"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 6 de janeiro de 2013

EM REPÚBLICA DE TORPES III

 "Uma pessoa condenada por desobedecer à lei considerada apta a escrever leis. "
"Tenho a consciência serena dos inocentes”.

José Genoino é um homem de palavras e sentenças cortantes.

Durante vários anos foi a voz oficial do PT na imprensa conservadora.Teve uma coluna fixa na página 2 do Estadão e mais do que isso, o insuspeito voto de um dos ícones do reacionarismo burguês que forma a opinião do jornal.

Durante muito tempo, José Genoíno foi o petista limpinho, civilizado e ordeiro que tornou respeitável a opinião do partido revolucionário que queria queimar as instituições para implantar seu modelo socialista. A face palatável do partido para os burgueses que tinham horror aos barbudos revolucionários. Até o cavanhaque dele, a la d`Artagnan, era mais fotogênico, arrumadinho, geometricamente bem cortado.

José Genoino sempre foi um homem honrado e o seu passado de luta revolucionária uma medalha de honra ao mérito como aquelas que os meninos bem comportados ganham nos colégios internos.

Enfim, um fenômeno: um revolucionário respeitado e querido pelos reacionários.

Na época do mensalão, José Genoino carregava o andor de presidente do Partido dos Trabalhadores, como uma espécie de avalista das boas intenções do partido. Como desconfiar de um partido entregue à presidência de um sacristão de bons modos como ele?

Depois aconteceu o que todo mundo sabe. Aos poucos, enquanto as investigações iam avançando e as evidências da existência do mensalão foram se acumulando, Genoino foi perdendo a altivez, o peito empombado murchou um pouco e a voz metálica foi perdendo o tom afirmativo, altaneiro e superior. Não bastasse o mensalão, veio o patético episódio dos dólares na cueca.

Genoino se escondeu na humildade, passou por um início de depressão, escondeu-se no quarto dos fundos de sua casa, perdeu o brilho, seu orgulho empanou-se. Ele tornou-se opaco.

Condenado a seis anos de prisão por corrupção e formação de quadrilha, será beneficiado com regime semi-aberto e poderá trabalhar normalmente de dia e dormir na prisão. Se comparado a José Dirceu, dito o chefe da quadrilha, um mal menor.

Suplente de deputado assumiu a vaga do titular numa cerimônia realizada quinta-feira na Câmara. Filigranas jurídicas sobre a viabilidade ou não de um recurso à Suprema Corte, última instância do julgamento, permitiram que fosse diplomado.

Zangado, mal humorado e tratando a pontapés a imprensa que sempre lhe estendeu tapete vermelho, parece de mal com a vida assumindo um dos maiores paradoxos vivos criados pela adolescente democracia brasileira: temos, sabe lá por quanto tempo, uma pessoa condenada por desobedecer à lei considerada apta a escrever leis.

Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez. E.mail: svaia@uol.com.br
 
06 de janeiro de 2013

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