"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

SENADO INSANO

 

Muito antes dos Estados instituírem a tripartição dos poderes como um dos alicerces do regime democrático de governo, a instituição denominada Senado já existia. Sua origem se deu nos diversos Conselhos constituídos para, como o próprio nome diz, aconselhar o monarca ou aquele cuja função fosse a de comando geral, sendo que, com o passar do tempo, além de aconselhar o órgão colegiado também fiscalizava e julgava o chefe maior de uma comunidade organizada, tarefa adquirida mais recentemente. É o que tecnicamente se nomeia Relativização do Absolutismo.

Com a adoção do sistema republicano, os poucos Conselhos restantes transformaram-se em Senados, salvo as exceções gregas e romana, nas quais a nomenclatura quase sempre foi esta adotada atualmente. Outra exceção notável foi a transformação do nosso Senado Federal em Conselho durante a ditadura de Getúlio Vargas, intencionalmente com o objetivo de enfraquecer a Casa Legislativa e garantir mais efetivamente seus mandos e desmandos.

Em termos de exercício de poder é notável verificar que um os principais papeis dos Senados na história é depor o governante quando este passa a ser considerado inapropriado à condução dos anseios da nação. Não faltam exemplos, independente dos motivos serem considerados justos ou não para a deposição ou eliminação do soberano, uma vez que a intenção, no momento, é determinar a imensidão dos mandos senatoriais.

O exemplo mais tocante das atribuições maiores do Senado no currículo do Estado Brasileiro foi o julgamento do processo de Impeachment do ex-presidente Collor. Some-se a tal função o julgamento dos magistrados do Supremo Tribunal Federal, por exemplo, e tantos outros que definem a condução do país, muito além do imaginado dentro da sociedade, uma vez que não lê a sua própria Constituição, nem quando esta já se encontra à décadas gratuitamente na internet.

Diferente da outra Casa Legislativa, a Câmara dos Deputados, o Senado Federal é formado por representantes que devem cuidar dos interesses de seus respectivos Estados Membros diante da União e de outros Estados Membros, assim como dos assuntos de interesse da Federação Brasileira, do Estado Brasileiro em conjunto com o Presidente da República, ou seja, atribuições muito distintas dos Deputados Federais, os quais representam os cidadãos brasileiros, de forma mais genérica. Portanto, é de se esperar que a formação intelectual e a experiência política de um senador seja um tanto maior do que dos demais parlamentares.

Diante das informações acima, é bastante fácil e desesperador perceber o quanto a situação nacional no que tange ao Alto Clero legislativo é periclitante, indigna, perniciosa, inadmissível e vergonhosa, para dizer pouco.

O mero cogitar por uma candidatura de Renan Calheiros para a presidência da casa é imoral, no mínimo
 
O mero cogitar por uma candidatura de Renan Calheiros para a presidência da casa é imoral, no mínimo. Mas além de cogitada, está sendo veiculada e tem grande chance de levar um indivíduo cuja conduta está expressa em sua vida pessoal e política, perfazendo uma “ficha imunda”, se comparada à proposta da Lei da Ficha Limpa e suas exigências, ao comando do Congresso Nacional. Sim, porque o Presidente do Senado também acumula o cargo do Senado Federal. E é o quarto indivíduo a assumir a própria presidência em caso de ausência dos demais – o que ocorreu quatro vezes com o temeroso José Sarney. Aquele que impôs silencio à imprensa no julgamento do filho e parentes por corrupção.

Até mesmo a sensação de justiça, ainda que parcial, trazida nos julgamentos e condenações do STF em relação aos envolvidos no escândalo do “Mensalão” não é suficiente para esconder o desatino de uma posse de Renan Calheiros ao Senado. Fica a impressão de que o Brasil dá um passo para frente e cinco para trás.

O que poderia explicar o fato de uma figura pública, um sujeito que se candidata a um cargo cujo salário é pago com o dinheiro do povo, e cujas funções e atribuições envolvem destinação e gestão do dinheiro do povo, ter o direito de manter em segredo de justiça processos que versem a respeito de corrupção, sonegação, desvio de verbas e demais crimes diretamente conexos com os interesses públicos e sociais? O Poder Judiciário não é obrigado a dar tal privilégio seja em que processo for. E nesses casos, jamais poderia fazê-lo.

Enquanto os demais países emergentes investem em transparência e desenvolvimento, o Brasil que está para sediar dois grandes eventos internacionais envolvendo quantias inimagináveis, verifica seus representantes mais corruptos e envolvidos em crimes tratando de se garantir em posições de comando e poder de decisão, apenas para continuar fazendo o que sempre fizeram – enriquecer a si mesmos e seus familiares.

Não é mais possível continuar acomodado na trincheira de afirmações tais como “todo povo tem o governo que merece”, “Fazer o que? Esse país não tem jeito.” Por mais omisso que se possa ser, ninguém merece uma humilhação e um despotismo dessa monta. Existem filhos, netos e bisnetos que precisam e precisarão de exemplos de coragem e caráter.
E existem diversas formas de combater o desmando e a usurpação. Passeatas, manifestações por redes sociais, petições encaminhadas ao Ministério Público e entidades defensoras da transparência econômica e política, entre outras tantas.

Frente ao que está ocorrendo, e apelando irresistivelmente ao paupérrimo trocadilho, o atual Senado poderia tranquilamente ser denominado Sanatório Federal. O grande problema é responder até quando a maioria dos eleitores será ainda mais louca de continuar elegendo essa corja ou permitindo que permaneçam onde estão.

31 de janeiro de 2013
João Antonio Wiegerinck

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