"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quarta-feira, 30 de maio de 2012

COMEÇA A PRIVATIZAÇÃO DE PRISÕES NO BRASIL


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Sistema prisional brasileiro é alvo de críticas severas das organizações de direitos humanos (Reprodução/Internet)
A clientela é grande. O Brasil tem a quarta maior população carcerária do planeta e déficit de nada menos do que 200 mil vagas

A partir do início da década de 1990 o governo brasileiro vendeu mais de 100 empresas estatais e concessionárias de serviços públicos, em um processo de privatizações — ainda em curso, vide aeroportos — que já abarcou a telefonia, a distribuição de energia elétrica, muitas rodovias e gigantes da mineração e da siderurgia. Mas o que foi feito com o telefone, a luz, as estradas e o minério de ferro pode ser feito com as penitenciárias e sua, digamos, clientela?

Na verdade, a largada já foi dada no processo de privatização do altamente degradado e falido sistema prisional brasileiro, alvo de críticas severas das principais organizações internacionais de defesa dos direitos humanos.

Será inaugurado em agosto deste ano, na cidade de Ribeirão das Neves, na região metropolitana de Belo Horizonte, o primeiro presídio privado do Brasil, construído por meio de Parceria Público-Privada (PPP), e que será gerido pela concessionária GPA, sigla do grupo mineiro Gestores Prisionais Associados (GPA).

Outros grupos de olho no filão

Serão 3.040 vagas divididas em cinco unidades com capacidade para 608 presos cada uma. Como em todo processo de privatização, as promessas de maravilhas são muitas:

Atendimento médico com intervalo máximo de 45 dias, tecnologias de ponta para monitoramento de presos e metas para impedimento de fugas e outros eventos graves, o que será tentado mediante a utilização de sistemas de sensoriamento de presença, controle de acesso de um ambiente para o outro, comando de voz e Circuito Fechado de Televisão (CFTV) em todo o complexo.

“Com oferta de trabalho, estudo, saúde e controle da segurança, a possibilidade de obter sucesso é muito maior”, disse à imprensa o coordenador da unidade setorial de PPP da Secretaria de Defesa Social (Seds) de Minas, Marcelo Costa.

Além do grupo GPA, que arrematou os direitos de exploração do primeiro presídio privado do Brasil, tem mais gente de olho neste filão, como o consórcio JVS (formado pela Gocil, Heleno & Fonseca e JVS Consultoria), que chega com soluções financeiras para presídios consideradas inovadoras debaixo do braço, e a construtora Queiroz Galvão, que firmou parceria com empresas espanholas que têm experiência na ressocialização de detentos.

Meio milhão de presos espremidos

A clientela é grande. O Brasil tem a quarta maior população carcerária do planeta (depois apenas de EUA, China e Rússia), com cerca de meio milhão de pessoas vivendo espremidas atrás das grades — a despeito do senso comum de que somos o país da impunidade — em um sistema carcerário para lá de superlotado. Especialistas dizem que existe um déficit de nada menos do que 200 mil vagas.

E o mercado, por assim dizer, tende a crescer, uma vez que os legisladores cedem cada vez mais à tentação da solução penal, ou seja, da criminalização, de tudo e todos quanto seja possível, na esteira das políticas criminais norte-americanas de tolerância zero e efeitos pífios sobre os índices de criminalidade, e na contramão da modernidade jurídica, a do Direito Penal mínimo.

“Minha Casa, Minha Vida” que nada. Por aqui, caminhamos para o cenário descrito pelo sociólogo francês da Universidade da Califórnia Loïc Wacquant, para quem em países como os EUA a penitenciária se transformou na verdadeira política habitacional dos tempos que correm.

por Hugo Souza

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