Seria bom o Banco Central ter em mente que 5,84% não é a meta de inflação. Ela é 4,5%, ponto ao qual esta diretoria jamais conseguiu chegar. Além disso, essa meta é alta para países com economia estabilizada, o que é o nosso caso. Por fim, deveria considerar que uma taxa de quase 6% num ano em que não houve crescimento econômico é um resultado muito ruim. Mas o BC comemora.
O Banco Central comemorou a inflação dentro da margem de tolerância, da mesma forma que em 2011 comemorou aquele bater na trave, com golpe de mão, que foi o 6,5%. A inflação está alta para as circunstâncias, para o padrão atual do mundo, para um país que tem uma história áspera em relação a esse problema. Seria bom se as autoridades tivessem maiores ambições, o que poderia levar a novos ganhos no futuro.
Esse cenário de baixo crescimento com inflação alta pode ser resumido em uma palavra que causa apreensão nos economistas: estagflação. O professor José Márcio Camargo, da PUC-Rio, explica que a inflação de serviços está em 9%, enquanto os preços industriais estão com alta de apenas 1,5%. Ou seja, a inflação de serviços contamina a inflação como um todo e tira competitividade da indústria.
— O Brasil já vive um cenário de estagflação, porque temos crescimento baixo por dois anos - este ano projetamos 0,9% - e uma inflação alta para os padrões internacionais. A inflação de serviços vira custo industrial porque os salários sobem em função do IPCA — explicou Camargo.
Preocupa muito a insistência da inflação num nível alto por longo período. Ela só não está maior porque o governo tem tomado vários tipos de medidas pontuais para segurar os preços, como se estivesse tapando buracos de uma panela de pressão. Na visão de Camargo, sem isso, a inflação teria fechado o ano em 6,7%.
— De uma certa forma, a política monetária está invertida, em relação ao que a economia brasileira viveu de 1994 a 2010. Os juros viraram o último instrumento para combater a inflação — disse o economista.
Em 2011, a inflação não estourou a meta porque alguns reajustes e elevações de impostos foram postergados. Em 2012, o preço da gasolina continuou congelado, apertando as contas da Petrobras. Houve também uma mudança de fórmula de cálculo do IPCA, que tirou 0,5 ponto percentual da inflação. Isso sem falar nas reduções de IPI para automóveis, itens de linha branca e materiais de construção. Ainda assim, a taxa fechou 2012 próxima de 6%.
Os itens que mais caíram de preço no ano foram os que tiveram algum tipo de ajuda da Fazenda. Os televisores ficaram 13,25% mais baratos, com a redução do IPI. A mesma coisa aconteceu com o automóvel usado, -10,68%; automóvel novo, -5,71%; e motocicletas, -2,59%. A gasolina caiu 0,41%, o que puxou para baixo o etanol, que caiu 3,84%.
Tudo isso seria bom se a lista de itens que estão pressionados não fosse enorme. As passagens aéreas subiram 26% no ano. As despesas pessoais aumentaram 10,17%. A inflação de serviços fechou em 8,74%. O gasto com empregado doméstico aumentou 12,7%. Os aluguéis subiram 8,95% e os planos de saúde, 7,79%. O grupo alimentação subiu 9,86%, não só pela quebra de safras em vários países, mas também porque os restaurantes brasileiros estão pagando mais por aluguéis e mão de obra.
O governo passou os últimos dois anos estimulando o consumo. A expansão do crédito continua em um ritmo nada moderado, na casa de 15%, e o superávit primário não foi cumprido. Isso ajudou a pressionar os preços. Quatro das 11 capitais onde o IBGE calcula o IPCA estouraram o teto da meta: Belém, 8,31%; Rio de Janeiro, 7,34%; Recife, 6,79%; Fortaleza, 6,7%. O INPC, que mede a inflação para a população de baixa renda, fechou em 6,2%.
O projeto tem que ser crescer com inflação baixa, de 2% a 3%, por um longo período. Em 2011, derrubamos os juros – o que foi ótimo –, mas houve piora no déficit nominal, o PIB não cresceu e a inflação ficou acima do centro da meta. Essa política de poucas ambições tem apresentado baixo desempenho, mesmo assim é motivo de comemoração no Ministério da Fazenda e Banco Central. Na Fazenda, é pior, porque lá há quem defenda publicamente a convicção de que a inflação não deveria cair.
11 de janeiro de 2013
Miriam Leitão, O Globo Online
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