Presidente brasileira incentiva a Europa a combinar austeridade fiscal com estímulos à economia; no Brasil, a receita dá sinais de que "desandou"
Dilma Rousseff discursa em Paris: defesa de um menor rigor fiscal (AFP)
No Brasil, medidas de incentivo à economia não têm dado o resultado esperado, ao passo que a meta cheia de superávit primário foi abandonada
Em discurso durante a visita de três dias a Paris, a presidente disse que a responsabilidade na condução das contas públicas é tão necessária como são imprescindíveis medidas de estímulo à expansão da atividade econômica.
Le Monde – Nesta segunda-feira, o jornal francês Le Monde realizou matéria especial sobre a visita de Dilma ao país. De acordo com a publicação, ela estaria incomodada com a condução da chanceler alemã, Angela Merkel, à frente da crise do euro.
Na avaliação da presidente, a Alemanha, com seu apego ao rigor fiscal, estaria impondo um preço demasiado caro às nações que necessitam de ajustes em suas contas públicas. As medidas que a chanceler exige – como, por exemplo, cortes de gastos públicos, demissões de servidores, redução de benefícios sociais, etc – seriam excessivamente recessivas, na avaliação de Dilma.
Com países já estagnados ou com economias em contração, tal política de ajuste das contas públicas tornar-se-ia, a cada dia, mais difícil de ser cumprido. Segundo o Le Monde, a presidente também estaria insatisfeita com a atuação do líder francês, François Hollande, que não estaria conseguindo fazer um "contraponto ao poder de Merkel".
Por fim, Dilma sonha em "solucionar" o quanto antes os problemas da Europa, pois avalia que a crise na região está por trás das dificuldades por que passa a economia nacional.
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Receita 'desandou' – No Brasil, contudo, a "receita" de mesclar austeridade fiscal e medidas de estímulo dá sinais de que "desandou". O Palácio do Planalto tem, de fato, desonerado a economia interna, o que custará aos cofres públicos, até o final deste ano, uma renúncia fiscal de 45 bilhões de reais.
O problema é que esse pacote de incentivos não tem dado resultado concreto, haja vista que o empresariado mostra-se assustado com o que considera um excesso de intervenção governamental e recusa-se a investir.
O Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre mostrou alta de apenas 0,6%, contrariando todas as expectativas do mercado e, inclusive, do próprio governo – puxado para baixo justamente pela taxa de investimento, que caiu pelo quinto trimestre consecutivo, e pela estagnação do setor de serviços, o que, segundo analistas, é fruto do apagão de mão de obra.
Ao mesmo tempo, as medidas do Planalto de desoneração fiscal e estímulo econômico, associadas à queda da arrecadação, estão piorando as contas públicas. Diante deste quadro, o Palácio do Planalto já decidiu que não cumprirá a meta cheia de superávit primário neste ano de 3,1% do PIB. Em outras palavras, o esforço para reduzir o endividamento do estado brasileiro – fator que, ao atingir patamares elevadíssimos, está no cerne da crise europeia – está sendo relaxado pelo Palácio do Planalto.
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Conquistas sociais – Em Paris, a presidenta Dilma Rousseff destacou que “o corte radical de gastos” feito pelos governos de países desenvolvidos tem afetado as conquistas sociais alcançadas pela população após a 2ª Grande Guerra Mundial, informa a Agência Brasil.
“Nós, países emergentes, demonstramos maior capacidade de recuperação, pois temos hoje maior estabilidade macroeconômica e não vacilamos em lançar mão de incentivos fiscais para reduzir os impactos da crise”, disse Dilma na abertura do "Fórum pelo Progresso Social – O Crescimento como Saída para a Crise". O evento foi organizado pelo Instituto Lula e pela Fundação Jean-Jaurès.
A presidente destacou a experiência latino-americana na superação das crises. “Todos nós, da América Latina, que fomos submetidos a um grave ajuste ao longo de duas décadas, sabemos que o corte radical de gastos afeta não só a economia, mas, sobretudo, compromete o futuro de nossa gente”. Para ela, na Europa, os cortes “têm afetado igualmente uma das maiores obras políticas do mundo, que foi a criação da União Europeia e da zona do euro”.
Para ela, a superação da crise pela União Europeia passa por muita cooperação, diálogo e compromisso dos governos – como também defendeu o presidente da França, François Hollande, antes do discurso da colega brasileira. Dilma também destacou a necessidade de uma união bancária – com um Banco Central com poderes para defender o euro, emitindo títulos e emprestando recursos em última instância.
Ainda de acordo com a Agência Brasil, a presidente disse que a superação da crise passa, necessariamente, pela construção de um novo mundo e que, dificilmente, haverá uma oportunidade para se tomar um caminho com ações mais progressistas e menos ortodoxas.
Apesar de os países emergentes estarem superando de forma menos traumática a crise, Dilma ressaltou que todos vivem em um mundo interconectado e entrelaçado e que as decisões tomadas em qualquer parte afetam a todos.
“Diante disso concordamos com o fato de que a opção preferencial por política ortodoxa, na maioria dos países desenvolvidos, não tem resolvido o problema da crise: nem seu aspecto fiscal nem seu aspecto financeiro. Pelo contrário, o que nós vemos é o agravamento da recessão, o aumento do desemprego, o aumento do desemprego entre os jovens, a desesperança e o desalento.”
11 de dezembro de 2012
Revista Veja
(com agência Reuters)
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