Editorial do Globo
Brasil assume discurso contra obstáculos ao comércio, porém não pratica o que defende. Corre o risco de se nivelar por baixo, numa região em que está a Argentina
Surtos de fechamento de mercados constam dos compêndios de história econômica como decorrência clássica de recessões globais. Foi, inclusive, o protecionismo, na crise da década de 30 do século passado, que turbinou a chamada Grande Depressão.
Vivida aquela experiência trágica, mesmo num mundo ainda não tão interdependente quanto o de hoje, lideranças mundiais costumam fazer o alerta contra barreiras às importações nesta fase de retração do crescimento mundial, na esteira da crise deflagrada a partir de Wall Street no final de 2008.
Mesmo assim, tem havido casos de obstrução do comércio, sempre em nome da defesa de empregos nos mercados importadores. Se todos fizerem o mesmo movimento, é óbvio que a produção mundial mergulhará em parafuso.
O Brasil tem ocupado tribunas de instituições multilaterais com um discurso vigoroso contra o protecionismo — mas não pratica o que defende. Assim não fosse, diplomatas do Itamaraty não teriam sido bombardeados por representantes dos Estados Unidos, Europa e Japão em reunião, segunda-feira, na sede da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Genebra.
Não há mocinhos no comércio internacional, ainda mais numa conjuntura de retração dos negócios como a atual. Se os americanos reclamam da taxação em até 25% das importações de uma lista com cem produtos — e virá mais —, também não cumprem determinações da OMC de indenizar o Brasil por conceder subsídios ilegais aos produtores de algodão.
Um erro não justifica outro. Se o Brasil tem razão de reclamar dos americanos no caso do algodão, erra ao criar obstáculos a importações, na tentativa de compensar, da pior maneira possível, a falta de competitividade de setores produtivos nacionais causada pelo famigerado “custo Brasil” — impostos, burocracia, infraestrutura deficiente, mão de obra mal qualificada.
Com isso, transfere a conta do baixo poder de competição ao consumidor interno. Preferível fazer o dever de casa e reduzir o “custo Brasil”. Algo começa a ser executado, reconheça-se, mas a onda protecionista ganha dimensões preocupantes, e faz suspeitar que bolsões existentes no grupo que está no poder deste 2003 contrários ao livre comércio aproveitam a crise mundial para contrabandear uma política anacrônica de fechamento do país, no pior estilo geiseriano.
Nem mesmo a acusação enviesada de que os Estados Unidos executam mais um ciclo de “afrouxamento monetário” para desvalorizar o dólar artificialmente pode servir de biombo para a criação constante de obstáculos às importações.
O Brasil termina se nivelando por baixo, num continente em que existe a Argentina. Por erros próprios, o vizinho, em crise cambial, se torna cada vez mais protecionista, um pária no planeta.
03 de outubro de 2012
Vivida aquela experiência trágica, mesmo num mundo ainda não tão interdependente quanto o de hoje, lideranças mundiais costumam fazer o alerta contra barreiras às importações nesta fase de retração do crescimento mundial, na esteira da crise deflagrada a partir de Wall Street no final de 2008.
Mesmo assim, tem havido casos de obstrução do comércio, sempre em nome da defesa de empregos nos mercados importadores. Se todos fizerem o mesmo movimento, é óbvio que a produção mundial mergulhará em parafuso.
O Brasil tem ocupado tribunas de instituições multilaterais com um discurso vigoroso contra o protecionismo — mas não pratica o que defende. Assim não fosse, diplomatas do Itamaraty não teriam sido bombardeados por representantes dos Estados Unidos, Europa e Japão em reunião, segunda-feira, na sede da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Genebra.
Não há mocinhos no comércio internacional, ainda mais numa conjuntura de retração dos negócios como a atual. Se os americanos reclamam da taxação em até 25% das importações de uma lista com cem produtos — e virá mais —, também não cumprem determinações da OMC de indenizar o Brasil por conceder subsídios ilegais aos produtores de algodão.
Um erro não justifica outro. Se o Brasil tem razão de reclamar dos americanos no caso do algodão, erra ao criar obstáculos a importações, na tentativa de compensar, da pior maneira possível, a falta de competitividade de setores produtivos nacionais causada pelo famigerado “custo Brasil” — impostos, burocracia, infraestrutura deficiente, mão de obra mal qualificada.
Com isso, transfere a conta do baixo poder de competição ao consumidor interno. Preferível fazer o dever de casa e reduzir o “custo Brasil”. Algo começa a ser executado, reconheça-se, mas a onda protecionista ganha dimensões preocupantes, e faz suspeitar que bolsões existentes no grupo que está no poder deste 2003 contrários ao livre comércio aproveitam a crise mundial para contrabandear uma política anacrônica de fechamento do país, no pior estilo geiseriano.
Nem mesmo a acusação enviesada de que os Estados Unidos executam mais um ciclo de “afrouxamento monetário” para desvalorizar o dólar artificialmente pode servir de biombo para a criação constante de obstáculos às importações.
O Brasil termina se nivelando por baixo, num continente em que existe a Argentina. Por erros próprios, o vizinho, em crise cambial, se torna cada vez mais protecionista, um pária no planeta.
03 de outubro de 2012
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