Passaram-se cinco anos desde a descoberta, pela Petrobras, das grandes reservas de petróleo do pré-sal.
Na expectativa de nos tornarmos grandes produtores, e até exportadores, assistimos ao recuo da posição de autossuficiência que estávamos prestes a alcançar. A Petrobras reduz suas metas de produção e as suas previsões de investimentos.
Assistimos perplexos ao anúncio, anteriormente inadmissível, de prejuízo da empresa no segundo trimestre de 2012. Da euforia inicial evoluímos para um clima de apreensão.
O que aconteceu?
O governo federal desconsiderou a complexidade das inovações técnicas, econômicas, financeiras e gerenciais requeridas pela aventura pioneira no terreno do pré-sal. Preferiu concentrar-se nos aspectos políticos, ressuscitando ideologia nacionalista de outros tempos. Depois de dois anos quase perdidos em termos de ações concretas, enviou ao Congresso projeto de substituição do marco regulatório e do sistema de concessões que vinha funcionando a contento.
Na sua vigência o Brasil passou de importador a exportador de petróleo e derivados e a Petrobras se consolidou internacionalmente como grande e respeitada empresa no domínio da exploração do petróleo e de sua extração.
A concorrência lhe fez bem.
A empresa negociou livremente valiosas parcerias com congêneres e nesta altura da sua vida de mais de meio século não necessita de muletas como as que foram incluídas na proposta de reforma.
E qual foi a essência da reforma?
1. Introduzir o sistema de partilha da produção entre o Estado brasileiro e os concessionários, em partes iguais. Pagamento de um bônus, pelo concessionário, na licitação da concessão.
2. Modificar o sistema de royalties.
3. Atribuir à Petrobras participação obrigatória de 30% em cada empreendimento. Atribuir à Petrobras a administração de todas as parcerias. Criar nova subsidiária para gerir o programa.
Se o item 1 corresponde a uma hipótese plausível, o item 2 foi catastrófico, já que desencadeou no Congresso interminável disputa entre parlamentares dos estados em diferentes posições geográficas relativamente aos campos produtores, o que obscureceu o debate sobre o tema principal, de encontrar a melhor forma de viabilizar a exploração da nova riqueza.
Ficou em segundo plano durante o ano e meio da passagem pelo Congresso.
Acompanhando o desenrolar das controvérsias publiquei, no "Valor Econômico" (9/9/2008) artigo que terminava com o reconhecimento que "ao final caberá ao presidente Lula definir o caminho, assumindo a responsabilidade por uma das mais graves decisões políticas que terão cabido a um estadista do nosso país".
A proposta final foi sancionada pelo presidente Lula com veto parcial da parte referente à distribuição dos royalties. Foi mantida a parte 3, desnecessária, inconveniente e, a meu ver, desastrada. Ao assumir o governo a presidente Dilma enviou ao Congresso nova versão para a questão dos royalties, que não chegou a ser votada.
Enquanto isso estão suspensas desde 2009 as licitações para exploração de novas áreas.
Além do risco potencial contido na nova legislação, a empresa foi submetida, desta vez de forma objetiva, a uma agressão à sua integridade mediante deliberado congelamento do preço da gasolina e do diesel, repetindo antiga prática de usá-los como instrumento de estabilização monetária.
E isso ao mesmo tempo em que, desafiada a realizar enormes investimentos no pré-sal, foi lançada na direção de inúmeros projetos de importância duvidosa, para ela e para o país, que deram origem a gigantismo e perda de eficiência.
O resultado não se fez esperar:
estagnação de exploração e produção, prejuízo e necessidade de rever programas, reduzir investimentos e metas de produção.
Estas considerações foram provocadas pelo artigo em que Consuelo Dieguez faz, na revista "Piauí", extenso, cuidadoso e oportuno relato das peripécias do pré-sal, citando entrevistas e opiniões de pessoas intimamente relacionadas com o tema, analisando também as preocupantes consequências imediatas e futuras para o país e a Petrobras do descaminho em que nos meteram.
A atitude dominantemente pessimista de pessoas abalizadas, quanto ao possível sucesso do pré-sal e ao futuro da própria Petrobras, nas condições adversas que foram criadas, deu lugar a moderada confiança com a promessa do governo, em 19/9, de que a décima primeira rodada de licitações de novas áreas seria lançada até maio de 2013.
Dependeria ainda da aprovação pelo Congresso da interminável questão dos royalties.
Aparentemente essa decisão assegura sobrevivência das pequenas empresas interessadas nas áreas terrestres bem como a permanência no Brasil das grandes empresas internacionais, interessadas nas reservas submarinas.
O destino do pré-sal, infelizmente, continua incerto, e o da Petrobras dependerá de sua reconcentração no objetivo para o qual foi criada e de corajoso esforço de enxugamento.
Antonio Dias Leite/O Globo
03 de outubro de 2012
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