A condenação de seus principais dirigentes - o chefe da Casa Civil do governo Lula, José Dirceu, o presidente nacional José Genoino, o presidente da Câmara dos Deputados João Paulo Cunha e o tesoureiro Delúbio Soares, entre outros -, por corrupção ativa e formação de quadrilha, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), não foi digerida pelo Partido dos Trabalhadores (PT).
O atual presidente nacional petista, Rui Falcão, já descartou publicamente a expulsão dos afiliados condenados pelo Supremo dos quadros partidários, embora a punição seja prevista no estatuto do partido para quem cometer "crimes infamantes" ou "práticas administrativas ilícitas, com sentença transitada em julgado". Na festa do lançamento da edição n.º 5 mil do jornal do partido, Falcão decretou: "Nenhum deles está incluído.
Não houve desvio administrativo. Quem aplica o estatuto somos nós. Nós interpretamos o estatuto". E mais: o PT faz questão de que Genoino assuma uma cadeira na Câmara dos Deputados em 2013. Ele não foi eleito, mas ocupa a primeira suplência e um dos membros da bancada petista de São Paulo na Câmara, Carlinhos Almeida, foi eleito e será empossado prefeito de São José dos Campos, abrindo a vaga. "Ele tem o direito de assumir o mandato", pontificou o dirigente.
Genoino já foi condenado, mas o julgamento do mensalão no STF ainda não foi concluído. O Supremo ainda não decidiu se os parlamentares condenados perderão seus mandatos automaticamente ou se deverão ser julgados pelos pares. Além de contrariar a iniciativa do réu de demitir-se do cargo de assessor especial do Ministério da Defesa para evitar constrangimentos para si próprio, colegas e chefes, a decisão de tornar a posse de Genoino fato consumado antes da decisão do Judiciário desafiaria o Estado Democrático de Direito, que o partido garante defender e jura proteger.
Mas, felizmente, o PT está dividido. A Folha de S.Paulo (pág. A4, 1/11/2012) noticiou que uma divisão interna do partido da presidente Dilma Rousseff forçou o adiamento da divulgação de um manifesto do PT contra a atuação do STF no julgamento do mensalão. A divulgação do texto, que, de acordo com a notícia, atacaria a condenação dos petistas, foi postergada para depois da fixação das penas porque o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua sucessora, Dilma Rousseff, não querem que em 2013 PT e governo travem uma batalha campal contra o Supremo. Nem que o partido assuma o ônus de uma eventual mobilização do gênero.
Em 20 de setembro passado, por iniciativa do presidente nacional do PT e com adesão constrangida de dirigentes de bancadas da base aliada, foi divulgado um manifesto em que o julgamento foi descrito como resultado da ação de inimigos do partido: "As forças conservadores não hesitam em recorrer a práticas golpistas, (...) à denúncia sem provas".
A chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, contudo, se opôs à atitude hostil dos petistas ao Supremo e defendeu o respeito à sua decisão. "Nós podemos gostar ou não de como as coisas se dão, mas nós temos de respeitar resultados e instituições", disse. O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, publicou artigo na rede mundial de computadores qualificando o julgamento de "devido e legal" e seu resultado como "legítimo", de vez que os acusados tiveram amplo direito de defesa.
Se, de fato, mesmo se solidarizando com os condenados e atacando a "politização" do julgamento, o PT não fizer campanha permanente por eles para não dar impressão de revanchismo, fica patente que o partido de Lula, Dirceu e Dilma ainda não se definiu sobre seu papel na chamada "democracia burguesa". Não há clima para mobilizar a militância contra o Judiciário e Genro tem razão ao afirmar que isso seria inócuo, na prática.
De qualquer maneira, o partido só se une para usufruir benefícios, pompas e glórias do governo no Estado Democrático de Direito, mas ainda abriga revolucionários recalcitrantes que se dispõem a chegar às últimas consequências de uma crise indesejável sob todos os aspectos entre os Poderes da República para satisfazer ambições de mando unívoco e total acima das regras democráticas da impessoalidade da gestão pública e da alternância no poder político.
02 de novembro de 2012
Editorial do Estadão
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