos, que ocorreu no ano passado, com vistas a forçar uma depreciação do real acima da inflação, algo que acabou acontecendo, e aumentar a competitividade da indústria de transformação. Isso acabou antecipando, de certa forma, um movimento de desvalorização da moeda que acabaria acontecendo de forma natural este ano, diante do anunciado aperto que deverá ocorrer na política monetária americana, mas não parece ter sido capaz de despertar o espírito animal dos empreendedores na indústria.
A piora da percepção de risco — e o resultante desestímulo aos investimentos — veio também da sensação de que o governo havia abandonado a tríade superávit primário alto/meta de inflação/câmbio flutuante, herdada de FHC. A queda dos superávits resultou em parte do maior aumento dos gastos, mas principalmente da queda inicial de arrecadação, posteriormente acentuada pela desoneração tributária concedida a segmentos escolhidos arbitrariamente. Em vez de explicar que pelo menos parte disso poderia se justificar pela necessidade de responder à crise, o governo manteve a meta de superávit ambiciosa de antes, e introduziu vários artifícios contábeis para esconder a piora fiscal.
Quanto à inflação, parece que o centro do intervalo de metas aumentou informalmente para 5,5% ao ano, e só mais recentemente o Banco Central se mostrou efetivamente empenhado em demonstrar que perseguiria a antiga meta oficial. Nada se disse porém em relação ao “passivo” representado pelos reajustes tarifários não concedidos nas épocas previstas.
Não se pode esquecer a novela das concessões privadas de infraestrutura. O governo sabe que não tem recursos para investir em transportes, se empenhou no lançamento de um parrudo programa de concessões, mas insiste em impor retornos inaceitáveis e outras práticas afugentadoras dos candidatos sérios. Assim não dá.
12 de agosto de 2013
Raul Velloso é economista
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