É bastante provável que haja quem considere que o apoio nas urnas dê uma espécie de passe livre a partidos e políticos para atuarem à margem da Carta. Grave engano. Tampouco os bons propósitos “sociais” do homem público os isentam de cumprir a lei, sob o risco de acontecer o que aconteceu, pois, felizmente, as instituições republicanas brasileiras já se encontram num estágio avançado de consolidação e funcionam como anticorpos contra projetos de poder personalistas.
O PT não é um bloco monolítico — como nenhum dos grandes partidos brasileiros. E, assim, começam a ser ouvidas vozes sensatas, preocupadas com o risco da aventura de se usar o partido como centelha de uma crise política séria, na defesa de mensaleiros condenados num julgamento exemplar. Ninguém com a cabeça no lugar deseja esta crise. A começar pela presidente Dilma, cuja agenda de desafios é enorme, e tem mais o que fazer do que enfrentar uma turbulência institucional criada fora do governo.
Representantes de duas gerações de petistas, Tarso Genro, governador do Rio Grande do Sul, e Fernando Haddad, prefeito de São Paulo, preocupados com o partido, abordaram de forma sensata o desfecho do julgamento. Ex-ministros de Lula, os dois, em entrevistas publicadas na reta final de 2012, demonstraram temor de a legenda ser conduzida a uma brancaleônica guerra contra o Supremo.
À “Folha de S.Paulo”, Tarso disse que a agenda do PT não pode se resumir à solidariedade “aos companheiros condenados”. Foi claro: “Já falamos o suficiente sobre isso.” Com outras palavras, o governador gaúcho volta à proposta de “refundação do partido” que fez ao assumir a legenda na crise do estouro do escândalo do mensalão, em 2005, razão de ter perdido espaço no partido. Com o fim do julgamento, deve considerar adequado reerguer a bandeira. Faz todo sentido.
Ao GLOBO, Haddad também foi ao ponto: o veredicto (do julgamento) “tem que ser acatado pelo fato de ser a Corte Suprema que julgou”. Simples assim. Não deixou, ainda, de elogiar o ministro Joaquim Barbosa, pela convicção com que deu seu voto de relator do processo. Como Dilma, Tarso e Haddad, por terem responsabilidades de governo, não desejam que suas administrações sejam prejudicadas por tumultos políticos. As duas entrevistas contribuem para o PT iniciar 2013 numa rica discussão sobre o futuro pós-mensalão.
03 de janeiro de 2013
Editorial de O Globo
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