"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 21 de julho de 2013

MORRE HELEN THOMAS, A LENDÁRIA JORNALISTA VETERANA CORRESPONDENTE DA CASA BRANCA


Jornalista morreu em seu apartamento, neste sábado, após uma longa doença. Ao todo, Helen cobriu o mandato de 10 presidentes. Tinha cadeira cativa na sala de imprensa da Casa Branca. Fez inúmeras perguntas irrespondíveis aos presidentes, algumas delas ficaram nos anais da história do jornalismo americano.
 
Foto: Alex Wong/Getty Images
 
Helen Thomas, a jornalista norte-americana que durante quase 50 anos teve lugar cativo na primeira fila da sala de imprensa da Casa Branca, morreu no sábado de manhã, aos 92 anos, depois de uma doença prolongada. A morte foi confirmada por uma nota do Gridiron Club, uma vetusta e seleta instituição de Washington que quebrou a tradição ao aceitar Helen Thomas como membro – a primeira mulher a entrar no clube e que um dia chegou a presidente.

A longevidade e pioneirismo da carreira fizeram dela uma “lenda” entre os jornalistas da capital dos EUA.

Helen Thomas teria alcançado um estatuto mítico no jornalismo político norte-americano, não fosse o episódio que a afastou definitivamente da profissão, em 2010, com quase 90 anos: a divulgação de comentários antissemitas, numa conversa filmada por um rabino e documentarista que estava de visita à Casa Branca. Helen afirmou que os judeus deviam "ir embora o mais rápido possível da Palestina" e "voltar para casa", na Alemanha, Polônia ou Estados Unidos.

As palavras geraram um vendaval de críticas, inclusive do então porta-voz da Casa Branca, Robert Gibbs, que considerou as declarações 'ofensivas e reprováveis'. Helen pediu desculpas pelos comentários, mas não recuar de sua opinião, em seguida abandonou para sempre a cadeira que ocupava no centro da primeira fila da sala de imprensa da Casa Branca.

Como recordam agora os seus antigos colegas, esse incidente que a obrigou a uma reforma indesejada e sem glória resumia, para o melhor e o pior, a personalidade e o carácter de Helen Thomas: uma mulher destemida, polêmica, que não se furtava a controvérsias e não se importava de ser inconveniente. “Coquete” na aparência, mas simples no trato, dura nas palavras, mas justa nos juízos, inflexível, mas generosa e divertida com os seus colegas e as suas fontes.
 
Foto: Abbie Rowe/da coleção do Museu de John Kenney em Boston
Poucos jornalistas chegaram tão perto de tantos presidentes americanos como Helen, sem que isso interferisse na sua mordacidade, na foto, vestida de branco, fazendo anotações no Salão Oval da Casa Branca, com Kennedy ao telefone
 
Filha de imigrantes libaneses, Helen Thomas nasceu no Kentucky e cresceu em Detroit, numa família de nove filhos. A sua paixão pelo jornalismo manifestou-se no liceu, e cresceu na universidade.

No fim dos estudos, em 1942, mudou-se para Washington, onde arranjou emprego como revisora no hoje extinto, Washington Daily News. Foi uma passagem efêmera, mas que lhe deu a confiança necessária para, um ano depois, ir bater à porta de cada um dos escritórios do National Press Building – foi a agência United Press Internacional (UPI) quem a contratou, para o serviço de rádio (a voz grave tornar-se-ia uma das suas imagens de marca).

Da rádio foi transferida para a secção nacional na década de 1950, cobrindo o noticiário das agências e departamentos do Governo federal. Em 1960 foi escalada para a cobertura da campanha eleitoral de um jovem senador democrata, John F. Kennedy.

Thomas reconheceu aí uma oportunidade: nenhum dos repórteres veteranos da política conseguia garantir o noticiário sobre a vida do casal Kennedy que tanto interesse despertava, e Helen corria atrás das cabeleireiras e modistas de Jaqueline Kennedy.

O seu esforço acabaria por ser recompensado quando, em 1961, a UPI a integrou na sua equipe da Casa Branca – Kennedy acabava de ser eleito Presidente e uma nova era começava em Washington. Thomas entrava num mundo que ainda permanecia vedado às mulheres; ao longo dos anos, quebrou barreiras em nome das mulheres no jornalismo e até morrer foi uma proeminente defensora da igualdade de oportunidades na sua profissão.
 
Foto: Greg Gibson / Associated Press
Presidente Clinton finge entrevistar a correspondente UPI na Casa Branca Helen Thomas na sala de imprensa, 04 de agosto de 1995, aniversario dela
 
 
Depois de John Kennedy, o seu Presidente favorito, veio Lyndon Johnson; Richard Nixon; Gerald Ford; Jimmy Carter; Ronald Reagan, George Bush, Bill Clinton, George W. Bush e Barack Obama, com quem partilhava a data de aniversário.

Helen Thomas acompanhou dez Presidentes e durante décadas na Casa Branca construiu uma sólida reputação como uma das jornalistas mais ácidas, contundentes, perseverantes e competitivas de Washington.

Algumas das perguntas “difíceis”, que colocava com uma inocente e desconcertante facilidade, ficaram nos anais da Casa Branca. Como quando perguntou a Nixon sobre um alegado “plano secreto para acabar com a guerra no Vietnam: "qual é?

Ou no fim do escândalo Lewinsky provocou Bill Clinton: “Acha que ainda devia estar aqui?”.

Ou quando na primeira oportunidade para inquirir George W. Bush – que durante três anos recusou responder-lhe por Helen o ter considerado “o pior Presidente da história dos Estados Unidos” – disparou: “Todas as razões que invocou para a invasão do Iraque revelaram-se falsas: afinal, essa guerra foi para quê?”

Thomas, que nunca escondeu as suas simpatias políticas “liberais”, demitiu-se da UPI no ano 2000, depois de 57 anos de contrato e depois de a agência ter sido comprada pela News World Communications, a subsidiária para os media da Unification Church fundada pelo líder religioso coreano Sun Myung Moon.

Era, na altura, a detentora da “senioridade”, a decana, no corpo de correspondentes da Casa Branca: segundo as regras não escritas que vinculam os jornalistas que cobrem a presidência, a primeira pergunta nas conferências de imprensa é prerrogativa do repórter das agências há mais tempo no cargo.

Helen regressou dois meses mais tarde, como colunista do conglomerado Hearst Newspapers: os seus textos continuaram a ser distribuídos em jornais de todo o país, mas desta vez sem os “constrangimentos” da escrita de agência a que sempre obedeceu.

“Tive de me autocensurar durante mais de 50 anos, mas agora posso acordar e pensar: com quem é que estou furiosa esta manhã?”, escreveu na sua biografia Thanks for the Memories, Mr. President
 
Foto: Associated Press
O presidente Barack Obama comemorando aniversário junto com Helen, eles aniversariavam no mesmo dia: 04 de agosto.
Declaração do Presidente Barack Obama

Michelle e eu ficamos tristes ao saber da morte de Helen Thomas. Helen foi uma verdadeira pioneira, abrindo portas e quebrar barreiras para as gerações de mulheres no jornalismo. Ela cobriu a Casa Branca desde que o presidente Kennedy, e durante esse tempo ela nunca deixou de manter presidentes - eu incluído - em suas mãos.

O que fazia Helen a "decana da imprensa da Casa Branca Corps" não era apenas o comprimento de seu dever, mas sua crença forte de que a nossa democracia funciona melhor quando fazia perguntas difíceis, obrigando os nossos líderes a prestar contas.

Nossos pensamentos estão com a família de Helen, seus amigos e os colegas que a respeitava profundamente.

Fonte : White House

21 de julho de 2013
in  Toinho de Passira
Fontes: Publico, UPI, Time, ‘‘thepassiranews’’, G1, CNN, Al Jazeera

Nenhum comentário:

Postar um comentário