Hugo Chávez não planejou sua doença ou eventual morte. São coisas para mortais. Caudilhos e czares como Chávez e Vladimir Putin são para sempre. Agora o roteiro boliviariano enfrenta o choque de realidade. Ao contrário do Partido Revolucionário Institucional, do México, o PRI, a autoridade na Venezuela parece coisa de fantasma depois da posse que não aconteceu de Chávez para um terceiro mandato na quinta-feira. Houve a farsa grotesca da posse simbólica. O presidente continua internado em Havana e ninguém sabe exatamente qual é o seu estado de saúde. O da Venezuela é sofrível.
No sistema mexicano que vigorou por 71 anos ininterruptos, até 2000, o poder era transmitido metodicamente de um presidente para outro. Mandato único de seis anos.
O mandatário tinha poder, mas o sistema muito mais. Depois de deixar o cargo, o ex era até vilipendiado pelo sucessor.
Assim, havia uma aparência de renovação no sistema. Na expressão lapidar de Mario Vargas Llosa, O PRI forjou a ditadura perfeita. Tudo tão eficiente, que, após um intervalo, o PRI está de volta ao poder com Enrique Peña Nieto, num México que pode ser hoje definido como uma democracia imperfeita.
A Venezuela de Hugo Chávez é a ditadura imperfeita e o caudilho, um fantasma. Não o regime. Ele assusta, mas por ser real. Existem, é verdade, as facções, representadas pelo vice Nicolás Maduro e pelo presidente do Congresso, Diosdado Cabello. A curto prazo, Maduro deverá prevalecer, pois o regime precisa de um mínimo de ordem, especialmente para não dar espaço à oposição.
Cabello é um ex-oficial do Exército (companheiro de Chávez no golpe fracassado de 1992). Ele representa a ala militar do regime, mas não tem o comando direto de tropas. Recentemente, Chávez realizou promoções para diluir o poder de outros oficiais com muito tempo de serviço. No entanto, vários militares da reserva (e na lista estão quatro ex-ministros da Defesa) são governadores, como parte de uma composição de poder com a ala civil do regime.
As alas, claro, estão unidas para dificultar ao máximo a eleição presidencial de um antichavista (e eleições em algum momento precisarão ser convocadas, pois não dá para manter para sempre a farsa da “continuidade administrativa” de Chávez). Existem vários círculos de resistência, como a Milícia Bolivariana, um corpo paramilitar, exército pessoal do caudilho, hoje com apenas 30 mil efetivos, mas com algumas unidades bem equipadas e que pode ser ampliada para até 100 mil integrantes.
Também preocupante é um dos pilares de sustentação de Maduro, Havana, a outra capital da Venezuela. São mais de 60 mil expedicionários no país, entre civis e militares. O aparato de poder, intimidação e o sistema de benesses sociais do chavismo compensam em parte a ausência de carisma dos lugares-tenentes do caudilho.
Mas se trata de uma ditadura imperfeita, ainda formalmente sob o comando de um fantasma, com o desafio de consumar a revolução institucional. Para a oposição, será preciso habilidade, paciência e coragem para combater fantasmas e um regime real. A meta será romper a continuidade administrativa do chavismo.
11 de janeiro de 2013
Caio Blinder, Veja Online
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