"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 18 de julho de 2013

DILMA ACREDITA QUE "PESSIMISTA" LEVOU O POVO A ACREDITAR QUE COMIDA FICOU CARA

Presidente parece acreditar que boato 'pessimista' levou o povo a acreditar que comida ficou cara
 

A PRESIDENTE tem "certeza" de que a inflação de 2013 vai ser menor do que o limite oficial de 6,5% ao ano.

Essa certeza sustenta sua tese de que é "incorreto falar em descontrole da inflação", que seria uma "informação parcial", "muitas vezes" explorada de modo a confundir a opinião pública e a "criar um ambiente de pessimismo".
 
Foi o que Dilma Rousseff disse ontem ao Conselhão (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, de representantes da sociedade, de assessoria informal, do qual fazem parte vários empresários).
 
A presidente choveu no molhado com esse discurso de resto infeliz para quem em tese está dançando miudinho por causa dos efeitos da "voz das ruas".
 
Quase nenhum economista com algum crédito na praça acredita que a inflação vá passar de 6,5% ao fim de 2013, nem mesmo aqueles que detestam o governo de Dilma ou, nos casos mais extremos, nem aqueles de fato dedicados a difundir ideias pessimistas (como se tivessem tamanha audiência popular ou fosse necessário o esforço deles).
 
As pessoas comuns, que não dão a mínima para economistas ou comentaristas econômicos, começaram a fazer piadas amargas sobre o preço do tomate simplesmente porque os preços que mais pesam no seu orçamento e mais saltam à vista subiram um montão, simples assim: a comida ficou cara.
 
As piadas sobre o tomate começaram a circular por celulares e internets e conversas de rua ali por volta de março. O tomate era, claro, metáfora para supermercado salgado.
 
Talvez a presidente queira convocar a Polícia Federal para investigar a origem do rumor do tomate, lançado para "criar um ambiente de pessimismo".
Mas seria mais simples verificar o IPCA de abril: foi nesse mês que a inflação da comida e bebida chegou a 14% (inflação acumulada em 12 meses). A tendência de alta vinha desde abril de 2012.

Preços de bens duráveis (carro, TV, eletrodomésticos) até chegaram a cair nesses meses. Mas as pessoas não compram carros rotineiramente; de resto, os preços de carros são tão revoltantes de altos que uma diferença de 2% mal chega a ser notada.

O preço de comida, saúde, serviços e despesas pessoais, todos esses fomentadores de pessimismo cotidiano, subiram acima da inflação média. Subiram mais que o reajuste médio de salários no segundo trimestre deste ano.
 
Não entender tal coisa, que gasto com comida é tanto mais pesado quanto mais pobre o cidadão, atribuindo o pessimismo a "forças ocultas", é de fato entender muito pouco de gente e de "voz das ruas".
 
Enfim, é difícil lembrar de gente séria, da esquerda à direita, ou de movimentos horizontais e verticais que tenha falado em "descontrole da inflação".
Muita gente falou é de descontrole do governo, que é outra coisa.
 
Porém estava óbvio que o Brasil se tornara um país caro, de dólar chegando a R$ 1,60, com deficit externo crescente (é mais barato comprar importados), com a margem de empresas eficientes caindo devido a custos altos, o que ajudou a derrubar investimentos etc. Da rua da feira às reuniões de empresários não se falava (fala) de outra coisa. Em que mundo vive a presidente?


18 de julho de 2013
Vinicius Torres Freire - Folha de São Paulo

NOTA AO PÉ DO TEXTO

Das janelas do Palácio do Planalto, não se avistam supermercados, mercadinhos e quitandas...
Das amplas vidraças que as emolduram, apenas o manancial contido das águas e o espaçoso gramado caem nos olhos do espectador do belo espetáculo vertical dos Ministérios, da arquitetura magistral do Congresso, do Itamaraty... Um universo paralelo, distante da realidade das ruas agitadas.
Tudo servido a tempo e a hora, como saber o que se passa nas ruas, onde o povo busca o pão da sobrevivência, como conta a maldição bíblica, com o "suor do rosto"?
Por onde andará a consciência cívica do poder, que esse mesmo povo outorgou, confiante, e que agora acorda, depois de um demorado pesadelo, quando não lhe foi servido seus mínimos e básicos direitos à segurança, à saúde, à educação, à decência pública...
Assustam-se o Poder e o Congresso. A multidão que deu acordo de si, está chutando a porta da frente, e ameaça arrombar com gritos, como as trombetas de Jericó, as muralhas que escondem os mananciais e o frescor das mordomias e benesses, que os eleitos fruem inadvertidamente, como se o país fosse cor-de-rosa, e o povo estivesse se divertindo e farto de felicidade.
Ele está farto, mas de assistir a esbórnia, o descalabro, a corrupção... Ele está farto de ser roubado de sua cidadania e dos seus direitos... Ele está farto do silêncio que estimula a ganância e o desprezo de governantes, que tripudiam sobre suas cabeças e cinicamente posam de "gente honesta" distribuindo "bolsas" como já distribuíram brioches...
Arma-se a tempestade cidadã, e que os insensatos sejam responsabilizados pela incúria.
m.americo

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