ACABA A FARSA DE QUE MENSALÃO ERA CAIXA 2
Maioria dos ministros do STF conclui que houve compra de apoio político para o então governo Lula
O Supremo encerrou a primeira parte do capítulo 6 do julgamento, ontem, condenando 10 acusados por corrupção passiva; 11 por lavagem de dinheiro; e cinco por formação de quadrilha.
Celso de Mello, o mais antigo ministro da Corte, chamou os réus de "marginais do poder". E classificou o esquema de um "projeto criminoso" que vitimou toda a sociedade. "Foi um verdadeiro assalto à administração pública", disse.
Amanhã, o STF começa a julgar a parte mais emblemática do processo, a que envolve os supostos corruptores:
os petistas José Dirceu,
José Genoino e Delúbio Soares.
Maioria dos ministros reconhece a compra de apoio parlamentar no governo Lula e rejeita a tese de que o esquema criminoso serviu apenas para pagar dívidas de campanha Criada como estratégia para esvaziar as denúncias do mensalão, a tese de que os recursos do esquema não passaram de caixa dois foi derrubada ontem no Supremo Tribunal Federal (STF).
Todos os políticos denunciados pela Procuradoria Geral da República por terem recebido dinheiro do empresário Marcos Valério foram condenados por corrupção passiva, numa demonstração de que a conduta, independentemente da destinação do dinheiro, foi criminosa.
Mais do que isso, a maioria dos magistrados, em seus votos, confirmou o principal eixo da acusação de compra de apoio político no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ao concluir ontem a primeira parte do capítulo seis, que trata dos repasses para partidos, o Supremo condenou 12 dos 13 réus.
O único absolvido foi o ex-assessor parlamentar do PL (atual PR) Antônio Lamas, conforme recomendou o Ministério Público, por falta de provas. Em dois meses de julgamento e 30 sessões, os ministros já condenaram 22 dos 37 acusados. Apenas quatro conseguiram se livrar.
Marcos Valério, já condenado por corrupção ativa, peculato e lavagem de dinheiro, volta a ser julgado.
A segunda-feira foi um dia de votos duros.
Na sessão de ontem, o decano do STF, Celso de Mello, fez um manifesto contra a corrupção.
Já o presidente do Supremo, Carlos Ayres Britto, afirmou que Marcos Valério dispõe do "mais agudo faro desencavador de dinheiro". Nos capítulos já julgados, os ministros concluíram que houve desvios de recursos públicos da Câmara dos Deputados e do Banco do Brasil, simulação de empréstimos para o PT e gestão fraudulenta de instituição financeira.
No trecho da denúncia encerrado ontem, seis ministros apontaram que o esquema, liderado por Marcos Valério, serviu para abastecer um fundo destinado à compra do apoio de partidos. "Não se pode cogitar de caixa dois nem mesmo coloquialmente", disse Ayres Britto.
A interpretação do STF tem um impacto além da esfera jurídica. A conclusão dos ministros representa um julgamento sobre a condução política do governo nos primeiros anos do mandato do ex-presidente Lula.
Em seu voto, o relator, Joaquim Barbosa, citou duas importantes votações no Congresso:
as reformas tributária e da Previdência.
O revisor, Ricardo Lewandowski, discordou da tese majoritária.
Em seus três dias de voto, ele condenou políticos que receberam dinheiro de Valério por corrupção passiva, sob o fundamento de que quem recebe alguma vantagem em razão do cargo que exerce, independentemente da destinação e dos motivos, comete corrupção passiva.
Ao se manifestar, Lewandowski tratou o dinheiro como ajuda para campanhas políticas, o caixa dois. Reformas Ao votar ontem, o ministro Marco Aurélio Mello afirmou que houve um esquema de compra de apoio político no Congresso.
"Essa corrupção não visou cobrir simplesmente deficiência de caixa dos diversos partidos, mas sim a base de sustentação para aprovar-se determinadas reformas", afirmou o ministro.
Primeiro a votar ontem, o ministro Dias Toffoli reconheceu que sete políticos e assessores que receberam repasses feitos pelo PT por meio das agências do empresário Marcos Valério cometeram o crime de corrupção. O magistrado citou o nome de dois petistas acusados de corrupção ativa durante seu voto, mas poupou José Dirceu.
Toffoli observou que os recursos autorizados pelo ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares "nunca foram regularmente escriturados em nenhuma das agremiações".
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, como Celso de Mello, refutou insinuações de que o STF poderá condenar Dirceu sem evidências cabais. "A prova é mais que abundante. A prova é torrencial em relação ao ministro José Dirceu", atacou.
Em se plantando, tudo dá
No intervalo da sessão de ontem, os ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Luiz Fux, além do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, plantaram mudas de árvores no bosque do Supremo Tribunal Federal (STF), seguindo uma tradição da Corte.
Gurgel escolheu uma muda de sucupira branca, típica do cerrado. Toffoli plantou um cafeeiro, Lewandowski preferiu um ipê amarelo, e Fux, uma quaresmeira roxa. Criado em 2000, durante a gestão do ministro aposentado Carlos Velloso, o bosque recebe regularmente contribuições de autoridades e dos novos ministros que chegam à Casa.
Empate na Corte
O já esperado grande impasse surgiu ontem no julgamento do mensalão: como proceder em caso de empate? Nos últimos dois meses, os ministros evitaram falar sobre o assunto, e o presidente do Supremo, Carlos Ayres Britto, chegou a dizer que não acreditava nessa possibilidade.
Mas na sessão de ontem, depois do voto de quatro ministros, o placar ficou em cinco votos contra e cinco a favor da condenação do ex-deputado José Borba (ex-PMDB-PR) por lavagem de dinheiro.
Britto reconheceu o problema, mas afirmou que prefere deixar a solução para o fim do julgamento. Desde a aposentadoria de Cezar Peluso, a igualdade se tornou uma possibilidade. Os ministros terão que decidir agora se o voto de Ayres Britto vale por dois ou se, em caso de empate, o réu é automaticamente absolvido.
Uma alternativa é aguardar a posse — e o voto — do novo ministro, Teori Zavascki.
ANA MARIA CAMPOS DIEGO ABREU HELENA MADER CorreioBraziliense
03 de outubro de 2012
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