De Hugo Chávez, seus adeptos e admiradores dentro e fora da
Venezuela costumavam dizer que representava o partido dos pobres, e que por isso
ganhava uma eleição atrás da outra. Em 14 anos, ganhou quase todas as 17 que
patrocinou.
Eleito presidente no último domingo por uma exígua margem de
votos, Maduro está longe de se parecer com Chávez. Mas foi apresentado por
Chávez como o seu herdeiro político. E se apresentou durante a campanha como “o
filho do Chávez”.
A fascinação exercida por Chávez sobre os pobres não resistiu à
passagem do 30º dia da morte dele, vítima de um câncer tratado em Cuba. Uma
fatia dos pobres preferiu votar no candidato da oposição. E a eleição terminou
quase empatada.
Carece de cabimento dizer que os pobres estão com o chavismo e
que o resto, a burguesia e os interesses internacionais, com a oposição liderada
por Henrique Caprilles, o candidato derrotado por Maduro.
A herança maldita legada por Chávez a Maduro é desde domingo
uma Venezuela politicamente partida ao meio e confrontada com sérias
dificuldades econômicas. O crescimento da inflação é apenas uma delas.
O desaparecimento de produtos das prateleiras dos
supermercados, outra. Está faltando até papel higiênico. Um mal alimenta o outro
e ameaça implodir a panela de pressão.
A economia capenga assusta os donos do capital que seguram os
investimentos, e aumenta a insatisfação dos pobres – antes conduzidos por Chávez
na base do gogó.
A divisão política tende a tornar um inferno o governo de
Maduro. Uma coisa é ter sido chanceler durante 10 anos de um governo cujo líder
não abria espaço para ninguém. O chanceler estava dispensado de ser um
gênio.
Outra coisa é governar tendo logo de saída sua legitimidade
posta em dúvida. Maduro ganhou com 300 mil votos de vantagem em números
redondos. A oposição diz colecionar provas do desvio para Maduro de algo como um
milhão de votos.
No discurso da vitória, em cadeia nacional de rádio e
televisão, Maduro afirmou que concordava com uma auditoria no resultado da
eleição. Capriles pedia mais do que isso. Cobrava uma recontagem dos votos –
cerca de 14 milhões.
Devem ter dito ao inexperiente Maduro que auditoria ou
recontagem poderia ser um tiro no pé. O recuo então foi imediato. No dia
seguinte, Maduro esqueceu o que dissera, negou o que Caprilles pedira e se
deixou proclamar presidente.
Só há duas maneiras de governar um país nas condições atuais da
Venezuela. A primeira: negociando com a oposição, dona de 48% e mais um quebrado
dos votos. A segunda: de chicote na mão e disposto a usá-lo sem dó nem
piedade.
A oposição se recusa a reconhecer a vitória de Maduro. Promoveu
um panelaço. Cercou escritórios nos Estados do Conselho Nacional Eleitoral. Saiu
em passeata. Queimou pneus. Morreram sete pessoas até aqui. Mais de 100 saíram
feridas.
Maduro proibiu a marcha que a oposição faria, hoje, sobre
Caracas. E ameaçou apelar para o chicote. A marcha foi suspensa – o que por
enquanto significa apenas que ela foi suspensa, nada mais do que isso.
O Brasil é o país da conciliação. O Império foi derrubado sem
que se disparasse um único tiro. Um presidente da República – no caso, Lula –
correu o risco de sofrer um processo de impeachment, mas a oposição preferiu
deixar para lá.
A história da Venezuela é marcada por conflitos com muitas
mortes. O sangue, ali, corre fácil. Maduro pelejará com a oposição, mas também
com parte das forças que apoiavam Chávez e que a contragosto o apoiam.
É pouco provável que o desfecho seja pacífico. Ou que se
arraste por longos anos.
18 de abril de 2013
Ricardo Noblat
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